A estabilização profissional na Áustria.
Independente de qual sejam os motivos que te trouxeram à charmosa terra de Mozart e de quais sejam os motivos que a fizeram decidir ficar e (re)começar uma vida aqui, você em algum momento se deparou – ou vai se deparar – com a questão da estabilização profissional. Com exceção dos casos em que o motivo para tal mudança foi o trabalho, ou seja, a empresa na qual você trabalha estabelece um contrato numa filial da Áustria, por exemplo, e você já chega aqui com o seu emprego garantido. Nesses casos, a preocupação será “apenas” adaptar-se ao país: à cultura local, ao novo ambiente de trabalho, aos novos colegas, à busca por vagas em escolas e jardim de infância (caso você tenha filhos) e etc. Sem mencionar a adaptação à saudade e à distância da família. Bom, as mudanças são tantas que eu poderia fazer uma lista com diversos exemplos que poderiam ilustrar a batalha diária de quem está aqui, mas isso fica para um próximo texto porque neste eu gostaria de focar em apenas um desafio: a estabilização profissional.
Quem chega aqui sem um emprego garantido e com o objetivo de conquistá-lo deve se preparar para enfrentar uma série de barreiras e obstáculos. O aprendizado de uma nova língua (do zero até o nível fluente) é apenas a primeira de muitas barreiras que a gente tem que enfrentar. “Ah, mas se você sabe inglês você consegue trabalhar em qualquer lugar!” Não. Isso não vale para a Áustria! Pelo menos não na minha área de trabalho (Psicologia). Ser um candidato com nível de alemão básico ou intermediário tem o mesmo peso de ser um candidato invisível. Ou você fala muito bem a língua alemã ou você nem entra no jogo.
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A pressão é forte e diária. As referências que você se orgulha de trazer no seu currículo podem se tornar anônimas pelo simples fato de ninguém, aqui, conhecer aquela empresa famosa que você trabalhava na Av. Paulista; ou aquela pós que você fez naquela instituição renomada; ou aquela clínica bacana super bem conceituada em sua cidade. Aqui vai virar apenas um nome estranho no seu currículo e, muito provavelmente, as pessoas não vão conseguir nem pronunciá-lo. O que deixa tudo muito mais difícil porque são as nossas experiências em empregos anteriores que mais contam na hora de conseguir um novo emprego, não é mesmo? E por mais que você traga no seu currículo aquela agência famosa que todo mundo conhece em São Paulo, você vai competir com candidatos que trazem referências locais – de empresas conhecidas por outras empresas aqui – o que aumenta a confiança e a credibilidade da referência.
Além disso, os austríacos são, de um modo geral, muito cautelosos com pessoas novas. Isso significa que ao buscar um candidato para uma vaga, na maioria das vezes, eles dão preferência por pessoas indicadas ou mesmo por pessoas de confiança que já estão dentro de seu círculo social (lógico que há exceções!) Já ouvi muitos relatos de austríacos que reconhecem essa dinâmica e confessam que o círculo social ajuda bastante na hora de conquistar aquela vaga de emprego. O anúncio online será basicamente a última tentativa de busca pelo candidato. Esse é o famoso “QI” (Quem Indica) que também acontece no Brasil, mas me surpreendeu como é forte e super comum aqui em Viena. Não preciso nem dizer que para os estrangeiros o acesso a essas vagas torna-se bastante limitado.
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Continuar a carreira em outro país significa, muitas vezes, começar do zero. Significa construir novas referências. Significa competir com os locais e essa competição entre estrangeiro x local é, quase sempre, injusta. Continuar a vida profissional em outro país significa ser flexível e aceitar que nem tudo vai sair como você planejou. Significa abrir a porta da sua casa para deixar a paciência entrar e se hospedar por alguns meses ou anos. E toda aquela euforia e ansiedade antes de uma entrevista de emprego são potencializadas pela preocupação em conjugar aquele verbo da maneira correta durante a entrevista ou conseguir lembrar daquela palavra complicada que você nunca tem que usar no seu dia a dia. Sem mencionar o fato de que você irá vivenciar, paralelamente a tudo isso, todas as outras dificuldades de uma vida como estrangeiro num país novo. E só nós, que decidimos continuar tudo em outro país, sabemos o que significa isso.
O que eu aprendi (e ainda estou aprendendo) é que não conseguimos passar por tudo isso sem andar de mãos dadas com a humildade, com a flexibilidade e com a paciência. Essas grandes companheiras nos ensinam a orgulharmos de nós mesmos, independente do cargo que ocupamos numa empresa. Nós nos orgulhamos de nós mesmos porque reconhecemos o esforço diário (e o enorme prazer) que é viver totalmente fora da nossa zona de conforto.
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A humildade está ao seu lado quando você arregaça as suas mangas, ou seja, quando você esforça-se para ir atrás dos seus sonhos e do que faz sentido para você, independente de qual salário você ganha. A flexibilidade e a paciência nos ensinam a respeitar os imprevistos da vida no exterior sem deixar que estes nos desanimem; nos ensinam que tudo tem seu tempo certo para acontecer e que não adianta apressar-se nem cobrar demais de si mesmo.
As frustrações vão aparecer e elas são inevitáveis. O que vai fazer a diferença é a forma como lidamos com elas. E, convenhamos, será que podemos, mesmo, sentir o verdadeiro sabor de uma vitória sem antes provar o gosto amargo de algumas frustrações? Assistir a nossa própria jornada e nossas evoluções é uma das coisas mais gratificantes que existe. Aproveite a sua jornada, onde quer que você esteja, e saiba comemorar as suas pequenas evoluções como grandes vitórias!