Prometi no ano passado que dedicaria um artigo a floresta do suicídio no Japão, um dos locais mais nebulosos e misteriosos que tive a oportunidade de conhecer. Quem acompanha a coluna sabe que acabei afastada por alguns meses, mas estou retomando as atividades e as publicações mensais!
Para quem não conhece, Aokigahara é uma floresta aos pés do Monte Fuji, famosa pelos frequentes casos de suicídio, um problema que o governo da província de Yamanashi vem enfrentando há décadas. Vale lembrar também que a floresta inspirou o filme de terror Floresta Maldita, de 2016, dirigido por Jason Zada e que deixou o local com fama internacional.
Ano passado, fiz uma reportagem sobre fantasmas para a Revista Alternativa e, no embalo da pauta, acabei visitando dois locais assustadores: um túnel abandonado em Hamamatsu e a floresta Aokigahara. Pareço corajosa, mas na verdade sou apenas curiosa e essas visitas são seguidas de pesadelos, sal grosso e muita folha de arruda, então aconselho a pensar bem antes de embarcar em uma aventura dessas.
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Eu moro em uma das províncias que dividem o Monte Fuji (Shizuoka), mas nem por isto estou perto da floresta, que fica na outra ponta. A visita aconteceu no dia em que programei escalar o Fuji com um amigo e ele topou o desafio de passar uma hora em Aokigahara antes de partir para a 5° estação, de onde começa a escalada de oito horas.
Pegamos um ônibus da Estação de Kawaguchi-ko (em Yamanashi, a outra província que divide o Monte Fuji) e chegamos em frente a uma das entradas da floresta 40 minutos depois. A entrada era discreta e a princípio parecia uma floresta comum, com trilhas de caminhada para turistas.
Eu considero a experiência da floresta muito individual, pois tudo vai depender do quão sensível é a pessoa que está entrando lá. Na hora que botei os pés na trilha eu senti um peso nos ombros, como se tivesse carregando algo pesado nas costas, cheguei a ficar sem fôlego e muito assustada. Meu amigo, por outro lado, ficou tranquilo e não sentiu nada o tempo todo.
A floresta é aberta, com tanto espaço entre as árvores que é possível enxergar longe sem sair da trilha. Tem muitos buracos, árvores de tronco fino e muitas delas estão caídas, o que deixa mesmo com um clima assustador.
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Mas o mais forte para mim foi a energia que tinha lá dentro, era pesada, sufocante. A sensação era de que o ambiente absorveu todo o sofrimento das centenas de pessoas que pisaram lá para tirar a própria vida. E, além disso, há o acréscimo do silêncio mórbido. Não tem vento lá dentro, nem pássaros.
Aokihagara é uma floresta enorme, de 38 km², localizada ao lado noroeste do Monte Fuji. Para quem visita, a recomendação é não sair das trilhas, pois é fácil se perder lá dentro e há pontos em que não pega sinal de celular.
Outra questão é a possibilidade de encontrar um corpo lá dentro. Muitos suicidas se enforcam na floresta e escolhem locais afastados para cometer o ato. Quem sai da trilha pode acabar vendo algo que não está preparado para ver. Mas Ana, por que tanto suicídio nessa floresta?
Gostaria de ter essa resposta, mas não tenho. O suicídio na floresta é algo quase lendário. Até 2003, o número de mortes em Aokigahara era na média de 100 por ano. A prefeitura e a polícia local uniram esforços para tentar reduzir as estatísticas, com a instalação de placas que tentam desmotivar o ato e patrulhas para abordar possíveis suicidas.
Mesmo assim, a floresta continua servindo de palco para quem quer tirar a própria vida. Em 2010, foram 247 tentativas de suicídio na região, sendo que 54 de fato conseguiram. Pelo menos uma vez por ano, a polícia faz uma inspeção atrás de corpos. Não é assustador?
É a prefeitura de Yamanashi quem mais paga o pato por causa da floresta. De acordo com uma reportagem do jornal Sankei em 2017, 182 pessoas cometeram suícidio na província, sendo que 51 pessoas moravam em outras regiões do Japão.
A floresta também colocou a província no topo do ranking the suicídios ocorridos no Japão em 2018. Segundo os dados da Agência Nacional de Polícia (NPA), foram 20.598 mortes no ano passado e Yamanashi foi o local onde houveram mais casos.
Mudar a fama da floresta ainda é um grande desafio e, enquanto o governo não descobre um meio, as atividades de prevenção e alerta são fortalecidas a cada ano, na esperança de convencer as pessoas que decidiram tirar a própria vida de que há outra solução e de que não existe problema que não possa ser resolvido.
E você, teria coragem de fazer uma caminhada nesta floresta?
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Parabéns pelo trabalho.