Muitas pessoas me perguntam sobre como é ser casada com alguém de outro pais. Afinal, dizem, além da língua materna ser diferente há toda uma herança cultural por trás da ideia de nacionalidade. Mas será que há mesmo? Quais os desafios enfrentados por estes casais? Quais os benefícios? E os filhos, sentados no muro entre as duas culturas, como ficam?
Sou casada com Mexicano e, embora haja muitas diferenças entres estas culturas, posso afirmar que no meu caso não as sinto de forma categórica no dia-dia. Creio que isto deve-se ao fato de que meu marido, como eu, não é o típico mexicano. Estudou e morou fora muitos anos, o que faz com que a pessoa ( geralmente) tenha mais abertura á outras culturas. Comigo não foi diferente. Mudei-me para o Canadá aos vinte anos e foi lá, inclusive, que conheci meu marido. Viajamos muito e acredito que somos mais cidadãos do mundo que brasileira e mexicano propriamente ditos. Claro que, há algumas pequenas questões, como senso de humor. Nem sempre achamos graça das mesmas coisas.
O Mexicano tende a levar as coisas mais a sério que nós brasileiros, que temos o hábito de fazer piada com tudo e com todos. De um modo geral, porém, penso que meu marido e eu somos fruto de uma mescla entre culturas e que, neste sentido, formamos parte da mesma cultura.
O argumento principal aqui é definir o que entendemos por cultura, naturalmente. Afinal, sou uma brasileira que não gosta de samba, nem de futebol, nem de praia, nem de calor. Mas será que isso é cultura brasileira ou simplesmente hábitos aos quais associamos com idéias estériotipadas de cultura? (O texto Brasileira Made in Paraguay aqui no blog, tambem aborda esse assunto)
Questiono isso regularmente. O que significa ser brasileiro? Tá, nasci em um lugar cujas dimensões pertencem à um Pais chamado Brasil. Mas, e dai? O que nós brasileiros temos em comum além de localização geográfica no momento do nascimento? Para mim, o que temos em comum é memória cultural. Seja ela, do cheirinho de pão de queijo assando, de programas de televisão vistos na infancia como balão mágico ou xuxa, de comprar um xburger ao invés de cheeseburger, de reconhecer a musiquinha de abertura do jornal nacional, de ir a festas juninas, entre outras coisas. Gostando ou não de tais memórias, são memórias que acredito muitos brasileiros temos. Não estou generalizando, simplesmente são fragmentos da minha memória de Brasil.
Neste ponto sim, há divergências com meu marido. Por exemplo, ele ainda que tenha morado 5 anos no Brasil, ainda não entende exatamente a idéia de festa junina. Parece-lhe preconceituosa a idéia de pessoas só por serem do campo não terem dente, falarem errado e tal. De fato, quando penso a respeito acho que ele tem razão. Mas nunca nem questionamos isso no Brasil. Pelo menos eu nunca questionei até ter que explicar para o meu marido o por quê de se fantasiarem daquele jeito. Ele nunca entendeu e, confesso, que eu passei a não entender muito bem também. Mas nada que um bom quentão e canjica não me façam esquecer de tentar entender e só me divertir.
Aqui no México há diversas festas folclóricas que fazem total sentido para eles e que, para mim, são super estranhas. Começando pela famosa festa do dia dos mortos. Para quem não conhece, no dia 2 de novembro aqui no México celebra-se El dia de Muertos. No Brasil temos o feriado do dia de finados, mas aqui é uma festança mesmo. Alebrijes ( esculturas coloridas) espalhados pela cidade, as pessoas escrevem versos falando de caveiras e mortes,e algumas se vestem de Katrinas ( são caveiras gigantes e chiquérrimas) . Alem disto, a tradição é comer o pan de muerto, uma espécie de rosca doce. Aliás, o pan de muerto é muito parecido a “rosca de reyes” que se como no Dia de Reis. Com uma grave diferença: dentro escondem bonequinhos de plástico ( exatamente isso. De plástico!!) e quem cortar uma fatia com o tal boneco se compromete a cozinhar tamales ( espécie de pamonha mexicana) para toda a família.
