A hipervigilância, ou seja, um estado constante de tensão, é um dos sintomas recorrentes em moradores de cidades com alto índice de insegurança. As pessoas estão altamente atentivos a tudo e todos, caminham a passos rápidos e se assustam com facilidade a um simples ruído. Isto porque se sentem ameaçadas e, por sobrevivência, desencadeiam uma hiper atenção mas que muitas vezes se transformam em ansiedade patológica.
Assim, aos que podem, cada vez mais tentam “escapar” de cidades e países com alto índice de violência e criminalidade em busca de lugares tranquilos, onde possam usufruir de suas vidas sem a carga da super autoproteção.
Aos que optam por mudar-se para a Europa ou simplesmente visitá-la, uma das buscas é pelo índice de segurança dos países e cidades. Como em todo o mundo, por aqui também há lugares bucólicos onde reina a calmaria, porém há outros pontos de periculosidade, principalmente nas grandes capitais com alto fluxo de turistas.
Em Bruxelas não é diferente. Capital da União Européia, com encontros recorrentes de líderes de estados e empresários, é sempre um local de grandes manifestações e alvo de atenção a atentados terroristas. Mas como é viver aqui? Bruxelas é uma cidade segura?
Há um ano morando na capital da Bélgica, posso dizer que sim, corroborando as últimas estatísticas da polícia federal que registrou uma diminuição de 50% no número de crimes em geral em relação ao primeiro semestre do ano anterior, sendo o maior número os crimes de degradação à propriedades, no entanto não raro é ler, principalmente nos grupos de redes sociais, pessoas que foram furtadas, extorquidas, molestadas verbalmente e também tentativas de abuso sexual.
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Quanto aos furtos, o risco principal está em circular desatentamente pelo centro e polos turísticos da capital, assim como nas principais estações de trem e metrô, como Bruxelles Midi, Bruxelles Central e Bruxelles North, a que merece maior atenção. Bairros como Anneessens, Anderlecht, Chaarbeek, Bruselas Norte, St-Josse, Marollen e Molenbeek devem ser evitados durante a noite, principalmente se você desconhece o local.
Quanto a crimes de violência física, atenção a saídas de discotecas e festas, pois infelizmente há um alto índice de drogaditos e alcoólicos à fim de brigar até com a própria sombra. Eu presenciei esta situação algumas vezes, inclusive tendo amigos como vítimas.
Sobre os crimes contra a mulher, podemos ler o relato da ex colunista Nathália Nascimento que em junho de 2018 foi assediada por três homens na estação de trem de Chapelle, que por estar localizada em um local ermo, é considerada perigosa pelos belgas e, por defender-se, acabou por ser violentada fisicamente.
A Bélgica possui uma população feminina de, aproximadamente, 51% e sofre, sigilosamente, diversos tipos de violência. Em uma pesquisa de 2015, os índices de violência física, sexual ou emocional foram, respectivamente, 1,9%, 0,9% e 11,9% (para o período de 12 meses analisado). O perfil dos perpetuadores da violência contra a mulher na Bélgica é de parceiros íntimos (ex: marido ou namorado) e familiares (como pai ou irmãos).
No entanto, Bruxelas é considerada como uma cidade segura para as mulheres, inclusive, em 2014, foram promulgadas uma série de leis que protegem mulheres de assédio sexual. Assediar uma mulher na rua, por exemplo, pode levar a uma condenação de quase um ano de prisão ou uma multa que varia de 50 a 1.000 euros, isto após a estudante Sophie Peeters gravar um documentário (“Femme de la Rue”) que retratava os assédios que as mulheres sofriam na rua.
Bruxelas também possui a sua “cracolândia”, pelo menos é assim que vejo e nomeio a região cerca da estação de trem/metrô do Norte (Gare de Nord). Quando, por infelicidade, errei a saída e acabei, juntamente com meu marido e filho, em um espaço totalmente abandonado, repleto de gente, em grande maioria homens imigrantes, ao chão como zumbis deploráveis em seus mundos narcóticos. Um cenário de terror e medo. Este foi o auge fóbico de minha vida na capital belga. Por isto recomendo evitar ao máximo este local, já negligenciado pela própria polícia local. Assim como muita atenção a estação de trem localizada mais acima, onde há vários relatos de furtos.
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O capítulo terrorismo é atualmente um risco eminente, mas que raramente paralisa a rotina dos cidadãos. Desde 2015 a Bélgica tem sido alvo de vários ataques terroristas e com isto a polícia local intensificou a segurança em lugares públicos, assim é comum ver o exército armado circulando pelos principais pontos turísticos e estações. Inclusive alguns eventos podem ser cancelados a curto prazo em caso de ameaças sérias. Eu, por exemplo, vivenciei uma situação na estação Schumann do metrô, com a interdição dos transportes por ameaça de bomba. Neste caso, todos os presentes foram obrigados a abandonar o local para inspeção, ainda assim não senti grandes alardes.
Apesar disso, há relatos de vítimas dos atentados que não veem nenhuma intensificação ou alteração de segurança, bem como cidadãos que se sentem constantemente ameaçados e portanto, têm sua saúde mental comprometida. Aqui voltamos ao princípio do artigo e também podemos constatar a presença de hipervigilância em cidadãos “bruxelenses”.
Assim, cuidado nunca é demais, pois como diz o ditado: “o seguro morreu de velho”.
E você, já teve alguma experiência de crimes em Bruxelas ou na Bélgica? Deixe seu comentário.
