Pontos a considerar antes de imigrar para a Finlândia.
Algumas das razões mais frequentes para que a pessoas considerem a Finlândia como novo lar são: casamento (seja este com um finlandês, seja para acompanhar o cônjuge que consegue uma boa oportunidade de trabalho aqui), a segurança e a educação de qualidade para os filhos. Claro que há outras razões, mas estas são as mais frequentes.
Razões mais que legítimas, não é mesmo? Mas não acho (minha opinião) que deveriam ser primordiais, pois não adianta nada ter isso e não sentir-se feliz.
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Pense em como é a sua vida no Brasil mesmo com todos os problemas do país. Você tem uma vida boa, estável e está satisfeito? Tem perspectivas de crescimento profissional, ama seu emprego e pode proporcionar a seus filhos qualidade de vida? Você sonha em morar fora ou nunca pensou nisso? O quão importante é para você ter sua independência, seu dinheiro e sua carreira? Com relação a seus filhos, o quão importante é para você poder escolher a escola, o pediatra e ter a liberdade de mudar isso quando quiser porque pode pagar? Quantos amigos você tem e como seria viver sem eles? E sua família; o quão próximos vocês são e o quão difícil seria para você viver longe deles?
Eu poderia escrever este texto inteiro só com perguntas importantes para você se fazer antes de sequer pensar em vir para cá, sabe por que? Porque muito provavelmente sua vida será o oposto disso tudo, pelo menos no início. E este início eu diria que demora no mínimo 2 anos. Este também é o período em que o governo considera mínimo para a adaptação no país e início da integração.
Sim, você terá segurança e escola pública de qualidade para seus filhos, mas o preço disso pode ser mais alto do que você pensou em pagar, dependendo de suas prioridades. Ser uma pessoa de classe média com uma vida estável no Brasil e ser uma pessoa de classe média com uma vida estável na Finlândia são coisas muito diferentes. E essa diferença está na raiz do sistema mesmo. Aqui, você não terá liberdade de fazer o que quiser porque pode pagar.
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Seu filho terá que estudar na escola do bairro, se adoecer, você terá que levá-lo no posto de saúde local e esperar na fila, não terá atendimento por médico especialista antes de passar por um clínico-geral (que irá decidir se há ou não necessidade de um), você terá que passar pelas burocracias e filas de espera para todos os serviços que precisar, vai lidar com profissionais competentes e incompetentes como em qualquer lugar do mundo.
Aqui não existe plano de saúde como no Brasil. Você pode ter um seguro que englobe saúde, mas estes sempre têm um valor mínimo pago do próprio bolso, e este valor é quase sempre mais alto do que a consulta, a não ser que seja um seguro de trabalho, que é mais abrangente. As consultas são caras e nem sempre a clínica é perto. O mesmo para escolas. Há escolas pagas na Finlândia e creches particulares. Normalmente escolas internacionais. Mas custam caro, têm exame de seleção por conta de não haver muitas vagas e não existem em todas as cidades. A oferta é bem pouca. Quanto as creches particulares, há bastante oferta, mas são bem caras também e nem sempre serão próximas à sua casa.
Se qualidade de vida para você engloba poder escolher por estes serviços e ter um tratamento especial por poder pagar, como normalmente é no Brasil, você provavelmente irá se decepcionar muito com o sistema finlandês.
Se você nunca teve vontade de imigrar, mas pensa em fazê-lo para satisfazer o sonho de seu cônjuge ou porque pretende casar-se com uma pessoa finlandesa, pondere não só no que você terá a ganhar vindo para cá, mas no que você irá perder. Explico.
Se você tem seu emprego, sua carreira e independência, se tem seu círculo social, sua família próxima, uma rede apoio boa, pense se você está preparado para perder tudo isso. Sim, perder. Porque mesmo que você conquiste tudo isso aqui, muito provavelmente isso irá demorar e, sim, pode ser que você nunca consiga ser o que era no Brasil e tenha que pensar em alternativas totalmente diferentes das que jamais sonhou. (Continua abaixo da propaganda)
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Um grande choque pode ser tornar-se dona de casa na Finlândia. Ser dona de casa no Brasil quando se é de uma família com estabilidade financeira é muito diferente. Você cria toda uma rede de apoio ao seu redor: babá, faxineira, cozinheira etc. Ser dona de casa aqui é muito mais próximo da vida de uma pessoa sem recursos no Brasil, onde a dona de casa tem que fazer absolutamente tudo e sozinha. Você leva, busca, vai ao mercado, faz almoço, faz jantar, limpa a casa e, assim, o dia já acabou e você está exausta. Se você não ama fazer isso, se sempre vislumbrou uma carreira, sempre gostou de trabalhar, mesmo que não precisasse, são grandes as chances de que você odiará sua vida aqui se tiver de ser dona de casa.