Para mim toda vez que tenho que comer com minha família mexicana o tal pão, fico apavorada. Não em ter que cozinhar os tais tamales – ainda que de fato eu não tenha idéia como prepará-los- mas sim em me engasgar com o diabo do boneco de plástico. O pior é que aqui dão o pão para crianças também. Ano passado meu pavor era tanto de engolir sem querer o intruso de plástico na minha sobremesa que destrocei a rosca no prato antes de metê-la na boca. E acredite ou não, ainda assim saiu um boneco no meu pedaço. Sorte que eu já mastigava tão temerosa e devagar que deu pra cuspir a tempo e evitar uma corrida ao pronto-socorro.
Ao perguntar para meus parentes mexicanos, o por quê de botarem algo não comestível dentro da comida, eles disseram que se fosse comestível todos os mexicanos simplesmente comeriam o boneco e não diriam a ninguém para não ter que preparar tamales para toda a família (!!!). Choque cultural total para mim. Prefiro cozinhar milhões de tamales a morrer engasgada com um pedaço de plástico, mas tudo bem. Quando em Roma- ou melhor no México- faça como os mexicanos e arrisque-se comendo uma rosca de reyes. Será por isso que é igualzinho ao pan de muerto? Tá vendo, lá vou eu e meu senso de humor que não entendem bem por aqui.
Outro aspecto importante do casamento inter-cultural é a questão linguistica. Aqui em casa, por exemplo, falamos o tempo inteiro três línguas : inglês ( porque nos conhecemos falando inglês), português e espanhol. Nos entendemos super bem assim, embora para alguém de fora possa parecer a maior maluquice.
A questão filhos, porém já é um pouco mais complicada. Meu filho nasceu no Brasil, mas nos mudamos para cá quando ele tinha apenas um ano. A principio achei que seria super bacana ele já aprender espanhol e português desde pequeno. O problema é que hoje em dia, ele fala muito mais espanhol do que português. Aí dá aquela raivinha e reclamo com o marido que temos que ir mais vezes ao Brasil. Mas logo passa quando vejo que meu filho está crescendo em meio a uma grande diversidade cultural, e ainda que muitas vezes prefira o espanhol, entende perfeitamente o português.
E para complicar ainda mais as coisas pro meu lado, ele agora em setembro vai entrar para a escola francesa, onde todas as aulas são completamente em francês. Então o jeito é deixar de lado o egoísmo e ensinar todas as línguas as quais temos acesso aos filhos, sem se preocupar em demasia se eles serão mexicanos, brasileiros, russos ou chineses. Serão, afinal, cidadãos do mundo com todas os benefícios e desafios que isso implica. E nós também.
23 Comments
Oi Fernanda, muito interessante o seu texto, eu sou casada com alemao, mas ao mesmo tempo meu marido assim como eu somos também bem cosmopolitas, acho que isto ja facilita e muito um casamento multi-cultural, pois ambos teem uma experiencia que chamo de “intersecçao cultural”. Muito mais dificil é quando ambos ou um dos parceiros nunca viveram em outro pais, vejo mais dificuldades em casamentos multi-culturais deste tipo. Outro fator importante, é que antes de sermos “cultura” somos seres humanos e isto também nos ajuda a achar um ponto em comum, afinal todos nos temos emoçoes e somos movidos pelos mesmos instintos. A cultura nos proporciona as experiencias, nosso sistema de valores, nossos habitos e influenciam nosso comportamento, nossa forma de relacionar com os outros, como vc tao bem descreve como os cheiros, as associaçoes, os costumes, as diferentes reaçoes diante da mesma situaçao. Adorei seu texto! Namasté!
