Todas as vezes que tive a oportunidade de viajar para outros países, procurei saber um pouquinho sobre a história dos locais que visitei. Sim, eu gosto de passar o dia em museus e tirar fotos – sou bem turista mesmo! Afinal, conhecer um pouco sobre a história do lugar que visitamos ajuda a compreender as diferenças culturais, as relações humanas e seus valores atuais.
Aqui na África do Sul não poderia ser diferente, afinal estava me mudando para cá. Neste texto gostaria de simplificar e contar um pouco sobre o que aprendi sobre o apartheid, quem foi Nelson Mandela e os reflexos dessa “recente” história nos dias de hoje.
O que foi o apartheid?
Apartheid foi um sistema governamental de segregação baseado em diferenças raciais imposto pelo NP (National Party) entre os anos de 1948 a 1994. Este regime retirou os direitos e inibiu os movimentos da grande maioria da população do país (negros e outros grupos étnicos) e instituiu as regras de uma minoria dominada pelos brancos.
A segregação dos grupos se caracterizava em todas as áreas sociais:
- As áreas residenciais eram delimitadas;
- O casamento inter-racial era proibido;
- A educação era diferenciada;
- Os serviços públicos eram segregados, desde banheiros a transportes.
A partir de 1950 vários movimentos e lutas surgiram contra este regime e muitos líderes foram banidos e presos, incluindo Nelson Mandela. Somente em 1990 o presidente Frederik Willem de Klerk iniciou as negociações para o fim do apartheid e a primeira eleição democrática em 1994 elegeu Mandela como presidente, colocando o partido politico ANC (African National Congress) no poder. Leia mais sobre a história da África do Sul aqui.
Quando recebo visitas de amigos e familiares aqui em Joanesburgo procuro incluir na programação uma visita ao Museu do Apartheid. É um museu moderno e com uma arquitetura super interessante. Vale a pena.
Nelson Mandela
Nelson Rolihlahla Mandela nasceu em 1918 na vila de Mvezo em Umtata. Estudou direito e trabalhou como advogado, juntamente com Oliver Tambo, em defesa dos direitos dos negros. Logo se tornou um dos líderes do movimento contra o regime do apartheid e foi preso inúmeras vezes, recebendo inclusive a pena perpétua, da qual ele cumpriu 27 anos. Em 1990 foi solto e quatro anos depois realizou seu sonho de ver uma eleição “livre”na África do Sul, em que foi eleito presidente.
Madiba (como Mandela é carinhosamente chamado) dizia que qualquer pessoa tem o poder de transformar o mundo em sua volta, se assim o desejar.
“What counts in life is not the mere fact that we have lived. It is what difference we have made to the life of others that will determine the significance of the life we lead.” (O que conta na vida não é o mero fato de termos vivido. É a diferença que fizemos na vida dos outros que determinará a significância da vida que levamos.) Nelson Mandela
Desde 2010 a África do Sul celebra, em 18 de julho, o Nelson Mandela International Day, mais conhecido como Mandela Day. O objetivo desta data é homenagear Mandela não só pelo seu aniversário, mas por sua história e seu legado. No site Mandeladay, qualquer pessoa pode se voluntariar para uma atividade que beneficia a comunidade ou ainda criar a sua própria ação e publicá-la.
Em 5 de dezembro de 2013 Nelson Mandela faleceu. Senti que todos aqui estavam preparados para receber a nota de falecimento de seu grande líder. Ao contrário do que se imaginava o clima era de celebração em vez de luto. Todos comemoraram a “vida” do Madiba. No dia de sua morte, fui com o meu marido à casa de Mandela no bairro de Houghton e encontramos pessoas cantando e dançando pelas ruas, todos prestando uma bela homenagem.
Para saber mais sobre a vida de Nelson Mandela clique aqui.
África do Sul hoje
A extinção do regime do Apartheid e o legado deixado por Nelson Mandela através de seu governo vão além do fim da segregação racial e restituição do direito de ir e vir de todos. Pode-se dizer que uma nova África do Sul foi criada. Vários benefícios foram alcançados, dentre eles:
- A liberdade de expressão da mídia.
- A inserção no mercado de trabalho dos chamados “previously disadvantaged” (grupos raciais oprimidos) através de programas de governo e novos direitos trabalhistas.
