“Oi, tudo bem? Quando você volta?”. Talvez essa seja a frase mais escutada, ou lida, nesses tempos de tecnologia por aqueles que deixam seu país e vão morar em outro lugar.
Com as festas de final de ano e férias no Brasil, essa seja talvez uma das frases que eu mais ouço ou mensagem que mais recebo de todos, familiares ou amigos. Na verdade essa é a frase que eu escuto desde que cheguei aqui e entendo também recebê-la pelo fato de que, desde que mudei, ainda não voltei ao Brasil.
Cheguei na Espanha em julho de 2014 e tinha que tramitar minha autorização de residência, que não é um procedimento fácil e tampouco rápido. No meu caso, a minha autorização demorou quase 4 meses e quando finalmente a recebi, haviam autorizado apenas a residência mas não o trabalho.
“E aí, quando você volta?”. Não tinha voltando ainda pois, embora com a autorização de residência, eu não podia trabalhar e tinha que pensar o que faria. Mudar de país não é tão fácil quanto muitos pensam, é um processo de amadurecimento muito duro e, por muitas vezes, solitário. Você partiu, as pessoas sentem a sua falta, mas todos seguem com suas vidas e suas rotinas, você não. Há muito o que fazer, o que aprender, é um processo de aculturação e inserção em uma nova sociedade a qual muitas vezes você demora a se identificar.
Resolvi então estudar um mestrado na minha área. As aulas aqui são durante a tarde e noite e assim eu passei a ter somente as manhãs livres. Além disso, o ano letivo não é igual ao Brasil. Comecei as aulas e logo veio o verão, quem mora na Europa sabe como, ao contrário do Brasil, as estações do ano são bem delimitadas e quando finalmente chega o verão, depois de um outono e inverno frios, você não quer viajar para o hemisfério sul e emendar outro outono/inverno.
“E aí, quando você volta?”. Na segunda etapa do mestrado eu tinha que escrever minha tese e fazer um estágio profissional para poder concluir o curso. Entre escrever uma tese em outra língua que não é a sua e o estágio, não voltei e não tinha planos de voltar. Depois de 2 anos de mestrado, conclui o curso e já era hora de buscar uma recolocação no mercado de trabalho, afinal eu estava sem trabalhar desde que cheguei na Espanha. Era o momento de priorizar a mim mais do que a necessidade dos outros de me ver. Pode parecer egoísta, mas eu não estava viajando ou passeando pela Europa, eu tinha que organizar minha vida.
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“E aí, quando você volta?”. Uns dirão que é sorte, outros competência, não me importo que seja um misto dos dois, mas eu consegui um bom emprego que me permitia trabalhar minimamente na minha área e, finalmente, sentir-me inserida na sociedade novamente, com uma rotina, com uma vida. Isso atrasou os planos que tinha de voltar ao Brasil de férias esse ano.
Ao longo desses 3 anos em que moro na Espanha a frase “e aí, quando você volta?” foi a que mais recebi entre alguns amigos e familiares. As conversas nunca foram iniciadas ou continuadas por um “como é morar aí?”, “como foi tal viagem?”, “como está o mestrado?”, ou até mesmo uma conversa rotineira, como se eu ainda estivesse no Brasil, como tenho com tantos outros amigos.
Com certeza as pessoas fazem isso porque querem te ver, mas soa quase como uma cobrança e é uma cobrança muito difícil. São anos que você passa perdendo eventos, reuniões, festividades familiares, saídas com os amigos, mas também são anos que você passa realmente se conhecendo, saindo da sua zona de conforto, se redescobrindo e descobrindo que o mundo é muito maior do que aquilo que conhecíamos antes.
É uma fase onde você ainda não se identifica por completo no local onde você está, mas também não se identifica mais tanto com o local de onde você vem. É querer voltar por alguns dias para rever as pessoas, matar a vontade das suas comidas preferidas, mas é também querer ficar e voltar somente quando esteja estabilizado, é estar sempre dividido entre querer agradar as pessoas e a si mesmo.
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Morar fora é sentir-se um pouco culpado por buscar seus sonhos e deixar pessoas para trás, é sentir-se um pouco egoísta e ao mesmo tempo pressionado a agradar a todos para compensar sua ausência.
“E aí, quando você vem?”, essa é a minha proposta a todos que diariamente me enviam mensagens perguntando quando estarei pelo Brasil, para todos aqueles que tiram férias e vem para a Europa, mas não tem tempo de dar uma passadinha por aqui, ou até mesmo aqueles que planejam, mas ainda não tiveram coragem de tirar os planos do papel: a Espanha está de portas abertas a todos. E para todos aqueles que têm um familiar, amigo ou conhecido que decidiu se aventurar pelo mundo, minha dica é: compreensão e apoio, não é fácil para quem fica e menos ainda para quem parte.
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Que esses sejam os nossos planos para esse ano que se inicia.
7 Comments
Texto lindo ! voce sempre terá o nosso apoio e compreensão… estamos felizes por estarmos aqui pertinho de vc! Só uma perguntinha…. qdo vc irá ao Brasil rsrsrs Amo vc!!! ?????
Senti uma sensação engraçada ao voltar… Todos já tinham seguido sua vida, claro.. E percebi nessa pergunta algo de ”Perguntavam quando eu voltaria porque era uma pergunta clássica”. Pq no final, ninguém possui tempo pra mim, a gente toma um café junto e depois não te chamam mais pra sair, você não recebe mais o convite da festa de aniversário e nem faz parte do almoço de domingo, eles já se acostumaram a não te ter aqui. E nisso, a percepção de ”a minha vida não é mais aqui”.
Bom dia Thais Maciel Gomes,
Venho acompanhando alguns textos do deu blog, poruqe estou organizando as coisas para me mudar para Valência, se tudo der certo, nos próximos meses.
Desculpe te incomodar, porém eu tenho uma duvida sobre o NIE para conjunge, gostaria de saber como posso entrar em contato com você, caso você possa me ajudar
Desde já agradeço e continue com seu otimo trabalho escrevendo sobre suas experiências na Espanha, isso nos ajuda muito.
Texto lindo e encorajador!
Abraço.
O engraçado é que quando a gente volta, depois de 5 minutos de conversa, ja começam a perguntar: E aí, quando você vem outra vez?
Você conseguiu somente autorização de residência pois estava a estudo?
Olá Pedro,
A Thais Maciel Gomes, infelizmente parou de colaborar conosco.
Obrigada,
Edição BPM