Na Inglaterra, as mulheres estão presentes em todos os aspectos da vida em sociedade. Elas estão nas profissões mais simples e nas mais sofisticadas; estão nas famílias e nos círculos sociais; nas escolas, universidades e lares – e também nos cargos mais altos da política e da monarquia. No entanto, para falar sobre o papel da mulher na Inglaterra, é necessário levar em consideração as suas representantes de todas as classes, todas as raças, todos os credos.
Infelizmente, não é possível adentrar em cada uma destas categorias a fundo, mas alguns números, podem nos ajudar a compreender melhor o cenário nacional. As mulheres representam, hoje, a maioria da população Inglesa – apesar da porcentagem bastante semelhante com a de homens -, sendo que entre as novas conquistas das mesmas, estão o número recorde de parlamentares eleitas na história (32%) e o fato de que a vasta maioria das universidades Britânicas, inclusive Inglesas, possuem mais estudantes mulheres do que homens (abrindo uma diferença tão grande, que se começou a discutir se os meninos chegarão a precisar de mais estímulo na escola, para melhorarem suas chances de ingressar em uma universidade quando jovens adultos).
Mas, indo além dos números, falar sobre a mulher nesta sociedade sempre foi algo que eu tive vontade de fazer e, visto que estamos em março – mês da mulher – me pareceu pertinente, finalmente, abordar o tema.
Quando digo “finalmente” é porque acredito que este é um assunto que merece muito estudo, observação e reflexão para ser abordado, já que, se não seguirmos estes passos, corremos o risco de perpetuar preconceitos e generalizações (inevitáveis, mas muitas vezes com consequências extremamente negativas).
Primeiras impressões
Pois bem, ao mesmo tempo, é impossível dizer que não tenho uma ideia espontânea de quem são e que papel têm as mulheres nesta sociedade. De maneira geral, devo admitir que, sendo uma mulher brasileira e vindo de uma família de cultura majoritariamente italiana, a primeira ideia que me vem em mente é de que, aqui, as mulheres usufruem de maior igualdade com os homens do que no Brasil, ou do que em outros países latinos.
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Quando vim para cá pela primeira vez, me lembro de algumas situações que me chamaram muita atenção: as meninas nas noitadas se comportavam tão extrovertidamente quanto os seus amigos homens; a quantidade de mulheres em cargos mais altos parecia ser muito maior do que em nosso país de origem; e a quantidade de casais onde a mulher parecia mais velha e menos vaidosa do que o homem, era a maioria (na minha percepção, o oposto do que se vê em países latinos).
Ou seja, resumidamente, tive a impressão de que, aqui, a sociedade é movida e transformada pelos seres humanos de sexo feminino, tanto ou mais, do que pelos do sexo masculino. E que o papel das mulheres vai muito além de sua aparência física.
Para aqueles aos quais a minha experiência de vida e opinião não querem dizer nada, trago o pano de fundo: as mulheres na história da Inglaterra. Ou vocês não lembram que foram aqui que surgiram as heróicas suffragettes, que foram as primeiras manifestantes a favor do voto feminino? Outros exemplos de força motriz feminina não faltam, como é o caso da fundadora da enfermagem moderna – Florence Nightingale – e da não tão popular, mas decisiva, Margaret Thatcher. Além disso, este país tem a monarca mais longeva da história, além de um histórico de possuir como monarcas mais bem-sucedidos aqueles de sexo feminino.
Ainda temos a avançar?
Tudo muito bem, tudo muito bom, até que comecei a acompanhar na televisão discussões sobre cotas para mulheres e licença para dias de TPM (tensão pré-menstrual), nas empresas locais. Eu, que tinha a impressão de que este país era igualitário, confesso que me perguntei se isso tudo era necessário e se o mesmo não perpetuava o preconceito contra nós mulheres…
Pois bem, foi com a experiência de vida que me dei conta de que, mesmo que eu discorde de cotas, nós mulheres ainda estamos longe de usufruir de igualdade com nossos irmãos homens, aqui na Inglaterra também. Mas antes de adentrar este assunto, é preciso primeiro definir o que eu entendo por igualdade e para mim, como pessoa, é bem simples: ela é quase o equivalente à igualdade de escolha. Escolha essa até para ir contra os interesses de outras mulheres, se isso for aquilo que a cidadã quer.
