Terremotos no Chile.
Já falei um pouco sobre como o poder da natureza se mostra por este lado da cordilheira em outro texto publicado aqui. No dia 16 de setembro, próximo às oito da noite, tivemos mais uma amostra desse poder, com um terremoto de 8,4 graus na escala Richter no centro norte do país, que culminou num alerta de tsunami para toda a costa chilena. Santiago também foi chacoalhada, com menos intensidade mas com bastante susto, especialmente para os estrangeiros que não viviam aqui durante o terremoto em fevereiro de 2010, de 8,8 graus Richter, cujo epicentro foi ao sul da capital chilena.
Em 2010 o terremoto nos pegou de madrugada. Era sábado, pouco depois das 3:30 da manhã. Muitos dormiam, se preparando para os últimos dia de férias (aqui as aulas começam em março); alguns acabavam de deitar depois de uma festa, outros ainda estavam no meio de alguma comemoração. Naquele instante a terra se fez ouvir com um barulho subterrâneo assustador seguido de chacoalhões tão fortes que mal dava para ficar em pé, dependendo do andar em que a pessoa se encontrava.
Eu estava no segundo andar de uma casa e, como sempre, a primeira reação foi acordar o namorado, que num primeiro momento me mandou ficar calma e voltar a deitar porque provavelmente ia parar em alguns segundos. Mas não foi assim. O tremor continuou e ainda mais forte do que inicialmente. A casa começou a balançar mais da conta e confesso que até o dia de hoje tento me visualizar descendo as escadas, mas não consigo, por mais que me esforce.
De repente me vi na porta de entrada e me segurando no batente pra não cair no chão, repetindo em voz alta (ou será que estava gritando?): “já vai passar, está tudo bem”. Foram os 3 minutos mais longos de minha vida, até o momento.
Nas horas seguintes, dormir foi tarefa impossível porque a cada certo tempo vinha uma réplica, um tremor de menor intensidade, mas bastante perceptível. Meu marido me acompanhou até o shopping onde deveria trabalhar, mas vimos logo de cara que nada abriria naquele dia porque haviam guardas avisando que as passarelas do segundo andar cederam e todas as vitrines explodiram, portanto não era seguro entrar ali.
Nas ruas víamos enormes filas nos postos de gasolina; pessoas desesperadas comprando água, sucos, refrigerantes, velas, fósforos, alimentos enlatados ou não perecíveis; os açougues vendendo tudo a preço de banana nos setores onde não havia luz… Enfim, todas as cenas de filmes de fim dos tempos podiam ser apreciadas naquelas horas que sucederam o terremoto.
Quando a luz voltou, a tragédia parecia ainda maior, já que as notícias sobre as cidades mais afetadas não eram das melhores. Ainda havia muitos desaparecidos depois do tsunami e alguns edifícios no sul e em Santiago ficaram com as estruturas abaladas pelo tremor.
As semanas que se seguiram foram cheias de réplicas de várias intensidades, que causavam uma sensação de insegurança na maior parte das pessoas, eu mesma inclusa. Passei a evitar ir a edifícios, especialmente os de andares muito altos e aos poucos fui entrando na paranoia midiática de que o pior estava por vir, que tínhamos que nos preparar: via, revia e revivia a tragédia daquele dia e acabei tendo algumas crises de ansiedade.
No fim das contas, depois de tanto estresse, consegui uma transferência para voltar para o Brasil, onde fiquei por dois anos com o então namorado. Lá nos casamos, fiz terapia para superar o susto que passei e descobri que não foi o tremor em si que me causou a ansiedade mas, sim, o excesso de televisão.
Agora que estamos de volta, durante o terremoto do dia 16 de setembro deste ano o marido ficou mais preocupado comigo do que com ele mesmo ou do nosso filho. Eu estou grávida, então a preocupação foi ainda maior. Passado o terremoto, a cada réplica recebo uma ventania de mensagens de pessoas querendo saber como me sinto, mas a verdade é que sem me render aos meios de comunicação de massa e sua histeria coletiva, fica tudo muito mais fácil.
Recordo o terremoto anterior e me acalmo ainda mais de lembrar o que eu vi e o que se viu na televisão era bastante diferente. O sul foi bem devastado, é verdade. Um edifício inteiro foi para no chão; muita gente morreu, muitos desaparecidos, cidades inteiras ficaram incomunicáveis… Mas Santiago aguentou bem o tranco. Com algumas exceções, as estruturas resistiram muito bem e as pessoas voltaram ao normal rapidamente.
Agora, até a forma como o chão se moveu foi diferente e menos agressiva na capital. Desta vez o aviso de tsunami para toda a costa foi dado a tempo e a mortalidade foi baixíssima por causa disso. Em Santiago, o dia seguinte ao terremoto foi absolutamente normal, e mesmo com muitas réplicas o tempo todo, não houve caos nem histeria coletiva em nenhum âmbito.
