Atentado terrorista na Noruega.
Data: 22 de julho de 2011. Faz um pouco mais de 5 anos desde um evento que aos poucos mudou minha perspectiva sobre a Noruega e os noruegueses.
Haviam várias fitas amarelas aos arredores do Hotel Bristol (onde eu estava hospedada) e em muitas ruas do centro, bloqueando o acesso dos pedestres. A capital da Noruega mais parecia uma cidade sitiada. Vidros espalhados pelo chão, vitrines de lojas quebradas, olhares tristes e incrédulos. O saguão do Bristol virou escritório temporário de jornalistas de todas as partes do mundo. Eu ainda não compreendia o que acabara de acontecer.
Uma bomba explodiu no coração de Oslo, destruindo o edifício do primeiro-ministro e danificando vários outros prédios do governo. Esse único ataque terrorista matou oito pessoas e feriu 89. No mesmo dia, na ilha de Utøya, o mesmo terrorista responsável pela bomba no centro de Oslo, Anders Breivik, matou 69 pessoas e feriu mais 62 – em sua maioria adolescentes que participavam de um acampamento de verão para jovens membros do Partido Trabalhista.
O governo norueguês poderia ter focado na ameaça e manter o país em um clima de medo e insegurança. Em vez disso, o então primeiro-ministro Jens Stoltenberg adotou como mantra a frase que uma jovem disse após a tragédia: “Se uma pessoa pode criar tanto ódio, pense no quanto amor que todos nós podemos criar juntos.”
Em 2011 faziam 5 anos que eu morava na Noruega. Este acontecimento que marcou um país inteiro, que inundou as ruas de Oslo com rosas e outras tantas flores somada a resposta do país e sua população à essa tragédia concedeu-me uma outra visão dos noruegueses.
Apenas três dias depois do tiroteio, cerca de 200.000 pessoas (se não mais) se reuniram nas ruas para uma cerimônia de homenagem às vítimas, com flores nas mãos e muitas outras cerimônias foram realizadas realizadas em cidades e vilas em todo o país. O príncipe herdeiro, Håkon, declarou: “Hoje, nossas ruas estão cheias de amor.” Eu vi e ouvi tudo isso, porquê eu estava lá, com e entre todas as outras pessoas, noruegueses e estrangeiros, em silêncio pela mesma dor.
Colocando historicamente, a Noruega era um lugar pouco povoado e com poucas cidades. No início de 1800, menos de um milhão de pessoas viviam neste país. A maioria delas em pequenas comunidades rurais sob condições pobres, com invernos longos e frios. Para quem tem idéia do frio que estou descrevendo aqui, imagine lá atrás em 1800, sem a tecnologia que temos hoje usada na produção das roupas de inverno. Com vento e temperaturas ásperas, a comunicação se dava de uma forma curta, forte e eficaz. Não há tempo para conversa fiada! As pessoas usavam seu tempo com muito trabalho físico, trabalho duro.
Nestas pequenas e espalhadas comunidades ‘todo mundo conhecia todo mundo’. Estranhos eram vistos frequentemente com grande ceticismo. Em muitos aspectos, podemos dizer que os noruegueses não tinham habilidades sociais. Há ainda um “lado selvagem” no estilo de vida de muitos noruegueses, e esta é provavelmente a razão pela qual até hoje eles usufruem muito de seu tempo ao ar livre. Muitos noruegueses isolam-se nas montanhas em suas cabanas, acampando ou à beira-mar durante fins de semana e feriados – alguns, de preferência na solidão total (eu tenho vários amigos assim).
Sabendo disso, a minha função neste texto é passar para vocês um pouco do conhecimento que eu adquiri sobre a cultura e o comportamento dos noruegueses. Eu mencionei anteriormente que noruegueses são frequentemente considerados reservados, controlados e introvertidos – mas também amigáveis. É um fato que eles não são conhecidos por falarem pelos cotovelos (com excessão do meu filho mais velho) ou mostrar afeto excessivo em público. Mas isso é uma questão mais cultural do que de frieza.
A forma como os estrangeiros interpretam as respostas que recebem dos noruegueses em diferentes situações, tanto a verbal ou emocional, é muitas vezes algo sutil em comparação ao que experenciamos em outros países. Pode ser um desafio interpretar este tipo de resposta de forma correta no início.