6 Comments
Eu e minha esposa tivemos um problemão ao chegar em Bruxelas na nossa lua de mel, em 2013. Viemos de trem a partir de Amsterdam e chegando em Bruxelles-Midi precisávamos comprar tickets de metrô para rumar para o hotel. Tínhamos 2 malas e uma valise de mão com rodinhas, e deixamos todas elas bem próximas da gente para não sermos vítimas de larápios enquanto fazíamos a compra. Sou paranoico com esse tipo de golpe e tento não dar sopa nunca para o azar.
Mesmo assim, em uma fração de segundo que dediquei de atenção ao totem de autoatendimento para comprar o ticket, olhei para o lado e a valise tinha sumido, com joias e produtos da minha esposa. Saí correndo pela estação sem uma direção definida (afinal é muito grande e com trânsito intenso de pessoas), sem identificar qualquer suspeita de por onde tinha sido levada. Não falamos francês e comecei a tentar conseguir algum apoio em inglês.
Uma local viu nosso desespero e tentou nos ajudar, nos colocando em contato com a polícia de plantão na estação. Eram cerca de 17h45 e o agente mostrou pouco ou nenhum entusiasmo em tentar empreender uma busca, pois o expediente “estava para encerrar”. Fiquei embasbacado não apenas com o pouco caso em tentar resolver a situação, mas também com o fato de que a polícia tem HORÁRIO DE ATUAÇÃO na maior estação de metrô/trem da capital do país! O jeito foi se resignar, acabou sendo um fato que estragou o final da viagem. Dois dias depois, antes de pegar o Eurostar para retornar, procurei se havia algo na seção de achados e perdidos mas ninguém encontrou nada.
Não somos inexperientes em viagens internacionais, mas ficou a lição reforçada de que com dedos leves todo cuidado é pouquíssimo. Não nego que isso, aliado à quantidade notável de pedintes e pobreza nas ruas de Bruxelas, nos deixou uma impressão negativa da cidade.
Caro Raphael,
Quando fui à Bélgica pela primeira vez, também em 2013, tive algumas sensações bastante parecidas. Felizmente não fui furtada, tampouco sofri ameaças, porém quando desembarquei na estação Sud de trem, antes das 7h da manhã, quando a maioria dos quiosques e cafeterias estavam fechados, tive imensa dificuldade para encontrar uma santa alma que falasse inglês, para me ajudar com as orientações do hotel, bem como uma tomada para carregar o meu celular, pois nessas horas, a Lei de Murphy impera. Após quase 2 horas, a única pessoa que me ajudou foi justamente uma brasileira que vivia em Bruxelas e amavelmente me levou até a recepção do hotel. Confesso que ao sair da estação a impressão não foram as melhores, pois justamente passei pelo bairro predominantemente muçulmano onde depois encontraram os culpados pelos atentados.
Infelizmente, Bruxelas precisou sofrer alguns atentados para se precaver e se assegurar. Hoje, como moradora, posso te dizer que a segurança melhorou e muito, inclusive ao redor da Estação Midi é onde se encontram a maior concentração de homens do exercito. Isso, é óbvio, não exclui os furtos, principalmente nos locais mais turísticos e nas estações de trem e metro em geral, mas fez de Bruxelas um local com maior liberdade despreocupante de circulação.
Também cercaram-se de balcões de informações turísticas poli lingue o que facilitou e muito a vida de turísticas e também de moradores, pois há uma quantidade gigantesca de expatriados, principalmente estudantes, que utilizam apenas o inglês no dia-a-dia. Exceção aos serviços de administração pública, como prefeitura.
O que ainda vejo como uma ‘ameaça” como bem relatou a Natalia em seu texto que mencionei neste artigo, são os “crimes”ou tentativas, às mulheres. Há uma comunidade gigantesca de imigrantes de cultura extremamente machista que vive (e circula) em Bruxelas e não é raro ouvir mulheres, principalmente de cultura ocidental, queixando-se de alguma violência verbal, emocional e física. Ai, aconselho as mulheres evitarem circularem sozinhas, em locais mais afastados e ermos na grande muvuca, após as 22h.
Ah, os pedintes ainda existem, fato incompreendido pelos belgas pois o sistema de ajuda governamental por aqui, é praticamente “uma mãe”. Durante o verão principalmente, em muitas capitais europeias, está é uma realidade.
Muito obrigada pelo seu comentário e continue seguindo nossa plataforma.
Abraços
Fiz um comentário ontem e acabou não sendo publicado. Será que deu erro no sistema ou são moderados antes de ir pro ar?
Raphael,
Todos os comentários são moderados e necessitam a aprovação das colunistas que o escreveram. Li o seu comentário e acabo de aprovação-lo. Agradeço imensamente.
Abraços
Olá Marcela, sou brasileira e tenho dois filhos, atualmente moramos em Portugal. Vi que já morou na Bélgica e mora na Espanha, por coincidência meu marido e eu estamos avaliando proposta de emprego em ambos países. O clima e falta de segurança de cidade grande de Bruxelas me desanimam, porém o modelo de ensino é muito atrativo. Se puder compartilhar sua perspectiva de mãe em ambos, agradeço. Muito obrigada
Olá Carolina,
Eu particularmente não me sentia totalmente segura em Bruxelas, mas isso também vai de acordo com o bairro em que reside. Há também opções de cidades pequenas ao redor, que são mais tranquilas.
Quanto ao sistema de ensino, não sei o que você considera atrativo. Na Bélgica o sistema é ainda muito tradicional e eu não sou partidária. Aqui na Espanha também segue um sistema público conservador, mas há muito mais possibilidade de encontrar escolas com sistemas mais horizontais e abertos.
Abraços