O povo pigmeu da floresta tropical congolesa.
Guardião do povo e da cultura pigmeu
Eu descobri a existência do povo pigmeu ao assistir um documentário sobre eles na TV francesa. Fiquei ligada, pois fazia pouco tempo que havia me mudado para a República do Congo. Ao conversar com o meu professor de francês, demonstrei curiosidade por esse povo, que até então pensava ser uma lenda. Foi então que ele me informou que o seu irmão Sorel ETA é um protetor e guardião da cultura pigmeu. Sorel começou a trabalhar com os pigmeus no ano de 1996, já faz 22 anos que ele se interessou pelo modo de vida desse povo. Seu objetivo é promover e proteger a cultura deles, além de fortalecer o diálogo cultural.
Sorel decidiu trabalhar com os pigmeus Aka, logo após a uma constatação que ele fez em 1996, ao visitar pela primeira vez o norte do Congo. Ao descobrir essa cultura, ele ficou fascinado. No entanto, ficou chocado com a ligação entre esse povo e seus vizinhos Bantous. Era uma relação de mestre e escravo. Os pigmeus eram propriedade dos Bantous. Eles trabalhavam em suas plantações e executavam diferentes funções em benefício de seus mestres. Devido a essa constatação, Sorel decidiu que ajudaria esse povo. Foi a partir daí que tudo começou. Em 2001, Sorel montou uma associação chamada Regard aux Pygmées (Olhar aos pigmeus). Em 2003, ele montou um grupo de música chamado Ndima (floresta, na língua pigmeu). Sorel viaja o mundo todo com esse grupo.
No ano de 2018, o gupo Ndima efetuou sua oitava turnê europeia, depois de terem iniciado suas turnês em 2012. Eles estiveram em Genac, na França, para participar do Festival do Xamanismo e de um evento organizado na Borgonha chamado “Week-end pygmée” (Final de semana pigmeu). Na Alemanha, eles participaram do Festival de cantos a capella, organizado pela cidade de Leipzig. Depois seguiram para a Suiça, onde realizaram concertos escolares e participaram de um grande evento sobre a África organizado pelo Museu de Etnografia de Genebra. Sorel diz que essa turnê foi uma realização e todas as atividades que eles apresentaram foram um verdadeiro sucesso. O público europeu ficou contente de descobrir a cultura pigmeu Aka e sua diversidade. O guardião dos pigmeus se diz feliz, pois está alcançando todos os seus objetivos, junto ao seu povo Aka.
Quem são os pigmeus? Existe uma outra denominação?
O povo pigmeu (pygmée, em francês) é uma população da África Central instalada principalmente em zonas da floresta equatorial, onde eles vivem, de forma seminômade, da caça, da colheita e às vezes de um pouco de agricultura de vivência.
A etimologia do pigmeu é pygmaioi, uma palavra criada a partir de pygmaios (πυγμαιος), que significa o comprimento de um cúbito (unidade de medida antiga, na qual se mede o comprimento da mão até o cotovelo, mais precisamente o antebraço). Designado na mitologia grega como um povo de pequena estatura, segundo Aristóteles, os Pygmaioi mediam apenas 70 cm.
Os pigmeus tem diferentes nomes, dependendo do lugar onde vivem. Existem vários grupos ou tribos de pigmeus na África, tais como: Baka, Mbuti, Batwa, Babongo, Efé, entre outros. Na República do Congo, de onde Sorel é originário, podemos encontrar por exemplo grupos de pigmeus chamados: Louma, Mikaya, Ngombe, Mbenzele, Tswa, Bongo e Aka, sendo esse último o povo com quem ele trabalha há 22 anos.
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Onde eles vivem? Como eles se integram com o povo da cidade?
Os Akas habitam no norte da República do Congo e ao sul da África Central. Sabendo-se que eles habitam na floresta, às vezes nos vilarejos nas cidades, com vizinhos chamados de Bantous, é difícil falar da integração entre os pigmeus e o povo da cidade. Há uma minoria, que consegue circular e se integrar ao povo Bantous (habitantes das cidades), entre eles encontram-se os pigmeus Akas, que são os músicos, com os quais Sorel trabalha. A população urbana, diferentemente da população rural que divide a vida cotidiana com eles, os aceita sem muito preconceito. Eles não são tratados com desprezo, nem utilizados como mão de obra pelos agricultores. Já nas cidades a realidade dos pigmeus é totalmente diferente, quando eles habitam com os Bantous ou grands noirs (negros grandes, em francês).
Qual é o modo de vida desse povo, seus costumes e hábitos?
Tradicionalmente, os Akas são nômades. Atualmente, podemos encontrar grupos que estão em via de sedentarismo. Eles vivem da caça, da pesca e da colheita e do que encontram pela floresta. O modo de vida deles começou a mudar lentamente junto adaptando-se à modernização, assim como os índios brasileiros.
Os Akas vivem em lugares diferentes, segundo a estação do ano. Em certos momentos do ano, eles acampam na floresta. Em outros momentos, eles vão para os vilarejos onde coabitam com os citadinos. Nesses locais, ainda que eles continuem a frequentar a floresta para executar suas atividades pode-se afirmar que eles são frequentemente a serviço dos Bantous, que utilizam sua mão de obra em suas plantações, bem como em outros serviços.
A cultura dos pigmeus Aka é rica, mas infelizmente é desconhecida por grande parte da população e está ameaçada de desaparecer. Isso devido à desflorestação, à aculturação (processo pelo qual um grupo assimila total ou em parte um outro grupo) e ao etnocentrismo da população Bantous. Os Akas estão abandonando lentamente certas práticas tradicionais que são parte de sua cultura. Dentre essas, podemos mencionar as expressões de beleza, tais como os dentes talhados e as cicatrizes no corpo, que refletem a identidade deles. As técnicas de caça tradicional estão dando lugar ao uso de fusis. Do ponto de vista dos costumes, por exemplo, há exigências que são feitas antes do casamento, em que o pretendente deve cumprir um teste chamado “Bokope” antes de se casar com uma mulher. Essa prova daria segurança à família da futura esposa com relação às capacidades produtivas do futuro genro, pois nenhuma família aceita casar a filha com um homem preguiçoso. Devido a isso, os pais seriam obrigados a formar os seus filhos em atividades da floresta para enfrentar com sucesso no momento oportuno esse teste. Porém essa prática está começando a ser deixada de lado.
O casamento e poligamia
Nessa questão de poligamia Sorel diria que, de forma geral eles não são polígamos. No entanto, existe casais polígamos, mas essa prática dificilmente é aceita na comunidade, o que nem sempre é o caso dos Bantous ou Grandes negros.