Para quem tem cônjuge finlandês, digo também que aquela relação com os avós, onde a vovó larga tudo para ficar com o netinho, é muito rara, muito mesmo. A consequência disso é ter uma vida social não muito movimentada, não ter muitas oportunidades de curtir o casamento saindo para jantares românticos, cineminha e coisas do tipo. Principalmente no inverno (e pode por aí uns 5 meses), sua vida pode ser bem restrita a afazeres domésticos e cuidar dos filhos, principalmente se você morar em uma cidade pequena sem muitas opções.
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Fazer amigos não é fácil. Finlandeses são introspectivos, tímidos e acostumados a viverem dentro de seu próprio círculo, não é fácil quebrar este círculo.
Outra coisa muito importante: se você chegar com filhos pequenos ou se, no caso de mulheres, engravidar antes de já estar integrada, pode demorar 3 anos até que você tenha como poder estudar, arrumar trabalho ou participar de projetos de integração. Explico.
Como a mãe pode ficar em licença-maternidade até a criança completar 3 anos, o sistema público não vê como prioridade que a criança nessa faixa etária fique na creche. Como as vagas são limitadas, a prioridade é para os pais que trabalham. Se você arrumar um emprego, claro que haverá vaga em uma creche para o seu filho, mas você não terá muita flexibilidade para procurar enquanto tiver com um bebê. Normalmente, quando um dos pais não trabalha, a criança só tem direito a ficar na creche 20 horas por semana.
Ah, mas não posso procurar um emprego durante esse período?
Claro que pode! Mas não é fácil encontrar emprego na Finlândia sem falar finlandês ou sem ter um inglês muito bom (dependendo da carreira o inglês pode ajudar).
Finalizo batendo na tecla do idioma: nada é mais importante para a integração do que a possibilidade de uma comunicação eficiente, para que você possa analisar e entender os códigos, para minimizar os mal-entendidos. Sei que é quase impossível vir para a Finlândia sabendo a língua, mas se você não souber falar nem mesmo inglês muito bem, sua vida aqui será muito complicada. Você sempre dependerá de alguém para fazer as coisas mínimas, muito provavelmente passará por inúmeras situações onde o mal-entendido causará realmente um mal, mas o mais importante: você não conseguirá entender o sistema do qual você faz parte e isso pode tornar sua vida infeliz.
Eu poderia escrever muito mais, mas paro por aqui e deixo para você o desafio de pensar se realmente este é o lugar certo para você, mesmo com toda a segurança que ele proporciona. A Finlândia é o meu lugar, tenho muita sorte por ter conseguido conquistar a vida que sempre quis ter, mas sei que minha história não é parecida com a de muitas pessoas.
2 Comments
Muito bom texto.
Moro na Dinamarca e entendo perfeitamente o que voce diz.
Mes que vem completo 3 anos aqui e mesmo tendo concliuido o curso de idioma dinamarques, e de ter comecado um curso profissionalizando aqui 100% em dinamarques, ainda me sinto deslocada e com dificuldades de entender a cultura, normas e habitos muitas vezes tao diferentes dos nossos no Brasil. E o inverno escuro e nublado, nao anima muito.
Muitas vezes, me pego imaginando como seria se eu nao tivesse me apaixonado pelo meu viking e mudado para ca ha quase 3 anos atras…
Obrigada por mostrar um dos lados de nossas escolhas.
Muito obrigada a você, Simone!
Eu acredito que os países nórdicos sejam muito parecidos. Temos climas parecidos, sistemas parecidos e histórias parecidas. Eu tenho total consciência dos choques culturais que quem chega sem conhecer nada disso passa. Espero que seja muito feliz.
Um grande abraço,
Maila