Chega o inverno no hemisfério sul e começam as frentes frias. Deste lado da cordilheira, o comum é que nesse período chova muito e comece a nevar em várias partes do país. Em Santiago, as temperaturas costumam baixar bastante, as manhãs são muito frias e chuvosas, mas nem todo ano neva. Neve mesmo, vemos somente em localidades mais próximas à cordilheira.
As mudanças climáticas podem ser notadas a cada ano desde que cheguei, em 2006. Já passei por diferentes tipos de inverno. Ano passado, por exemplo, a temporada de neve demorou tanto a chegar, que houve uma política de devolução de dinheiro e modificação de datas para quem comprou passes e estadias para os primeiros dias do suposto início da temporada.
Este ano a temporada começou dentro do prazo, tendo em vista que já fazia frio em meados de abril, com algumas chuvas e neve suficiente para tirar umas fotos bem bonitas. Desde o começo de junho já foi possível brincar na neve e praticar esportes de inverno nas principais estações de esqui do país, desfrutando de lindas paisagens.
Mas enquanto na cordilheira tudo é lindo, branquinho e o ar é puro, em outros setores da cidade a coisa muda de figura. Santiago é uma cidade que fica num vale, localizado entre as cordilheiras dos Andes e a do Mar. Quando começa a temporada fria, a poluição do ar fica presa nesse vale, causando uma nuvem de partículas visível a olho nu de diversos pontos da cidade, especialmente depois de alguns dias sem chuva.
Nos dias mais críticos, o ar fica pesado, as aulas de educação física são suspensas pelo Ministério de Educação e recomenda-se que não se pratiquem esportes ao ar livre. Além disso, há rodízio de trânsito em toda a cidade entre às 7:30 e 21:00. Em dias considerados como pré-emergência e emergência ambiental, podem chegar a colocar 2, 4 e até 6 dígitos finais de placas de veículos com proibição de circular pela cidade.
As doenças respiratórias e alergias aumentam consideravelmente nessa época. Os que mais sofrem são os pequenos, pois sua imunidade ainda está em desenvolvimento, e pessoas da terceira idade, que tendem a estar com suas defesas baixas. Mas jovens e adultos saudáveis também sentem o efeito do ar poluído nos dias mais críticos, quando a respiração fica mais pesada e até pequenas corridas podem fazer o peito chiar, além disso, muitas pessoas sofrem de dores de cabeça com maior frequência nesse período.
Em meus anos de Chile, morei em várias comunas: Recoleta, Estación Central, Providencia, Santiago Centro e Las Condes. Fui sentindo a diferença em vários aspectos em cada uma delas e, pouco a pouco, a qualidade do ar passou a integrar minha definição de qualidade de vida.
Hoje moro em La Florida, quase no limite de altura onde é permitido construir na cordilheira, e há dias em que simplesmente não se vê Santiago, ou nota-se uma nuvem marrom acinzentada no horizonte, logo acima da cidade. Aqui quase sempre há um vento “de cordilheira”mais frio nessa época, mas que ajuda bastante a manter o ar mais “respirável” do que em outros pontos da cidade.
A questão da contaminação e como ela afeta a saúde e o dia a dia de quem mora em Santiago é tão relevante, que todos os anos o governo faz campanhas sobre os cuidados para evitar o contágio das gripes e resfriados típicos da época, tais como cobrir a boca ao tossir ou espirrar, usar lenços descartáveis e jogá-los no lixo e lavar as mãos frequentemente.
As creches e escolas solicitam que os alunos que apresentem sintomas de doenças virais fiquem em casa para evitar que mais crianças adoeçam. As clínicas e consultórios solicitam que os pais avaliem a urgência das crises de crianças em casa e que prefiram conseguir horários de consulta com os médicos de consultórios, evitando levar crianças e bebês muito pequenos aos pronto-socorros.
Ainda assim, em junho do ano passado foi decretada a pior situação da qualidade do ar dos últimos 16 anos e o atendimento nos centros de saúde foi bastante tenso, já que tanto o sistema público quanto o particular tiveram problemas com os tempos de espera para atender a tanta demanda. Lembro de uma amiga que chegou a ficar 4 horas na sala de espera com a filha pequena em uma das clínicas particulares mais importantes de Santiago.
Mas como toda estação, até mesmo o inverno chega ao fim. E ao finalizar o mês de agosto (quando costuma passar o período de frio mais intenso), em várias comunas, há festas especialmente para as pessoas da terceira idade que “passaram agosto” e podem (às vezes literalmente) voltar a respirar aliviadas.
2 Comments
Olá!
É bem isso mesmo. Fiquei um mes em Santiago, e mal podia usar lente de contato.
Quais são os bairros mais respiraveis? Penso em voltar ao Chile para uma temporada maior, 6 meses ou 1 ano.
Adorei o blog e o estou acompanhando!
Olá, se tua intençao é ficar mesmo em Santiago, os bairros com melhor qualidade de ar sao os que ficam mais próximos à cordilheira e costumam ser mais caros: Lo Barnechea, Las Condes, La Reina, Peñalolén e o setor alto de La Florida…. Abraços e boa sorte