Por tudo isso, digo para quem tem planos de vir para cá de visita ou para morar que não precisam se assustar: mesmo que a terra volte a tremer, é uma país com estruturas bem preparadas e na maioria dos lugares há procedimentos para uma evacuação segura. Para saber como se comportar em caso de tremores de terra, o site da ONEMI tem excelentes dicas, como você pode ler aqui.
9 Comments
Oi Joy que bom que ficou tudo bem contigo! Eu estava aí no terremoto do dia 16 de setembro, estava no quarto andar de um hostel, demorei pra perceber o que tava acontecendo mas aí depois desci as escadas e o pessoal do hostel tranquilizou todo mundo mas eles não ligaram a tv, realmente é melhor não ligar ne?! No dia seguinte me mudei de hospedagem e fiquei no 19 andar e sozinha durante a tarde e acabei vendo tv por um tempo mas dps percebi que não era mt legal isso, pra não ficar mt impressionada. Enfim, já era a quarta vez que ia ao Chile e nunca havia sentido nem um temblor, na próxima vez eu talvez vá pra morar, pelo menos agora já sei como é um terremoto já que antes não sabia qual seria minha reação, e pelo menos com esse, foi relativamente tudo bem.
Bjs
Oi, Nathalia, que bom que nao ligaram a TV no hotel porque realmente mesmo ficando tranquila depois do evento, vamos vendo a magnitude da tragédia em outros lugares e, aqueles que sofrem pelos demais (como eu), acabam ficando mais nervosos. Por um lado, realmente foi positivo você ter passado por esse evento natural assim já sabe como é a situação. Mas espero que não aconteça tão logo. Abraços.
Que legal o seu texto! Muito bom pra deixar a gente mais tranquila! Estamos aqui a um mês e confesso que pensar em terremoto é um negócio que me apavora. Obrigada pelas dicas! Beijos.
Oii Joy 🙂
Farei um intercâmbio e escolhi o Chile para aprimorar meu espanhol. Acha uma boa??
Uma das grandes amigas da minha mãe tem os pais chilenos e ela estava em Valparaiso nesse ultimo tremor. Ficamos assustadíssimas aqui no Brasil , mas como ela já havia morado alguns anos aí estava bem treinada.
Sempre fui apaixonada pelo país, passando horas estudando a história e costumes. Tenho uma alma etnóloga, de fato (hahahah), por isso quero morar um tempo no Chile para estudar a língua, os weones e poder abrir a janela de manhã e ver os Andes.
Bjs
Olá Pâm, Muitos nao aconselham estudar espanhol aqui porque eles falam cheio de gírias, nao conjugam bem os verbos e usam muitas muletas na hora de falar. No entanto, também é certo que se você entende o chileno, dificilmente terá problemas de compreensao com outros hispano falantes. Nas escolas costumam ensinar um espanhol mais neutro tb.
Espero que você curta sua estadia por aqui e que nao haja nenhum tremor de grande magnitude.
Oi, Joy. Tudo bem? Estou lendo diversos dos seus posts e me informando. É muito bom ter uma opinião para dar um horizonte…
Estou cogitando ir residir em Santiago, pois meu marido recebeu uma proposta para tal, mas estou avaliando diversos pontos e um deles é a questão do terremoto. Tenho medo!
Outro ponto é que estou pensando em engravidar novamente (acabei de passar por um aborto) e minha gravidez exige um cuidado especial, pois tenho uma mutação no sangue que aumenta o risco de uma trombose durante a gravidez e é provável que eu não possa passar por parto normal, apenas cesária.
Li neste post que você estava grávida durante o terremoto e gostaria de saber sua experiência com a gravidez durante sua moradia no Chile. Estou me programando para estar em Santiago na próxima semana (21/3/16 a 25/3/16) e talvez possamos até mesmo nos encontrar. O que seria um imenso prazer… Abraços.
Olá, Elaine, Aconselho a ler meu post sobre nascer em Santiago. Eu tenho as duas experiências aqui no Chile, em saúde pública com meu primeiro filho (parto normal com intervençoes) e agora acabo de ter um parto natural no sistema particular. Difícil é achar um médico no qual a gente confie 100%, mas há vários lugares para buscar indicaçoes, inclusive no grupo de maes que moram aqui no Chile e sobre o qual falo em outro texto publicado aqui no Blog.
Quanto aos terremotos, é o que eu digo, difícil é perder o medo, mas as construçoes sao bastante seguras e algumas das mais elogiadas mundo afora nesse quesito.
Abraços, espero que goste dos outros posts.
Joy, muito obrigada por sua atenção. Lerei todos os artigos que indicou.
Muito bom o texto!
E parabéns pelo blog!