A Irlanda aprovou recentemente o casamento entre pessoas do mesmo gênero, com 62% dos eleitores votando no Sim e 38% preferindo o Não.
Quase 2 milhões de irlandeses compareceram às zonas eleitorais, um número excelente considerando-se que o voto é facultativo e que o país conta com pouco mais de 4,5 milhões de habitantes.
Para garantir essa marca, muitos irlandeses desembarcaram na ilha somente para votar, por medo de que o vencedor fosse declarado por uma margem mínima de diferença.
Com o resultado a Irlanda entra para a história como o primeiro país a aprovar o casamento entre pessoas do mesmo gênero por meio do voto popular – outros aprovaram a medida via instâncias jurídicas ou parlamentares/políticas.
Eu não pude votar, pois apenas cidadãos são ouvidos em referendos e eleições nacionais. Mas fiquei feliz em ver a mobilização popular feita de forma pacífica, porém firme, por ambos os lados.
Agora, depois de muitas horas de celebração entre quem votou no yes, é hora de entender as consequências práticas da aprovação do casamento entre pessoas do mesmo gênero na Irlanda.
Confira a seguir também fotos e declarações de brasileiros que se sentiram beneficiados pelo sim – infelizmente, não encontrei ninguém que votou pelo “não”, mas, se alguém quiser mostrar o outro lado da história, é só deixar o seu comentário.
1 – Como fica o civil partnership na Irlanda
Antes, pessoas do mesmo gênero podiam formalizar a união por meio da civil partnership, a qual já garantia direitos muito parecidos com os de um casamento, como herança e pensão. Agora, a civil partnership vai deixar de existir e os interessados em colocar a vida no papel terão que casar. E isso implica no seguinte:
2 – O divórcio entre casais homoafetivos vai começar a existir
A civil partnership pode ser dissolvida sem maiores dores de cabeça. Já o divórcio é um processo que pode levar até quatro anos na Irlanda (aff!).
Então a opção para quem não se sente pronto para assumir um compromisso e quer garantir a residência de um parceiro (a) não-europeu será o de facto partnership (união estável), ou simplesmente juntar os trapos, caso nenhum dos dois precise se preocupar com a imigração.
Só que, em ambos os casos, eles ou elas continuarão a ser considerados como solteiros, sem acesso a muitos dos benefícios oferecidos a um casal casado – mas vale lembrar que o mesmo acontece com casais de mesmo gênero.
Os brasileiros Bruno (esq.) e Felipe moraram na Irlanda e casaram-se na Nova Zelândia. “Não posso esconder a felicidade que tive ao dar entrada no nosso casamento sem ter que provar e explicar os porquês. ‘Quero casar porque o amo’, essa foi a minha resposta, e foi o suficiente”, conta Bruno Vinhas, designer da marca Da Chita.
3 – O processo de adoção não mudou
A adoção de crianças e adolescentes por casais homoafetivos é possível na Irlanda, assim como por casais “não casados” que estão há mais de três anos juntos. Ou seja, nada vai mudar, porque isso já era legalmente permitido.
4 – A Irlanda tornou-se o destino preferido para casamentos e eventos gay friendly
Pouquíssimos países permitem o casamento homoafetivo. Some-se a isso o fato da Irlanda ter aprovado a medida por voto popular, o que implica em uma atmosfera de aceitação local, para entendermos como o país passou a encabeçar a lista mundial de gay friendly destinations da noite pro dia.
Para os interessados em casar na Irlanda, é importante ressaltar que a papelada leva três meses para ser liberada, e que os estrangeiros precisam estar no país por pelo menos 15 dias antes do casamento – o que deixa o setor hoteleiro ainda mais sorridente. Também é preciso verificar se o casamento será reconhecido no país de origem, já que isso depende de acordos específicos.
Tony (esq.) e Michael fizeram campanha pelo Yes nas redes sociais. “Não temos nada planejado ou discutido sobre isso, mas fico feliz em saber que agora, como qualquer outro casal, poderemos planejar desde a proposta até a cerimônia, e criar um dia especial em nossas vidas quando sentirmos que é o momento”, diz o brasileiro Tony Hoffmann, que vive na Irlanda há 14 anos.
5 – O divórcio “forçado” de transgêneros deixará de existir.
Segundo a Gender Recognition Bill 2014, uma pessoa interessada em reconhecer uma mudança de gênero tinha que ser solteira, forçando o divórcio em situações do tipo. Isso acontecia porque, sendo um homem e uma mulher casados, e um deles decidindo mudar de gênero ainda casado, implicaria em reconhecer o casamento entre pessoas do mesmo gênero ainda que temporariamente (passaria a ser um casal de dois homens, ou de duas mulheres), o que era ilegal.
E considerando-se que o divórcio amistoso já demora por aqui, a coisa podia virar um tormento se uma das partes se sentisse ofendida e resolvesse arrastar a briga por mais alguns anos. Agora, fica dispensada a necessidade de divórcio para dar início ao processo de mudança de gênero.
6 – No fim das contas, quase 50% das pessoas votaram no Não
Apesar do clima de felicidade e otimismo, o Não chegou bem perto dos 50% dos votos e quase perdeu em boa parte do interior – e a zona eleitoral de Roscomomm-Leintrim deu vitória ao Não. Assim, na prática, a aceitação do casamento homoafetivo ainda tem muito chão para andar em muitos condados irlandeses.
E você, que também mora por essas bandas, o que achou do resultado do referendo? Ele refletiu a realidade da Irlanda, ou tem muito preconceito escondido embaixo do pano? A coisa é pior no interior?
Ah, e por favor, meninas lésbicas: deixem seu recado e ponto de vista também!