A Convenção de Istambul e sua repercussão na Croácia.
A Convenção de Istambul foi estabelecida em 2011 e ganhou forças em 2014. Visando prevenir e combater a violência doméstica contra as mulheres e proteger vítimas de qualquer tipo de agressão (seja ela física, moral, econômica ou psicológica), a Convenção foi originalmente assinada por 45 países dentre os 47 participantes do Conselho Europeu, e 29 até então já a ratificaram, como alguns países ex-integrantes da Iugoslávia (Sérvia e Montenegro).
Desde janeiro de 2018, 46 países, incluindo a Croácia, assinaram o Tratado, e o que se tem notado é uma grande repercussão entre os habitantes croatas, principalmente os mais conservadores. E o que alegam pode parecer contraditório, já que a ideia da Convenção visa exatamente buscar alternativas de combate à opressão e agressão vividas todos os dias por milhares de mulheres no país.
Aqui na Croácia, a atual controvérsia acerca da ratificação da Convenção chama atenção no que diz respeito a dogmas religiosos confrontados com as iniciativas políticas, uma vez que a Croácia é um país onde se vê claramente enraizado os valores seguidos pela tradição católica.
E o que diz esse tratado estabelecido em Istambul, na Turquia?
A Convenção de Istambul adota a política dos 3 P: prevenção contra quaisquer formas de violência feminina, proteção contra quaisquer formas de violência feminina e processo contra os acusados de violência contra as mulheres. Além disso, a Convenção também visa promover igualdade entre os gêneros, através de políticas que de fato ajudem as mulheres a lutar por seu espaço de maneira igual e justa.
As ofensas criminais específicas que podem ser identificadas são: violência física (tapas, espancamento, puxões de cabelo etc), violência psicológica (palavras de insulto, xingamentos, pressão psicológica visando desmoralizar e menosprezar a mulher), perseguição (stalking, censura a redes sociais, vigiar as atividades diárias através de câmeras e telefone), violência sexual (estupro, sexo sem consentimento e abusivo), casamento forçado, mutilação genital feminina, aborto forçado e abuso sexual (assédio no trabalho, nas ruas, na faculdade), dentre outros exemplos pelos quais, infelizmente, muitas mulheres passam diariamente sem às vezes se darem conta dos seus direitos.
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Apesar de o Tratado reconhecer que as questões relativas à igualdade de gênero seja um dos fatores ligados ao aumento da violência contra a mulher e a violência doméstica, existe uma parte da Convenção que visa mostrar que os homens também possam vir a ser vítimas de violência (gays e transsexuais incluídos nessa lista).
O que se tem percebido aqui no país é um aparente acordo entre os dois partidos políticos (SDP e HDZ) em prol de solucionar a questão sem ferir ou desagradar a Igreja e seus conservadores. Recentemente, em fevereiro deste ano, 12 ONGs ligadas ao movimento feminista, LGBT e Direitos Humanos organizaram um protesto na capital croata, debaixo de muita neve e frio. Milhares de participantes se uniram aos ativistas e marcharam pelas ruas de Zagreb, saindo da Praça das Flores em direção à principal praça croata, a Ban Jelacic.
Em contrapartida, em março desse ano, houve um grande protesto em Zagreb, capital croata, organizado por grupos ligados a Igreja Católica, que se mostraram preocupados com a definição de gênero como papel social, temendo, assim, que os valores familiares tradicionais sejam colocados em questão.
Ou seja, ao mesmo tempo que defende a proteção das mulheres, os que protestam se
opõem veementemente ao Tratado no que diz respeito às classificações de transgênero ou transexual como categorias separadas. O governo croata vem fazendo apelo ao Parlamento na tentativa de ratificar a Convenção, ao mesmo tempo em que atesta que as definições legais previamente estabelecidas de casamento sendo a união entre homem e mulher não serão mudadas.
De acordo com uma pesquisa recém realizada entre os moradores, 2/3 da população apoiam a ratificação do Tratado de Istambul. Muitos afirmam que o Primeiro-Ministro Andrej Plenkovic seja um “traidor”, outros comparam a países como Bélgica e Canadá, onde uma família pode ser constituída por 2 pais ou 2 mães.
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Durante os protestos pelas ruas de Zagreb, a polícia precisou intervir e conter os nervos da população.
Além do tema de classificação de gêneros, a Igreja Católica e os conservadores locais afirmam que as mudanças nas leis sobre o aborto também iriam contra o que a sociedade croata tem como estabelecida. Sendo assim, as mulheres deveriam pesar melhor suas decisões sobre o que fazer com o próprio corpo, já que o aborto é crime perante as leis católicas determinadas pelo Vaticano.
Os dois principais partidos croatas [SDP e HDZ] continuam divergindo sobre a Convenção, assinada pelo então Primeiro-Ministro da época, Zoran Milanovic, pertencente ao SDP.
O que se espera, de fato, é que as organizações internacionais, juntamente com o governo croata, sejam capaz de se esforçar no sentido de criar, de maneira significativa e eficaz, meios que possam fazer com que esse tipo de preocupação com um tema tão vigente como a violência doméstica passe a ser discutido e reavaliado pela sociedade.