Por outro lado o país ainda tem grandes desafios como:
- O sistema democrático obrigou o novo governo a endereçar os reais problemas sociais, como por exemplo: HIV, criminalidade, a falta de energia elétrica, desigualdade social, desemprego, etc.
- A redistribuição de renda entre toda a população ao invés de apenas para uma minoria privilegiada.
É assustador pensar que há pouco mais de 20 anos a África do Sul viveu um forte regime de segregação racial que quase culminou em uma guerra civil. Por outro lado me impressiono com o desenvolvimento deste país que, após tanto sofrimento, consegue com esforço deixar o passado para trás e viver em relativa paz e harmonia.
Acho que esta é uma das principais razões da minha paixão pela África do Sul: a simpatia, a alegria e a receptividade diária daqueles que aqui vivem, apesar de tudo!
11 Comments
Obrigada por nos brindar com o seu texto no Mandela Day. É importante que as pessoas conheçam e reconheçam o trabalho de líderes como ele e que se inspirem para dar continuidade ao seu legado.
Boas comemorações por aí!
Oi Cristiane, obrigada pelo seu comentário novamente! Fico feliz que tenha gostado do texto. É muito difícil escrever sobre o Mandela em poucas linhas, o sentimento de gratidāo por sua contribuiçāo aqui é imensurável.
🙂
Michelle, muito legal seu texto. Estive na África do Sul em 2011 e conversei muito com as pessoas sobre como era o apartheid e concordo contigo, assustador. É uma daquelas manchas na história da humanidade que talvez nunca consiga ser apagada.
Parabéns pelo texto 🙂
Obrigada Aline!
Temos que acreditar que as próximas gerações possam aprender com este passado e comandar o futuro com mais sabedoria.
Muito bom o texto! Vale ler e aprender com quem vê uma cultura de dentro dela, não com olhos de turista.
Obrigada Solange pelo seu comentario!
Tive o prazer imensurável de viajar por 20 dias na África do Sul em janeiro.
E descobri o que significa “país em desenvolvimento”…
Ouvia tal expressão no colégio, mas não conseguia a visualizar…
Em Cape Town, Naysna e Port Elisabeth, entendi…
Há favelas, mas as vias tem excelente pavimento… junto às favelas, se assiste a hospitais e escolas…
O povo é de uma educação ímpar: todos, ao cruzarem com você na rua pela manhã, cumprimentam com um educado bom dia…
A educação reina… a sensação de paz também.
Ainda tem MUITO a melhorar, mas estão em desenvolvimento mesmo… ao contrário daqui, onde não vemos esta melhora de fato, lá, conversando com as pessoas, todos foram unânimes em dizer as melhorias do país ao longo dos últimos 15 anos…
Incrível país.
É um passeio imperdível para se entender o que passaram é a ilha na qual Mandela ficou preso. É literalmente de se emocionar.
Já havíamos viajado por inúmeros países, mas a África do Sul empatou com Seychelles como a melhor viagem que já fizemos.
Fico feliz Daniel que você tenha aproveitado sua viagem para cá e tenha observado este país com detalhes, como ele merece. Espero que volte logo!
Ao ler seu post, me veio uma pergunta: como é a relação entre os negros e brancos na África do Sul hoje? Ainda há preconceito (mesmo velado) entre eles? Eu tenho uma impressão que, na África do Sul, não há um convívio social entre eles, diferentemente do Brasil (não moram no mesmo bairro, não frequentam os mesmos lugares, não tem as mesmas oportunidades, etc). É realmente assim? Ou as coisas estão mudando? Obrigado.
Oi Elias,
Não queria deixar esse seu comentário sem reposta. Hoje existe sim um convívio social entre negros e brancos, frequentando os mesmos lugares e morando nos mesmos bairros. As coisas estāo mudando aos poucos, na minha opniāo. Este é um assunto bem delicado e como mencionei no texto, o regime do Apartheid deixou várias marcas, mas a populaçāo mais jovem tenta apagar o passado, construir um futuro melhor e viver em harmonia. Acho que isso é o mais importante neste momento. 🙂
Bjs
Michelle
Bom dia!
Vamos pra Joanes no proximo mês. Gostaria de conhecer este Museu. Vc me indica uma agência que faça este passeio mais em conta. Estão tão caros… Obrigada