Seis dificuldades de adaptação na França.
Quando nós chegamos em algum país, em geral, temos alguma ideia das dificuldades que encontraremos, ou porque pesquisamos na internet, ou porque temos um amigo que já morou lá, ou porque já moramos fora, mas de alguma forma chegamos sabendo um pouco de quais serão os perrengues da nova vida. Ainda assim, algumas coisas nos surpreendem no caminho e aqui vão algumas das que me pegaram desprevenida.
1) A língua: essa é muito óbvia, mas ainda hoje é a mais difícil para mim. Já moro aqui há um ano e meio e não falo francês confortavelmente. Eu já tinha aprendido o italiano depois de adulta e tinha a expectativa de que aprender francês teria o mesmo grau de dificuldade que o italiano, mas não foi bem assim. Francês é uma língua bem difícil e as minhas maiores dificuldades no francês são a pronúncia, pois a língua tem muitos sons que não temos em português e as contrações entre palavras que fazem com que os franceses falem muito rápido. Eu cheguei aqui sem falar nada, faço aula de francês duas vezes por semana e hoje considero que tenho um nível entre intermediário e avançado. Acho que eu poderia estar falando muito melhor se eu tivesse amigos franceses ou trabalhasse aqui, considero a exposição que eu tenho ao francês muito pequena. O que me ajudou muito foi começar a fazer trabalho voluntário e ter achado uma francesa que queria aprender português e fizemos um “language exchange”. Então, a minha dica é: se empenhe em aprender ao máximo a língua antes de vir para evitar muitos perrengues, principalmente se você vai para uma cidade pequena em que as pessoas não estão acostumadas a falar inglês.
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2) A individualidade francesa: fiquei fazendo voltas sem saber como colocar em palavras o que eu sinto aqui. Acho que a minha sensação geral é “ninguém se importa com ninguém”. Os franceses são muito cordiais, mas não estão nem um pouco preocupados com os seus problemas. Eu sinto muito isso em relação aos serviços aqui. Sabe quando você precisa de algo no Brasil e aí você explica a sua situação para a pessoa e ela te ajuda? Aqui isso não existe. Você pode dizer que está faminto, que rodou todos os restaurantes da cidade, que o garçom não vai te deixar sentar se ele estiver a meia hora de fechar o restaurante. Ele também vai dizer que está lotado mesmo que tenha uma mesa ruim virada para a parede que esteja vazia. Se você precisar de algum serviço mais rápido porque vai viajar, o problema é seu. Se você precisar de uma consulta urgente, mas o seu médico está lotado, o problema é seu. Se você reservou uma mesa para 4 pessoas no restaurante e chegaram 5, o problema é seu, ninguém vai tentar te ajudar a ter uma mesa maior. Claro que essa é a minha experiência e que os franceses se preocupam sim com os outros em relações íntimas, mas não é o que eu vejo nas relações do cotidiano.
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3) Viver sem carro: essa, na verdade, foi uma das melhores coisas que me aconteceu, mas a minha adaptação a ela foi difícil. Toulouse é uma cidade onde você não precisa de carro para nada. Quase tudo pode ser feito a pé ou de bicicleta e, quando não der, a cidade ainda conta com duas linhas de metrô, duas de tram, fora os ônibus. As minhas duas grandes dificuldades foram me acostumar de novo a andar de bicicleta, pois eu sentia muito medo de andar no meio dos carros no começo; e me acostumar a tomar chuva (convenhamos que essa segunda parte eu ainda não gosto), mas depois que eu passei a andar de bicicleta para todos os lados a minha vida ficou muito mais simples aqui.
4) Fazer novos amigos: eu sou uma pessoa extrovertida que vive à base de amigos e, embora para mim não seja muito difícil fazer amigos, viver sem eles até que esse laço aconteça é bem difícil para mim. Uma dica preciosa para quem puder evitar: não chegue no inverno, que foi o que eu fiz. Eu não tive escolha, mas se eu tivesse teria evitado. Nós não estamos acostumados com o frio daqui e temos uma tendência enorme a ficar em casa quando está frio, o que em São Paulo significava uma semana para mim, mas aqui significam meses. Chegar não sabendo a língua, sem amigos, sem família, no frio, foi uma péssima combinação para mim e eu quase deprimi. Eu simplesmente não tinha motivos para sair na rua, só saia para o meu curso de francês e necessidades básicas e depois me enfiava em casa.
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5) Adaptar o cardápio: não posso reclamar por estar na França, né? É um paladar já conhecido para nós brasileiros, então não tive um choque cultural, mas mesmo assim tivemos que adaptar o nosso cardápio. Eu sou uma pessoa carnívora (posso dizer que eu comia carne vermelha quase todo dia no Brasil) mas aqui a carne de vaca é cara e não é tão boa, então, essa foi a primeira grande mudança. Além disso, paramos de comer feijão e só fui me dar conta de que quase não estávamos comendo ferro depois de meses aqui quando meu cabelo começou a cair. Aí adaptamos para comermos mais lentilha e grão de bico. Acrescentamos no nosso cardápio uma quantidade muito maior de pratos que levam ovos e também incorporamos hábitos franceses, como sempre ter queijos diversos em casa, saladas deliciosas, fazer quiche, pato (aqui no sul se come muito) e substituir o arroz por batatas.
6) Trabalhar em casa: essa não foi uma dificuldade particularmente sobre viver na França, mas passar a trabalhar em casa foi uma das maiores mudanças que a vida na França me trouxe. Se antes em São Paulo eu saia às 8h para voltar às 22h, aqui, se eu deixar, eu posso passar dias seguidos sem sair de casa. Precisei estabelecer uma rotina e ter bastante disciplina para fazer coisas na rua e também ir trabalhar em cafés em períodos nos quais eu não tenho pacientes para atender. Imagino que não passar muito tempo em casa também seja um desafio para muitas pessoas que estão chegando e não sabem a língua ou não tem companhia para passear, então, criar esses artifícios é sempre uma boa saída para não deprimir em casa.
E você? Quais foram as suas dificuldades para se adaptar ao país que você mora?
5 Comments
Oi Fernanda! Nossa, você descreveu exatamente as sensações que tenho desde que vim morar na França! Principalmente sobre a língua e as pessoas. Também cheguei no inverno… É deprimente! Mas aos poucos (mesmo que lentamente) vamos nos adaptando mais né?!
P.s: Moro em Toulouse também, então me identifiquei ainda mais 🙂
Oi Elaine, que gostoso saber que você se identificou. Cada pessoa tem uma experiência morando fora, mas algumas coisas nunca mudam muito. Você mora em Toulouse? Gosta daqui?
Gente. É exatamente assim.
Menos a parte de parar de usar carro, pq moro numa cidade pequena perto de Paris.
Mas não fiz curso de francês e depois de 3 anos não tenho amigos. Louca pra voltar pro Brasil!!’
Vivo ainda isso. Mesmo depois de anos aqui na França, não consigo me adaptar. Não desenvolvo na lígua e me sinto bem para baixo. Isso me atrapalha em todos os sentidos da minha vida aqui. Tenho pensado seriamente em voltar ao Brasil (não que as coisas lá estejam melhores, mas pelo menos eu me sentiria mais acolhida). 🙁
Fernanda você atende online?
Olá Nathalia,
A Fernanda Libardi, infelizmente parou de colaborar conosco.
Obrigada,
Edição BPM