Quando cheguei à Indonésia, em junho de 2011, faltava um mês para começar o Ramadã e eu não sabia bem o que significava e nem o que iria encontrar pela frente. Ao pesquisar na Internet, além da típica informação de que o Ramadã – nono mês do calendário islâmico – é o período sagrado de jejum e orações para os muçulmanos, outras informações sobre radicalismo permeavam as páginas e me deixavam bastante apreensiva. Eu ainda estava meio “verde” no quesito adaptação e tinha medo de acabar tomando água ou comendo alguma besteira na rua e terminar apedrejada! Exageros à parte, muitos países muçulmanos têm regras muito estritas em relação a isso (como a Raisa nos conta aqui).
Porém vou descrever um pouco da minha vivência deste período na Indonésia, ou melhor, aqui em Balikpapan, já que não posso falar pelo país todo que é tão diversificado. Apesar de ser um período voltado à penitência, ao sacrifício, não é uma época triste ou depressiva. Muito pelo contrário, é um período de forte apelo ao convívio social, aos encontros, à ajuda e solidariedade e ao perdão. Percebe-se ainda que se evitam discussões ou confrontos, pois pensamentos ou palavras negativas, bem como ficar bravo, invalidam o sacrifício do dia.
Para o expatriado que vive por aqui a rotina é quase a mesma dos outros meses, exceto pela lentidão das coisas e pela paciência extra que você vai necessitar por causa disso. Como as pessoas acabam alterando seu ritmo de sono e alimentação, ficam mais sonolentas e cansadas. Os horários de trabalho também mudam um pouco, já que o expediente termina mais cedo para que todos possam quebrar o jejum (Buka puasa) com a família ou amigos no que chamam de Iftar (uma espécie de “ceia”).
Nas ruas, barraquinhas de comidas típicas instalam-se pouco antes do por do sol para vender kolak (bebida doce feita a base de coco, banana e abóbora) e tira-gostos diversos, entre eles um velho conhecido nosso: pastel! Mas não é aquele pastelão do japonês da feira, não! É pequeno e recheado com um macarrão finiiiiiiiiinho, batata e cenoura. Mas já tá bom! Engana essa brasileira sedenta de sabor da terrinha… rsrs.
No comércio também há um grande movimento. Na Indonésia o 13º salário (bulam ketibelas ou formalmente chamado de THR (ti-ha-err) Tunjangan Hari Raya) é dado neste período. Por isso, durante o dia é possível ver as lojas repletas de gente aproveitando as promoções. Entretanto, nos supermercados se o consumo aumenta, os preços sobem.
Celebrando o Lebaran
Bem, depois de 30 dias de sacrifício durante o dia e comilança durante a noite, celebra-se o que na Indonésia chamam de Lebaran ou Idul Fitri (Eid-ul-Fitr). Ao amanhecer, sob o som do chamado das mesquitas, os muçulmanos se reúnem para rezar.
Além das tradicionais mesquitas, parques e praças também são utilizados como locais de oração. No caminho para a casa, visitam amigos e familiares com a saudação Selamat Idul Fitr (Feliz Idul Fitr) e Mohon maaf lahir dan batin (Perdoe meu corpo e minha alma pelos meus erros).
Nos dias que se seguem é costume visitar os familiares mais velhos, os vizinhos e também os colegas de trabalho e sempre tem comida. No nosso caso, este ano tivemos o prazer de sermos convidados por um amigo indonésio para visitá-lo e almoçarmos com sua família no dia seguinte ao feriado oficial.
Foi uma experiência enriquecedora e inesquecível. Preparei um cartão, envelopes com uma pequena quantia em dinheiro para as crianças (assim como nosso “bom princípio de ano novo”) e fiz um bolo de chocolate (que ficou horrível por sinal, já que sou um zero na cozinha, mas valeu a tentativa).
Fomos recebidos na porta por nosso amigo, com um sorriso tão alegre, percebia-se que a família toda nos esperava ansiosa. Não é todo dia que uma família inteira de bulês (como são chamados os estrangeiros por aqui) vai almoçar na casa deles! Tiramos os sapatos para entrar na casa, como é de costume por aqui – e eu acho o máximo.
