Todo ano o dia 14 de julho é repleto de festividades em território francês. Conhecida como a festa nacional, comemora-se a queda da Bastilha. Mas o que este fato histórico simboliza? A Bastilha era uma velha fortaleza construída em 1370 e que foi usada pela regime monárquico absolutista como prisão de criminosos comuns. Com o passar dos anos, o prédio foi transformado em prisão de intelectuais e nobres, especialmente de opositores do rei. Assim, a invasão da fortaleza em Paris em 14 de julho de 1789 representa nada mais que o auge da Revolução Francesa, quando se extingue o regime absolutista, dando lugar a uma monarquia constitucional e sendo o ponto de partida para a implementação de valores iluministas mais tarde difundidos por todo o mundo – a liberdade, a igualdade e a fraternidade – por meio da aprovação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Ao mergulhar na cultura francesa, pude notar a intensidade com que os cidadãos vivenciam esses valores através de pequenas atitudes cotidianas ou mesmo no respeito demonstrado pelas autoridades, ainda que não concordem com tudo – sim, a fama de que os franceses são questionadores e revolucionários é verdadeira!
No ano passado estive em Paris para comemorar a festa nacional, durante o verão europeu. Não preciso nem dizer o quanto fiquei encantada com o que presenciei na Cidade Luz. As ruas ficam tomadas por pessoas do mundo inteiro, ansiosas por estarem presentes no desfile militar, no concerto e na queima de fogos na Torre Eiffel e nos bailes que se espalham pela cidade, especialmente no baile dos bombeiros. Dentre todas as autoridades aclamadas os bombeiros são os campeões de popularidade! Presenciei pais ensinando aos seus filhos o respeito que eles devem ter por todos os profissionais que se arriscam diariamente para salvar as vidas dos cidadãos comuns.
A cada ataque terrorista sofrido – em um ano e meio já foram três – todo esse patriotismo fica à flor da pele. Não foi diferente com o atentado em Nice. Confesso que chorei ao assistir os noticiários. Embora eu não estivesse no local do atentado, senti a dor dos franceses.
Sendo uma festa nacional, as comemorações são realizadas por toda a França. Como Nice é uma cidade litorânea, milhares de pessoas se encontravam reunidas à beira-mar, assistindo ao espetáculo de fogos de artifício. Em poucos minutos, o caos se instalou com a invasão do caminhão branco no Passeio dos Ingleses, famoso calçadão de Nice, atropelando e matando 84 pessoas e ferindo gravemente outras dezenas. Rapidamente a tranqüilidade deu lugar ao desespero e ao medo.
Os relatos de pessoas que presenciaram o atentado são chocantes. Nem sequer as crianças foram poupadas. Muitos falam sobre o barulho de pessoas sendo atropeladas; outras se jogaram na praia para não serem arrastadas pelo caminhão. O terrorista ainda teve tempo de atirar contra as pessoas antes de ser abatido pela polícia. A palavra mais utilizada pela mídia francesa para noticiar o acontecido é horror.
Nice não era considerada como um alvo de prováveis ataques terroristas, por ser uma cidade turística. Com belíssimas praias de águas azuis e paisagens magníficas, geralmente tem pouco movimento se comparada com outras cidades francesas, a não ser no verão e em dias especiais, como a festa nacional. Talvez por isso tenha sido escolhida. A segurança pode ter sido posta em segundo plano, enquanto que em Paris o policiamento foi reforçado a fim de evitar novos ataques.
Após o atentado, reivindicado pelo Estado Islâmico, o governo francês decretou luto de três dias, e o estado de urgência, quando medidas excepcionais podem ser tomadas em prol da segurança pública, foi prolongado por mais três meses- antes do ataque, seria até 26 de julho, como medida de segurança ainda em relação aos ataques de 13 de novembro de 2015.
Independentemente do alvo escolhido, o resultado sempre é trágico. Dezenas de inocentes perdem suas vidas sem cessar numa guerra silenciosa. O terror está presente o tempo todo, mas só vem à tona em atentados, destinados a atacar os valores fundamentais de um país, com o único objetivo de enfraquecer a confiança das pessoas. A pergunta que sempre me faço é até quando presenciaremos fatos como esse. E a resposta sempre ecoa na intolerância, sem uma única luz no fim do túnel.
2 Comments
Olá Carolina! Fico entristecido com essas notícias tristes de ataques terroristas, principalmente na França. Isso tira até a nossa tranquilidade, de quem pretende “turistar” pra lá. Mas toda vez que acontece um ataque terrorista em um país europeu, muito se discute sobre a política de imigração e a recepção de refugiados. É crescente o número de pessoas que acham que a imigração trouxe mais desordem para os países europeus (e partidos políticos mais radicais contra a imigração tem ganhado mais apoio do público – é um discurso odioso que atinge até nós, brasileiros, que desejam imigrar).
Enfim, eu gostaria que você fizesse um post sobre como é a comunidade árabe na França, se você já teve a oportunidade de conhecê-los, saber como eles são, porque vejo muitos comentários contraditórios a respeito deles (alguns falam mal e outros falam bem). E também saber como eles estão reagindo a essas notícias de ataques terroristas.
Muito obrigado pelo post! 🙂
Olá, Elias! Em primeiro lugar, muito obrigada por acompanhar o blog! Realmente, tantos ataques terroristas assustam moradores e turistas. Considerando o contexto mundial atual, partidos políticos que defendem idéias extremistas ganham força. Independentemente dos imigrantes serem de fato os causadores dos atentados, o preconceito que eles sofrem diariamente são freqüentes, especialmente os árabes. Logo tratarei mais a fundo sobre o assunto! Abraços!