Altitude e corrida na Cidade do México.
Comecei a correr há uns 15 anos e não parei mais. Quando conheci as provas de corrida de rua, me apaixonei pelo desafio de superar o meu tempo e a minha resistência a cada competição, como acontece com muitos corredores que viram maratonistas. Com toda esta paixão, que também é minha terapia, não poderia deixar de escrever sobre minha experiência com a corrida na Cidade do México, onde escolhi correr a minha segunda maratona.
Precisamos falar sobre a altitude
A capital mexicana está a 2.250 metros do nível do mar e é a oitava capital mais alta do mundo (WorldAtlas.com). Para conhecer a lista das Top 15, clique aqui. As grandes altitudes recebem menor pressão atmosférica, por isso o oxigênio fica mais “espalhado” no ar, ou seja, há menor concentração dele no ar que respiramos. É o famoso ar mais “rarefeito”. E o que acontece no nosso corpo é mais ou menos assim: com menos oxigênio no pulmão, o organismo começa a produzir mais glóbulos vermelhos no sangue, que contém a hemoglobina, responsável por transportar o oxigênio do pulmão para os músculos e outros órgãos. É por isso que o treinamento de atletas em regiões altas é chamado de “doping natural”, pois, ao voltarem para níveis baixos em altitude, possuem mais glóbulos vermelhos no sangue e o transporte do oxigênio aos músculos é melhor.
Na prática, cada vez que chegamos em cidades altas, respiramos mais pesado e podemos ter dores de cabeça e até enjoos. O período de “aclimatação” a uma altitude entre 2.000 e 3.000 metros é em torno de duas semanas. Na corrida, nota-se a respiração mais ofegante, a frequência cardíaca e os tempos aumentam consideravelmente. O maior exemplo são os resultados das maratonas pelo mundo, comparados aos daqui. O recorde mundial é de duas horas e um minuto, em Berlim, prova mais rápida do mundo, por seu percurso plano e temperatura amena na época da prova. Na Cidade do México, o recorde é de duas horas e dez minutos, nove minutos a mais! Se os corredores profissionais fazem essa diferença toda, imaginem nós, os amadores! Quando vou de férias ao Brasil, corro mais rápido e com menos esforço, e logo que chego aqui me deparo com a dificuldade de novo. Depois o corpo se acostuma e melhora o conforto na corrida, mas o impacto existe a cada vez que chego.
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Poluição e ar seco
Outro cuidado que temos que tomar é durante o período mais seco do ano, que vai de janeiro a meados de maio. O nível altíssimo de poluição na cidade, somado à secura e à altitude, deixam o ar extremamente contaminado e o governo impede a prática de atividades físicas ao ar livre na maior parte do dia. O alerta é feito pela mídia e a qualidade do ar é checada de hora em hora, sendo constantemente divulgada ao longo do dia. As escolas cancelam as aulas de Educação Física e o recreio ao ar livre, e as crianças ficam dentro da sala de aula ou em ginásios. Na escola onde os meus filhos estudam, há uma bandeira vermelha que é hasteada nestes dias de alta contaminação do ar. Nos clubes e escolinhas de esportes, as atividades ao ar livre também são canceladas. Nesta época, a opção é correr bem cedo, quando o nível de qualidade do ar ainda não está tão alto; ou em esteiras.
Onde correr na CDMX
Até agora só falei de dados ruins sobre a prática da corrida na Cidade do México, não é? Mas agora começa a parte boa! A cidade é cheia de parques enormes, lindíssimos e com muita área verde por todas as partes. A Avenida Paseo de La Reforma, que é a mais importante da cidade, por ter diversos monumentos históricos e referências culturais, fecha aos domingos de manhã para a prática de esportes. A avenida, que é bastante arborizada e bem cuidada, se enche de ciclistas e corredores já desde bem cedinho. É lá onde acontecem a maioria das provas de corrida de rua, pois a avenida tem 15km de extensão e ao seu lado está o maior parque da cidade, o Bosque de Chapultepec – que é uma atração à parte e merece um post inteiro sobre ele. Aguardem! O parque é daqueles lugares onde podemos fazer uma corrida longa sem repetir qualquer parte do percurso, com direito a vistas lindas de lagos, jardins, monumentos e muitos esquilos pelo caminho. Difícil é não parar para fotografar esse lugar cheio de vida, que é o meu preferido para correr na cidade, onde relaxo ao redor de tanta natureza. O único cuidado que tomo é para não ir a trechos que estão mais vazios ou escuros. O parque é tão grande que não dá para contar com segurança em toda a sua extensão. Nunca vi nada acontecer, mas não custa prevenir.