Os cumprimentos indonésios são bem especiais. Entre homens ou homem e mulher, um aperto de mãos que termina com a mão direita levada ao peito indica respeito e representa que a saudação foi recebida de coração. Entre mulheres, o cumprimento pode ser como os nossos beijinhos mesmo, são chamados cipika cipiki.
Já as crianças nos prestam sungkem ou salim – gesto onde os mais jovens tomam a mão direta da pessoa mais velha, levando-a à testa ou beijando, algo similar ao nosso “Benção, vó!” pra quem é dessa época…rsrs. Durante o tempo que estivemos lá, vários amigos da família apareceram para visita-los e comer conosco.
Enfim, a comida estava deliciosa (tinha até um falso brigadeiro!), uma tarde feliz com nossos filhos brincando juntos, com direito a foto para posteridade. É nestas horas que penso que, apesar de todos os perrengues que a vida de expatriado tem, certos momentos são como o famoso slogan de um cartão de crédito… NÃO TEM PREÇO!
Para mais informações sobre Ramadã, a Mauren Grazziotin tem um texto muito bonito e informativo sobre sua experiência no Egito! Vale a pena! Beijocas a todos e até a próxima!
13 Comments
Bacana saber sobre a experiência do Ramadã aí na Indonésia. Eu também escrevi um pouco sobre o Ramadã aqui no Qatar! http://desbravadoha.com/mundo-interessante/ramada-karim/#more-638
=)
Oi Thais! Li seu texto, muito interessante ver como o Ramadhan acontece em cada país diferente, não é? E a gente sempre passa por cada uma…rsrs Abraço!
Adorei….
Super interessante….
Obrigada Patrícia! Uma experiência única mesmo…
Que rica experiência!!!
Foi sim, Maria, inesquecível! 😉
Legal Gi!!! É muito legal viver culturas diferentes e conhecer pessoas a canto que passa…Continue a escrever suas experiências, foi muito bacana ler!!!
Oi Lu, é realmente algo que inestimável esse aprendizado! Continue acompanhando o blog! Todo dia as meninas publicam uma novidade, vale a pena! bjoka
Olá Gisele. EStarei me mudando com minha familia para Jacarta em julho de 2016 e gostaria de umas dicas suas. Tipo hábitos, dicas de supermercados, loja de roupas, enfim, a curiosidade é infinita quando vamos para algo desconhecido.
Olá, Michele! Em breve, seja bem vinda à Indonésia então! Na questão hábitos, dê uma olhadinha nos meus textos anteriores, comento alguns por lá. Supermercado e lojas vai depender muito da região onde você irá morar. Considerando que Jakarta é uma capital que sofre muito com o engarrafamento, nem sempre dá pra você fazer mais de uma tarefa por dia na rua: às vezes dá pra ir ao médico, mas não dá pra dar uma esticadinha ao shopping que fica a alguns poucos quilômetros dali porque está tudo parado… O desconhecido é mesmo assustador e, a princípio, pode ser desanimador também. Mas, acredite que 98% das pessoas que conheço que passaram pela Indonésia garantem que foi positivamente uma experiência marcante e inesquecível. Boa sorte e seguimos em contato. Qualquer outra dúvida, estou a disposição. Abraço
Pingback: Brasileiras pelo Mundo - Calendário dos Emirados Árabes - Diário de Polly
Olá Gisele,
Sabe se é muito difícil migrar para a Indonésia? Vcs tem que renovar a estadia com qual frequência? Ou tem visto permanente? Desculpe minha intromissão! Meu marido e eu estamos planejando nos mudar pra lá.
Fernanda
Olá Fernanda!
A Gisele Altoé parou de colaborar conosco, mas temos outra colunista na Indonésia.
Você pode entrar em contato com ela deixando um comentário em um dos textos publicados mais recentemente no site.
Obrigada,
Edição BPM