Infelizmente algumas mulheres no mundo ainda não podem comemorar o dia 8 de março. E outras já não poderão devido a terem sido vítimas de violência doméstica em Portugal.
O dia 25 de Novembro é marcado como o dia Internacional pela Eliminação da violência contra as mulheres. Em novembro passado, as Nações Unidas promoveram uma campanha pelo fim da violência contra as mulheres mas, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, uma em cada três mulheres ainda é vítima de abusos físicos no mundo.
Infelizmente os direitos das pessoas ainda é muito marcado pelo gênero. Homens e mulheres ainda têm direitos muito diferentes em cada país deste nosso planeta terra. Basta ler os textos sobre a Arábia Saudita que a Carla escreve. E embora a legislação de alguns países seja mais favorável à igualdade de direitos entre homens e mulheres, nem sempre a legislação resolve os problemas do dia-a-dia das pessoas. A Fernanda também já escreveu aqui sobre os direitos das mulheres.
Por exemplo, o direito ao voto feminino no Brasil completou 82 anos de existência. Foi a partir de 1932 que as mulheres brasileiras passaram a ter o direito de eleger os seus representantes. Em Portugal, embora em 1911 uma mulher tenha exercido este direito porque a legislação dizia “cidadãos portugueses com mais de 21 anos”, após esse acontecimento a legislação foi alterada e a nova redação da lei passou a dar o direito ao voto para “cidadãos portugueses do sexo masculino, maiores de 21 anos” limitando o direito aos homens. O direito de voto pelas mulheres em Portugal foi gradativamente autorizado e só a partir de dezembro de 1968 que deixou de existir qualquer discriminação em função do sexo para o exercício deste direito.
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Portugal viveu sob uma ditadura entre os anos 1933 e 1974. Durante esses anos, os direitos das mulheres eram muito restritos. Para citar apenas alguns, nessa época as mulheres tinham o dever do serviço doméstico, poucas tinham autorização para trabalhar fora de casa e quando o marido autorizava (isso mesmo, o marido tinha que autorizar), elas ganhavam menos 40% que os homens.
As mulheres só podiam exercer algumas profissões. Não podiam ser magistradas, diplomatas, militares. Podiam ser enfermeiras ou comissárias de bordo mas, nessas profissões, não tinham o direito ao casamento. No casamento, era o marido que detinha todo o poder. Os maridos tinham o direito de abrir a correspondência de suas mulheres e até 1969, a mulher não podia viajar para o estrangeiro sem a autorização do marido.
A situação só começou a melhorar a partir da Revolução dos Cravos em 1974 e da Constituição de 1976 que consagrou o direito de igualdade entre mulheres e homens em todos os domínios da vida.
Acontece que a existência de uma lei não muda a ideia das pessoas da noite para o dia. As nossas ideias e conceitos sobre os mais diversos temas são construídos entre nós. Um dos problemas que ainda existe hoje em dia e que, infelizmente, a legislação por si só não consegue resolver é o problema da violência doméstica e da violência contra a mulher. Muitas mulheres ainda sofrem porque alguns homens ainda pensam que elas são suas propriedades.
A violência doméstica e a violência contra a mulher ainda são um problema em Portugal e que tem se mantido. De 2004 a 2013 morreram 356 mulheres vítimas de violência doméstica no país, sendo a maioria dos crimes cometidos pelos seus maridos/companheiros. Só nos últimos 5 anos, de 2010 a 2014, 191 mulheres perderam a vida assim. Só em 2014 foram mortas 42 mulheres.
Crimes cometidos por maridos, companheiros, namorados, ex-maridos… Alguém que um dia já amou, alguém em que as mulheres já confiaram, alguém com quem pensaram que seriam “felizes para sempre”…
Em Portugal, a violência doméstica “caracteriza-se por comportamentos violentos e pelo abuso de poder de uma pessoa sobre a outra com o objetivo de a controlar. Ocorre entre pessoas que têm ou tiveram uma relação de intimidade, familiar ou de dependência”. Inclui-se no conceito não só a violência contra a mulher, mas também ao homem, às crianças e idosos. No primeiro semestre de 2013 foram registradas 13.071 ocorrências de violência doméstica no país. Esse número aumentou mais de 2,3% nos primeiros seis meses de 2014. E em Portugal, as mulheres mais idosas são particularmente mais vulneráveis a esse tipo de agressão.
Com que direito uma pessoa tira a vida de outra? Com que direito? Qualquer que seja ela, ele, ou qualquer pessoa, adulto ou criança, jovem ou velho, homem ou mulher, ninguém tem o direito de tirar a vida de outra pessoa, por nenhum motivo. Esses crimes não só tiram a vida de mulheres mas “estragam” a vida de muitos: do homem que mata, dos filhos que ficarão com essa marca do próprio pai que mata a mãe… Quantos órfãos vão ter que existir para que as pessoas deixem de pensar nelas próprias?
Mas o país tem encarado o problema de frente e muitas campanhas têm sido feitas pelo governo através da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Gênero (CIG). No último dia 12 de fevereiro foi lançada a campanha pela Secretaria de Estado da Juventude com o tema “Quem te ama não te agride”. E também existem vários locais onde as vítimas podem procurar ajuda tais como a Associação de Apoio à Vítima, a Associação de Mulheres contra a Violência e a própria CIG que disponibiliza um número gratuito para as denúncias, entre outras.
Mas como eu já disse, nós construímos as nossas ideias e conceitos e aprendemos todos os dias. Nós também devemos fazer a nossa parte pela não violência, nas nossas pequenas ações no nosso dia-a-dia, quando ensinamos a igualdade de direitos para as nossas crianças, quando ensinamos valores humanos, quando não reproduzimos a violência, etc.
Ah! querem saber da Maria? … Foi morta 6 horas depois… a primeira mulher vítima fatal de violência doméstica de 2015.
2 Comments
Oi Lyria, tudo bom? Achei relevantíssimo o seu texto e concordo que isso tudo é uma herança cultural, algo que as pessoas carregam de gerações para gerações.
Acho também que o número de incidências não aumentou; o que aumentou foi o número de registros das mesmas. E isso se dá porque as pessoas estão tomando maior consciência de que a violência não é algo normal!
Um beijo
Oi Tati!
Muito obrigada pelo comentário!
Talvez as denúncias tenham aumentado ou seja, as pessoas já tenham mais coragem de denunciar. Talvez não… ainda não sabemos…
Pelo menos há campanhas e já não é “normal”.
Bjim