E assim, infelizmente, devo confessar que a impressão que tenho é que, ao se tornar mãe, as possibilidades da mulher são extremamente reduzidas neste país e fica muito difícil, para a classe trabalhadora e média, dizer que se tem alguma escolha em terminar ou pausar a carreira ao escolher a maternidade. Seria possível falar em emancipação feminina, se nos encontrássemos forçadas a depender de nossos parceiros, ou até de nosso governo?
A Inglaterra tem a distribuição de tarefas menos igualitária de todos os países desenvolvidos. Isso pode vir como um choque, porque aqui ninguém fica falando o quanto seu marido é maravilhoso por, simplesmente, cuidar do próprio filho, mas o dia a dia das famílias demonstra um problema complexo para as mulheres: com umas das educações infantis mais caras do mundo, podemos realmente dizer que deixar de trabalhar é mesmo uma escolha?
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Veja bem, nada contra as mulheres que escolhem pausar ou abandonar a profissão para cuidar exclusivamente da família – eu mesma mudei de profissão e de país com intuito semelhante – mas sobrecarregar financeiramente uma família, forçando pai ou mãe a sair do mercado de trabalho, não me parece muito evoluído, ou mesmo vantajoso, para nenhum dos envolvidos… voltamos para a questão da escolha.
Esperança para o futuro
Assim sendo, a atual tendência por aqui, é olhar para a maneira que organizamos as estruturas de trabalho e produtividade, com um número crescente de pessoas defendendo que mais flexibilidade, por parte das empresas, seria um dos passos mais importantes em termos de proporcionar mais oportunidades para as mulheres manterem seus trabalhos após a maternidade, para que os homens tenham um papel mais significativo na vida em família e para que, assim, as crianças tenham tanto o apoio de ambos os pais, quanto possam acreditar que vale a pena para ambos os sexos, investir em conhecimento e qualificação.
Enquanto isso, eu ficaria com a conclusão de que a mulher na sociedade inglesa teve e continua tendo um papel digno e importante, e acreditando que, apesar da necessidade de mudanças, o futuro há de ser próspero.
2 Comments
Interessante seu ponto de vista. Ainda nao sou mae, e concordo com todas as suas primeiras impressoes. Por conta da licenca maternidade partilhada entre pai e mae aqui, achei que o impacto nas carreiras dos pais nao fosse tanto, mas realmente, se as escolas sao caras, apos esse um ano ate eles poderem entrar na escola publica / normal sao anos de dinheiro e investimento.
Vejo muitas maes que trabalham 3 ou 2 vezes por semana, como forma de tentar balancar as duas coisas…
Apesar de tudo, acredito que a licenca compartilhada e um grande avanco, se comparado aos 3 ou 7 dias que um pai consegue pela lei brasileira.
Beijos!!`
Verdade, Kamila. Com 3 anos apenas que as crianças passam a ter acesso universal a 15 horas de pré-escola ou a 30 horas, se comprovarem que ambos, pai e mãe, não tem limitações de visto e ganham um mínimo mensal.
Agora pense que a maioria das pessoas na Inglaterra trabalham e ainda levam um bom tempo no trânsito para ir e voltar ao/do trabalho, ou seja, até as 30 horas semanais ainda não cobrem o tempo necessário para ambos trabalharem “full time”… E aqui tem muita qualidade de vida, mas essa qualidade custa bastante, né?
Para mim, que fiz a escolha de trabalhar com flexibilidade como autônoma, ótimo. Mas e a maioria das mães, que precisam de emprego? E as mães que precisam de emprego e recebem salário mínimo? Bem, acho que pode acabar alimentando a “cultura do benefício”, mas esse assunto é muito complexo para cobrir em comentário 😉
E eu também concordo que comparando com o Brasil, estamos mais à frente. Por outro lado, é como eu disse no texto, acredito que ainda temos um “gap” com os homens, que, porém, parece estar diminuindo com todas estas conquistas que mencionei e mencionastes. Aliás, eu não sei se no Brasil a lei também não mudou, mas acredito sim que a divisão da licença é apenas o começo… eu acredito muito é na flexibilidade do trabalho, mas esta provavelmente demorará um pouco para ser uma realidade para a maioria da população.
Um beijo para você também!