Desde que fui pro Canadá pela primeira vez, em 2013, minha vida se tornou um ir e vir constante. Diferente de outras brasileiras pelo mundo, não me mudei de uma vez e pra sempre. Morei lá por 7 meses, iniciei um namoro à distância e desde então ando pra lá e pra cá.
Fora visitas rápidas, já morei mais duas vezes no Canadá e uma na Áustria. Tenho um monte de amigas que me chamam de “chique” – acham a minha vida gourmetizada – e dizem que dariam tudo pra ter a vida que eu levo (vida boa, imagino). Vou logo adiantando – não é nenhum mar de rosas e exige um montante de coragem e bravura que nem eu mesma sabia existir em mim.
A primeira mudança assustou. Fui fazer um doutorado sanduíche em Vancouver. Morri de medo do desconhecido. Falar uma língua que não é a minha, ter aulas e fazer trabalhos em outra língua (no primeiro dia de uma das aulas que eu assisti, comecei anotando tudo em português, até perceber a loucura que seria traduzir e por no caderno – sim, eu uso caderno e caneta e escrevo à mão).
Imigração! Aplicar pra visto! Visto demorar mais de dois meses pra ficar pronto… Deixar todo mundo pra trás pra ir em busca de um up na carreira acadêmica.
O que ninguém me contou é como é difícil fazer amizades em Vancouver! É a primeira reclamação dos brasileiros que desembarcam por aqui (além da chuva, é claro). Ainda mais no meio acadêmico.
Todo mundo jura que vai sair pra um café, vamos marcar e nada. O jeito foi apelar para os brasileiros, latinos ou mediterrâneos. Eu mesma achava que esse negócio de América Latina ser sangue quente (o que quer dizer povo acolhedor) era um pouco demais. Mas não é mesmo! Morro de saudades de abraçar e ser abraçada! (outra crônica: a primeira noite que passei em Vancouver foi um Reveillon, numa casa de um casal canadense. Já cheguei abraçando todo mundo! “Feliz Ano Novo!” Até ser alertada pela cara de pânico e corpos paralizados dos meus abraçantes que isso não é prática comum por aqui).
Da primeira estadia no Canadá a coisa boa é que o verão uma hora chega (mas são apenas dois meses com sol) e uma hora a sua rede de amigos vai aumentando. Mas aí voltei para o Brasil para terminar o doutorado.
E depois já morei em Viena pra um estágio sensacional na minha área de pesquisa (anti-corrupção) – mas lá o buraco foi mais embaixo… Eles falam alemão! Nem as 15 aulas supersônicas antes da viagem me salvaram do medo do supermercado.
Hoje só me lembro que kartofel é batata e apfel é maçã. Por lá, o clima hostil com quem vai trabalhar era bem mais claro e para vocês terem uma ideia, não consegui me matricular numa piscina pública (adoro nadar).
Assim como também não conseguia comprar passagens pra andar de trem/ônibus, ou tirar dúvidas de imigração. As pessoas simplesmente odeiam falar inglês a não ser que seja questão de vida ou morte (ao menos essa foi a impressão que me impregnou).
Ano passado, de volta a Vancouver, começou a busca por oportunidades de trabalho no mercado canadense, o que também não foi nada agradável. Fiz um curso de Gestão de Projetos fantástico, e aprendi que aqui (como no mundo inteiro) o que conta são as relações pessoais.
Tem que fazer uma tal de “informational interview” com a pessoa que trabalha na sua área e a partir daí estabelecer o contato. Aprendi a deixar a vergonha de lado e a jogar pelas regras do jogo de cada lugar. Não é fácil.
A impressão é a de que quem vem de fora está sempre um passo atrás e tem que ralar muuuito mais. Eu tenho uma verdadeira antipatia desse discurso corrente de que imigrante quer “roubar” trabalho ou quer vida boa. Imigrante, meus amigos, todos os que conheço, querem um trabalho decente e uma vida melhor. E pra isso estão dispostos a trabalhar até cansar. Trabalhar fora é estar disposto a dar um, ou vários, passos atrás na carreira em busca de achar um cantinho e uma oportunidade em outro lugar do mundo.
Enfim, entre tantas idas e vidas o que mais gosto é a capacidade que adquiri de me abrir para o novo, mesmo que assustadamente na maioria das vezes. A capacidade de me admirar com estórias e pessoas as mais diversas, me abrir para as diferenças e novas formas de ver e sentir o mundo. Aprender sobre o que nos separa enquanto povos e as semelhanças que nos agregam enquanto humanos que partilham o mesmo planeta.
Continuo a caminhada e adoraria compartilhá-la com vocês.
4 Comments
Oi, Ana! Adorei o seu texto e como você “desglamuriza” a vida no exterior, que muitos pensam ser um mar de rosas.
Sou mineira (não de BH), mas moro aqui há alguns anos já, também sou da área acadêmica (Relações Internacionais e Ciências Sociais) e desenvolvo pesquisas sobre migração internacional, inclusive já fiz uma sobre imigração no Canadá. Gostaria de conversar mais com você sobre esse assunto. Se for possível, me mande um e-mail com o seu contato.
Um abraço e sucesso!
Isabela
Olá Isabela! Vou te enviar um email para mantermos contato!
Oi Ana, que escola você vez o curso de gestão de projetos?
Olá Denise, fiz o curso na University of British Columbia e adorei. É um pouco caro, mas é uma das melhores universidades do Canadá. Eles tem o curso no formato intensivo (3 meses, de segunda a sexta), part-time e online.