O mês de setembro novamente ficou marcado na história do México. Foi um mês que gostaríamos de esquecer, porém é impossível apagar das nossas vidas estes dias.
A localização geográfica do México está sobre uma área sísmica, um lugar propenso a sofrer terremotos fortes. O país sofreu três grandes terremotos que marcaram sua história, em 1957, em 1985 e o último, no mês de setembro de 2017.
Das curiosidades dos países Hermanos, o primeiro terremoto que sofremos foi no dia 7 de setembro, dia da independência brasileira, era por volta das 11:30h da noite. Eu já ia dormir e escutei o alarme da cidade soando, era a sirene seguida das palavras: “alerta sísmico”. Quando o alerta é acionado temos em média uns 40 segundos para proteger-nos antes que o terremoto aconteça, dependendo de onde for o epicentro. E eu realmente pensei que não ia acontecer nada, neste momento passaram várias coisas pela minha cabeça, entre elas, ficar em casa, e não sair do apartamento. Depois decidi sair e procurar a zona de segurança do meu andar, e não achei. Desci mais um andar e encontrei os vizinhos saindo e dizendo: “temos que descer”. Desci os 7 andares do edifício descalça, e de pijama. Enquanto descíamos começamos a sentir como o edifício se movimentava e era difícil de caminhar. Quando chegamos ao térreo quase não se sentia mais o movimento.
Os moradores estavam no estacionamento assustados, alguns chorando, outros ligando para familiares. A equipe de segurança do conjunto fez a vistoria nos edifícios e nos autorizou a voltar aos apartamentos. Parecia que não tinha acontecido nada de grave apesar do susto.
Porém, no outro dia, vi nas notícias que o Estado de Oaxaca tinha sofrido graves consequências do terremoto da noite anterior. O interior da república estava colapsado. Uma semana depois viajei ao centro de Oaxaca para fazer um curso, e realmente viajei com medo, porque estava consciente que estava indo para o epicentro dos terremotos e sabia que as réplicas estavam sendo constantes. Mas a medida que fomos conhecendo a cidade, fazendo o curso, o medo foi ficando de lado.
No dia 19 de setembro de 2017, dia da independência Mexicana, 1h da tarde, eu estava almoçando com amigos estrangeiros quando um deles disse: “quem está balançando a mesa?” E foi quando percebemos que a terra começou a tremer outra vez. Saímos correndo do restaurante, e ficamos na rua esperando passar o terremoto. Parecia que estava tudo bem, que não tinha sido grave, até que começaram a chegar as mensagens de whatsapp perguntando se eu estava bem e onde eu estava, entre elas começaram a chegar os vídeos da Cidade do México. Eu não sei se o mundo vai acabar algum dia, porém o que eu via, parecia sim o fim do mundo. Vídeos das pessoas correndo, os edifícios tremendo e colapsando. Era horrível, ver tudo o que estava acontecendo.
Soube que meus amigos estavam bem. Voltei à cidade do México no dia 20 a noite, e ao chegar via como se a cidade tivesse sido bombardeada em algumas zonas especificas. Durante todo o dia 19 o transporte público foi interrompido, muitas pessoas tiveram que caminhar em média três horas para voltar a suas casas, o sistema de luz, gás e internet também foi afetado, por algumas horas.
Na quinta-feira dia 20 de setembro, fui ajudar as pessoas, cheguei a um dos lugares mais trágicos, o Colégio Enrique Rebsamen, que foi completamente destruído com os estudantes, e professores dentro. Chegando lá me apresentei como médica, e me deixaram entrar como voluntária, porém a necessidade para aquele momento já eram médicos cirurgiões, ortopedistas, e pediatras. Foi angustiante estar perto do colégio, um silêncio fúnebre pairava no ar. Às vezes aquele silêncio era interrompido cada vez que encontravam uma criança viva ou professores. Nesta tragédia faleceram somente nesta escola aproximadamente 37 pessoas entre crianças e adultos.
Saí daquela área, e me pediram para fazer plantão a alguns metros da escola, onde outros dois edifícios estavam prestes a cair. Todos estavam vazios, porém, os moradores estavam perto, e podiam necessitar de ajuda. Graças a Deus não foi preciso, e nos liberaram da área.
As mensagens de pedido de apoio não paravam de chegar. Todo o país se uniu nestes dias, e como muitas ruas estavam interditadas, quem ajudou de uma maneira incrível foram os motociclistas, que como dizem os mexicanos “se la rifaron” quer dizer “fizeram um excelente trabalho“, transportando médicos, enfermeiros, e medicamentos.
Sinto um orgulho enorme de todos os bikers, que colocaram suas motos à disposição da população. Vários hospitais privados abriram suas portas para atender os feridos, o exército e a marinha mexicana trabalharam sem cessar por dias consecutivos, apoiados pela população civil, pois eram vários edifícios colapsados. As equipes de resgate trabalharam com cães, entre os quais se destacou a nossa adorada Frida, uma labradora que resgatou 52 pessoas. Realmente os cães de resgate se tornaram parte dos nossos heróis nacionais.
Todo mundo ajudou de alguma forma ou de outra, fosse levando comida, água, emprestando extensões de luz para carregar telefones celulares, transportando pessoas, recebendo doações…
Sábado dia 23 de setembro escutamos o alarme sísmico e outra vez foi correr com as nossas mochilas de emergência para as áreas de segurança. Para a nossa alegria, a Cidade do México estava salva, porém para a nossa tristeza o Estado de Oaxaca tinha sido atingido outra vez, o que tinha ficado em pé do terremoto do dia sete de setembro, terminou de cair. Outras Estados e cidades afetadas também foram Morelos e Puebla.
Graças ao terremoto de 1985 agora a população está mais preparada para atuar em momentos de desastres naturais. A ajuda chegou muito mais rápido e o número de falecidos foi menor, o que de todas formas não deixa de ser uma catástrofe.
A realidade mexicana depois do mês de setembro é caótica. Muitas famílias vivem em albergues, muitas pessoas perderam absolutamente tudo, incluindo bens materiais e famíliares. Entre os desabrigados estão animais de estimação. Talvez suas famílias também tenham falecido no terremoto. A sensação de impotência é absurda. Apesar de muitos de nós trabalharmos para ajudar aos necessitados, ainda ficamos com a sensação que deveríamos ter feito mais pelas pessoas.
Parece que tudo, ainda é pouco. A indignação frente ao governo é insuportável. O governo e as políticas públicas, são completamente corruptas, e não apoiam o suficiente. Fico pensando como os desabrigados da terceira idade vão reconstruir suas vidas, e de quem as crianças órfãs receberão apoio.
Há anos eu não espero nada de nenhum governo, porque sei que a sua presença brilha pela corrupção seja no Brasil, seja no México. Somente gostaria que em situações como essas eles fossem solidários com os desabrigados e que pelo menos a cada 32 anos deixassem a corrupção de lado.
Mi Mexico lindo y querido se levantará outra vez! O que esperamos, é que a terra deixe de tremer.