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Grupos de corrida
Quem corre, sabe que é bom ter um grupo para trocar experiências, fazer amizades e encontrar parceiros para os treinos. Corro com um grupo de corredores mexicanos extremamente comprometidos e unidos. São meus companheiros de treinos, aprendizados, frustrações e diversão, claro, pois isso é o que não falta neste país. Imaginem um jantar de carboidratos pré-prova onde a gente come e depois dança salsa? Pois é! Sinto-me privilegiada em fazer parte do grupo. Recomendo para qualquer expatriada que goste de corrida, pois é uma experiência riquíssima para contato com o povo mexicano, além de ajudar na adaptação ao país.
Maratona Internacional da CDMX e outras corridas
Todos os anos, no final de agosto, acontece a Maratona Internacional da Cidade do México, que este ano reuniu 40 mil atletas profissionais e amadores para correrem os 42km. A prova é conhecida por ser uma das mais difíceis do mundo, porque, além da altitude, o percurso tem bastante subida. A corrida começa no Zócalo, praça onde está o Palácio Nacional e a Catedral Metropolitana, e os primeiros quilômetros são no bonito centro histórico da cidade. A Avenida Reforma e o Bosque de Chapultepec fazem parte do percurso e a chegada é no estádio olímpico, pois este ano a maratona foi comemorativa aos 50 anos das Olimpíadas de 1968, no México. A meia-maratona oficial da cidade acontece no final de julho e há, ainda, outras meias-maratonas em mais datas. Já as corridas mais curtas, de 5 a 15km, possuem um calendário recheado de provas ao longo do ano.
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Eu corri a maratona este ano e foi preciso resiliência para aguentar 10km de subida do final da prova! Eu já tinha corrido uma maratona em São Paulo e muitas meias-maratonas em diversas cidades, mas esta foi a primeira prova que me fez passar pela linha de chegada aos prantos. Chorei por ter vencido o meu sofrimento do percurso final e por todo o suporte recebido nos últimos quilômetros. Os mexicanos vão para as ruas com cartazes, gritos de incentivo, te chamam pelo nome – que está impresso junto ao número do peito – e te dão todo o tipo de comida e bebida para aquela energia extra no final: isotônicos, refrigerantes, pasta de amendoim, pasta de avelã, doces e até cerveja. As pessoas acordam cedo, preparam essas comidinhas ou bebidas, em doses pequenas, para que o corredor consiga comer ou beber em movimento, fazem uma cesta bonita, com as cores da bandeira mexicana, e passam horas gritando o nome de desconhecidos. Eu nunca havia visto uma festa tão linda em qualquer corrida no Brasil. “Sí, se puede!” é gritado em coro por eles e as crianças fazem fila com as mãos postas para que os corredores passem batendo. Sei que existem maratonas com o percurso impecável, de ruas planas e largas, passando por avenidas mundialmente famosas, como a Champs-Élysées, em Paris, mas esta alegria do povo mexicano vou levar para sempre com uma das lembranças mais bonitas na minha história com a corrida. Viva este esporte que amo! Viva o povo mexicano! Viva México!
Fontes: Worldatlas, Webrun, Contra-Relógio, Runner’s World, Maratón CDMX e Portal CDMX.
4 Comments
Que incentivo ao esporte, parabéns!!!
Obrigada! Vamos correr também?
Oi Ana, muito legal seus posts, estou indo morar no México e estou lendo todos. Tá me ajudando mto.
Como chama esse seu grupo de corrida? Fica na cidade do México?
Oi Juliana, que bom que está te ajudando, o objetivo maior é este mesmo! O grupo de corrida fica, sim, na Cidade do México. Aos sábados o treino é no Chapultepec e aos domingos é na Reforma. Vou deixar aqui o contato (Runner Plus MX): http://runnersplus.mx. Vai lá!