Você sabia que na Holanda tem terremoto?
Quando pensamos em terremoto que países normalmente vem na nossa cabeça? Japão, México, Indonésia, Chile (sim, no Chile também tem muitos terremotos, mas eles estão tão acostumados que nem se abalam muito). Agora, alguma vez passou pela sua cabeça, ou alguma vez você ouviu dizer que na Holanda também tem terremotos? E se eu te falasse que além disso, na verdade os terremotos aqui foram consequência de ações humanas? Talvez sua cabeça te leve às aulas de geografia em que você ouviu falar “ah os terremotos são causados pelo movimento das placas tectônicas…” (que claramente não são causas humanas), mas caso você tenha pensado “qual a chance de eu lembrar disso?” também não tem problema. Vou explicar então como um terremoto pode ter uma causa humana então e não natural.
Lembra quando eu comentei de Groningen, uma cidade em uma terra muito muito distante no norte da Holanda (lembrando que 3 horas em um trem aqui é considerado viagem)? Se você não lembra dá uma olhada aqui! Primeiro, não pense que sou louca falando “ahhh vai lá de boas visitar Groningen, o lugar que tem terremotos”. Não sou tão louca assim. Os terremotos ocorrem na província de Groningen e não especificamente na cidade de Groningen (que é a capital da província. Igual o estado de São Paulo que tem como capital a cidade de São Paulo). Os terremotos ocorrem mais na área rural onde o número de pessoas morando é relativamente menor. Porém, isso não significa que seja algo bom, né? Causa transtorno e ninguém fica feliz com pedaços da casa caindo por aí. E o que causa esses terremotos? A extração de gás natural. “Calma, além de terremotos a Holanda também tem gás natural?” Tem. E muito.
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A quantidade de gás natural presente em Groningen é APENAS a maior da Europa. E a décima, sim décima, do mundo! Se significar alguma coisa, a quantidade de gás encontrada em 1959 é de 2.8 trilhões de metros cúbicos. Se não significar muito te digo que dá pra cozinhar, aquecer casas e muito mais com tudo isso. As extrações desse gás começaram em 1963 e são lideradas pela NAM (Nederlandse Aardolie Maatschappij – que em português seria Companhia de Petróleo Holandesa, acho levemente mais fácil) que é uma Joint Venture entre a Royal Dutch Shell e a ExxonMobil. Mas assim, primeiramente essa companhia deu um “migué” e não contou a história toda para a população, afinal era uma quantidade enorme de gás e isso poderia trazer muitas implicações. Eis que jornais descobriram e publicaram a notícia o que fez a empresa admitir que a quantidade de gás encontrada era “open bar”.
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O gás que vem desse reservatório tem em média 82% de metano e muitas instalações foram adaptadas para esse padrão de gás. E qual a diferença? A diferença é que caso chegue gás de outro lugar com um poder calorífico maior (maior quantidade de metano), devem ser tomadas medidas necessárias para adaptar o gás para o padrão de Groningen para que assim esse gás possa ser usado nas instalações de lá. Coisa simples. O plano inicial envolveu a troca dos sistemas de aquecimento que antes eram a óleo ou carvão para gás natural para que a maior parte do gás tivesse uso doméstico quando antes o uso era principalmente para cozinha e aquecimento de água.
Agora voltando aos terremotos, a extração de todo esse gás começou esse processo e o grande problema é que as construções aqui na Holanda são muito antigas e facilmente abaladas como por exemplo monumentos históricos, igrejas e moradias. Além disso, existe uma grande preocupação em relação às estruturas dos diques que são parte essencial para a proteção do país e também ao parque químico presente na área que, com os terremotos, causa alteração do nível e poluição das águas com a ruptura de tubulações e drenos, por exemplo. Em relação às moradias, um grande problema é que muitas pessoas não querem deixar a região, mesmo com o perigo, porque tem um apego com a casa por questões familiares e históricas. Isso faz com que muita gente arrume “jeitinhos” para manter a estrutura da casa em pé, como por exemplo, colocando pedaços de metal ligando o piso ao teto. E o medo de ceder?
O primeiro registro oficial de um terremoto foi em 1986, mas existem outros relatos de pessoas que sentiram os terremotos anos antes e, segundo o instituto de meteorologia holandesa, eles ocorrem normalmente durante a noite. O grande problema é que esses terremotos ocorrem logo abaixo da superfície da terra e, mesmo sendo de baixo nível na Escala Richter, eles acabam sendo mais poderosos por estarem próximos ao solo, diferente de terremotos naturais que normalmente ocorrem a uma profundidade de 20 a 100km. Ou seja, muitos especialistas dizem que a Escala Richter não é um bom indicativo para essa região.
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Até hoje, foram registrados 1496 terremotos e 90791 “boletins de danos” vamos dizer assim. Além de problemas estruturais, os terremotos causaram muitos outros problemas tais como: desconfiança no governo já que a maioria do lucro vindo do gás natural foi usado fora da região de Groningen, muitas casas já não podem ser vendidas, danos psicológicos aos moradores, pobreza e desemprego, entre outros. Isso tudo fez muitas pessoas saírem às ruas para pedir o fim da extração do gás natural nessa região. Acredita que até o MIT entrou nessa história para avaliar os terremotos? É, não é pouca coisa não!
E agora? As manifestações deram em algo? O que aconteceu? Então, mudanças só passaram a acontecer quando ocorreu o primeiro terremoto perto da cidade de Groningen, causando grande preocupação já que é a cidade mais populosa do norte da Holanda. Hoje em dia existe uma organização chamada GBB (Groninger Bodem Beweging – Movimento do solo de Groningen, ou algo assim) que defende os interesses das pessoas atingidas por esses problemas e, em abril de 2017, a corte holandesa decretou que uma investigação criminal contra a NAM começasse. E sabe do melhor? No dia 29/03/2018 (notícia fresquinha), o governo anunciou que a extração de gás em Groningen será terminada por questões de saúde e bem-estar da população. Aleluia! Notícia boa, porém ainda vai demorar para que as extrações cheguem a zero. A companhia tem até 2022 para reduzir a quantidade extraída e gradualmente chegará a zero. Agora nos resta torcer para que isso ocorra o mais rápido possível. Renováveis, ajudem a gente!
Bedankt em tot ziens!