Se não tivermos qualquer conhecimento da cultura norueguesa, a integração será difícil. Aí mora o perigo da má interpretação.
Para noruegueses é bastante comum responder uns aos outros diretamente, sem delongas ou brincadeiras. O norueguês precisa de espaço e muito espaço. Não pode ser invadido, é necessário alguns truques e usar um pouco de inteligência social para lidar com eles – acredito que com qualquer pessoa, na verdade. Para alguém que vem de outra cultura, talvez interprete o comportamento norueguês como exclusão. Mas não é. É apenas a cultura norueguesa, que é normal e tem a sua história como qualquer outra.
Então, não crie conflitos e inseguranças inexistente na sua cabecinha. Olhe as pessoas com os olhos de uma criança descobrindo um mundo novo, observe e as estude. O problema não está em nós sermos estrangeiras, latinas, etc. Nós somos nós, assim como eles são eles. Todos munidos de nossa cultura, história, experiência de vida e mais um pouco. Com todas as emoções possíveis de um ser humano.
Se os noruegueses fossem frios, não haveria o Vigelandspark e sua incrível coleção de esculturas celebrando a vida humana. Todas elas esculpidas por Gustav Vigeland, um norueguês. Ele criou esse complexo de esculturas que mostram um ciclo de vida, bem como várias emoções e as relações entre as pessoas. Algo que merece ser visto e que vai além da descrição. As esculturas falam por si só.
E ao experienciar esse novo olhar sobre a Noruega e os noruegueses, eu aprendi que ainda tenho mais o que aprender. Aprender a não nos limitar apenas com a ‘primeiras impressões’ e a não ter uma opinião absoluta sobre as coisas e sobre ninguém. Aprender a observar não apenas as reações mas as respostas e emoções escondidas no olhar das pessoas, e respondê-las com amor, abertura, tolerância – e porque não também com rosas?
6 Comments
Entendi toda história mana, por trás da história ????????????
Muito obrigada, mana! <3 Nos veremos em breve para prosear sobre todo esse tema!
Ola Wendy,
Muito bons os seus posts. Conheço um pouco da economia e cultura norueguesa e é exatamente isso que você descreve. E você escreve muito bem. Parabéns.
Meu filho mora em Trondheim e acabei gostando do país e da culturaa. Já li os tres primeiros livros do Karl Ove Knausgaard, assisti alguns episódios de Lylihammer, assisti o filme In Order of Disappearance (do Hans Peter Moland) e nesta semana vi a comédia italiana QUO VADO.
Recomendo muito Quo Vado, imagine um italiano puro morando na Noruega.
Coloquei o blog nos favoritos e vez por outra voltarei par ler sues próximos relatos.
Olá Carlyle! Muito obrigada pelo comentário positivo, eu me sinto feliz em ler. Muito obrigada pelas dica de leitura e de filme (vou procurar para assistir amanhã mesmo), e fica também aqui para todos que tenham o interesse! E volte sim pois é uma honra poder escrever e compartilhar com vocês informações, pensamentos e aprendizados. Tenha certeza que seu comentário enriqueceu meu dia! Um grande abraço!
Wendy. Chorei vendo suas fotos do Vigeland Park, do mesmo jeito quando a primeira vez estive em Oslo em 1975. Foi uma experiência, a emoção e a leveza sentida no granito do o Park, desenhado pelo próprio escultor, jardins, grades. Estudei na Faculdade de Artes da UERGS em Porto Alegre. tenho 79 anos, Ainda publicitário trabalhando. Velho amante da fotografia ainda guardo as cópias descoloridas da obra de Gustav Vigeland. Gostei tanto desta terra, que já voltei 4 vezes em diferentes viagens. Ainda dou um rolê pelo Google. Conheci a evolução leve dos tempos, o mesmo povo, com seu jeito de viver intensamente a vida em tudo que a natureza nos ofereça.
Teu blog, mexeu comigo. Obrigado. Plinio Monte da Rocha
Oi Wendy, tudo bem?
Eu to com uma certa dúvida, minha irmã casou e está morando com os filhos na Noruega, à 1 hora de Bergen.
A situação no Rio de Janeiro está complicada mas não tenho certeza de como poderia ir para lá.
Ela me ofereceu moradia mas não pode me ajudar financeiramente. Como eu conseguiria ir para lá, trabalhar e estudar. Tenho algum direito se tenho família lá?