Para o segundo texto da série “Repensando o turismo”, trago aqui um dos tópicos mais paradoxais do tema. De um lado, o turismo é responsável por girar economias de cidades e até países inteiros. Por outro lado, a sua falta de regularização e a dificuldade para tal é uma ameaça e dor de cabeça para moradores e governantes.
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A massificação do turismo, como podemos ver com a compra de pacotes e roteiros por grandes grupos e pontos turísticos ultra-famosos que ficam lotados de pessoas é um dos problemas desse turismo desenfreado que acaba causando, a longo prazo, uma ”caricaturização” da real experiência.
Essa massificação torna a vivência um espetáculo e, por que não dizer, uma mentira. Como se o espectador estivesse indo para um teatro em que ele, o turista, é parte da peça superficial em significado. Tudo não passa de uma representação e, novamente, uma “caricaturização” muito bem ensaiada. Faço assim minhas as palavras do Situacionista Guy Debord “Tudo o que era vivido diretamente tornou-se representação”, em que o natural e o autêntico se tornam ilusão.
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Essa super produção do espetáculo desencadeia algumas consequências. Não é raro ir a ambientes extremamente turísticos e encontrar pessoas com roupas ditas típicas, mas, que se não fosse para o simples deleite do consumidor eles não estariam vestindo. Ou perceber que a comida local se adaptou ao paladar do turista: sem pimenta, sabores não tão fortes ou exóticos, ou rituais chocantes aos olhos sensíveis do estrangeiro que são adaptados ao público. Existe toda uma modificação da realidade com a única e exclusiva finalidade de vender mais.
Há, também, o que considero o pior impacto do turismo em massa: o aumento vertiginoso dos preços de tudo. Como consequência, há um aumento no custo de vida fazendo com que os nativos percam o seu próprio espaço geográfico. Não mais conseguem usufruir das praias paradisíacas, bairros centrais, muito menos restaurantes. São cada vez mais empurrados para periferias pouco desenvolvidas ou outras cidades, dando lugar à moradias temporárias e a casas de privilegiados estrangeiros que compram terrenos a “preço de banana”.
O turismo de massa, assim como qualquer consumo desenfreado, devora aquilo que o alimenta. Isso quer dizer que, a longo prazo, o que faz dos lugares um ser vivo, dinâmico e interessante, ou seja, seus habitantes nativos, não estarão mais lá morando, como se, analogamente, apenas sobrasse o esqueleto, e os turistas, urubus, terminariam de acabar com o último pedaço de carne, os moradores.
No fim, no futuro, visitar países que foram tomados e devorados por esse tipo de economia não será muito diferente do que ir a Las Vegas e caminhar pelas imitações dos principais pontos turísticos do mundo. Pois, a essência do lugar estará perdida. O turismo em massa pode não apenas ser o responsável pela extinção de animais, mas, também, extinção de culturas.
Como, então, praticar um turismo consciente?
De acordo com o Jornal de Turismo Sustentável o consumo turístico só irá começar a se balancear quando autoridades e a comunidade local se juntarem para delimitar estratégias de preservação cultural e ambiental frente ao consumo desenfreado. O que, por exemplo, já ocorre em algumas regiões da Ásia em que praias e ilhas inteiras são fechadas ao turismo para que o ecossistema se recupere.
Agora existe o importante papel do turista que está consciente da marca que está deixando naquela sociedade.
E o seu papel é pesquisar, e pesquisar muito sobre cada serviço contratado, revendo o seu próprio comportamento e optando por:
- Empresas familiares.
- Restaurantes em que os locais comem.
- Evitar o consumo excessivo de plásticos (como garrafas d’água), pois muitos países não possuem coleta seletiva e o aumento de lixo é um problema notório.
- Mantendo seu consumo baixo de água e luz. O alto consumo acaba aumentando os custos para os moradores locais.
- Respeitando as referências culturais, não julgue ou sobreponha a sua cultura.
- Comprando com produtores locais, aqueles que você sabe que produziram aquela peça.
- Fazendo trabalhos de caridade.
- Perguntando antes de tirar fotos, para algumas culturas, tirar fotos de suas deidades é extremamente ofensivo.
- Não sujar as ruas.
Em resumo, o nosso papel enquanto turistas conscientes é minimizar os impactos sociais, econômicos e ambientais que causamos, gerando melhorias na economia local e sendo culturalmente sensível à necessidade e diferença do outro. Procurando conexões significativas com o lugar, tendo em mente que você não é um cliente, e sim alguém que teve o privilégio de conhecer uma cultura diferente.