Oi Ana Cristina 🙂
Fico feliz que tenha gostado do texto. Acredito que quando o nosso parceiro (a) já morou também em outros lugares, como no seu caso, facilita demais. Não sei como seria estar casada com um mexicano bem tipico, daqueles que nunca sairam do País não. Alemão que nao teve nenhum contato com outras culturas também não deve ser facil nao hahaha Os conflitos certamente seriam mais constantes. Agora, claro que como vc disse, antes de tudo somos seres humanos e neste aspecto sempre teremos algo em comum. O importante é nao generalizarmos, afinal cada união é única. Namasté!
Oi Fe! Adoro seus textos porque vejo muita semelhança com algumas das coisas que vivi e vivo… No final, acho que a grande diferença em um casamento inter-cultural é a criação de cada um, mas esse também não é o grande ponto em casamentos entre pessoas da mesma cultura? Todas as vezes que discuto com meu marido, percebo que não é porque sou brasileira e ele espanhol, mas porque eu sou eu e ele é ele! Hehe! Algumas vezes, eu quero jogá-lo da janela do nosso apartamento, mas são coisas da convivência, acho…
Em relação à rosca, a Roscón de Reyes da Espanha não contém um, mas DOIS pedaços não-comestíveis: um boneco (o rei) e a fava. A quem le tocar o boneco, será rei pelo dia… A quem le tocar a fava, terá que pagar o roscón! Imagino você desesperada com isso! 😉
Beijos
Oi Tati,
Putz, dois bonecos é sacanagem!! Se bem que aqui dependendo do tamanho da rosca eles colocam varios para aumentar a aventura ( ou risco fatal!!) hahahhaa
Concordo com vc em relação às brigas não terem necessariamente nada a ver com a nacionalidade. Eu tambem quando discuto com meu marido, brigo com ele e nao com um mexicano hahaha. Mas por exemplo, eu jamais poderia nem brincar dizendo que vou jogar meu marido da janela. Ele jamais entenderia isso. Os mexicanos levam tudo a serio e no sentido literal hehe. Os espanhois ja sao mais tranquilos, acho. Tenho varios amigos espanhois que adoram ( e entendem) nosso senso de humor ne?
Acho que vc tocou num ponto importantissimo que é a questão da criação. Realmente acho que é o fator principal nesta questão toda, independentemente da cultura.
Bjs,
F
A mescla de culturas acaba sendo rica no final rs…o que mais gosto talvez seja o idioma novo que eh criado dentro de casa. 3 idiomas na mesma frase com conotacoes diferentes e no final todos se entendem :). So quem vive sabe como eh gostoso. Nao trocaria por nada 🙂
Com certeza, Ann!! É uma delicia tao grande que cada vez quero colocar mais idiomas dentro de casa hahaha Não sei parar hahahahhaha
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Fernanda,
Parabéns pelos textos.
Eu sou uma jovem apaixonada pelo México e sua cultura.
E graças a Deus e ao nosso esforço, meu companheiro e eu iremos conhecer esse País no mês 04/2014.
Gostaria que você (se possível) me ajudasse em algumas questões.
1• tenho o sonho de me casar na Ciudad do México com o meu companheiro.
Você saberia me dizer se existe essa possibilidade sendo que ambos somos brasileiros?
Bem, tenho algumas outras questões mas gostaria de falar em private.
Você poderia me passar seu contato de skype, e-mail e/ou facebook?
Muito obrigada desde já e parabéns novamente.
Abaixo seguem meus contatos.
Beijo,
Ana Paula Siewerdt
Jornalista
MTB-SP nº 54535
Phone: +55 (11) 8353-1192
Mail: apaulasiewerdt@gmail.com
São Paulo – SP – Brasil
Oi Ana Paula,
Que bacana que vcs querem se casar aqui no Mexico! Pode contar comigo para o que precisar. Vou te escrever um email para que possamos conversar mais a vontade. Beijos!
Parabéns, Fernanda! Nunca tinha pensado sobre as festas juninas deste prisma. Bela reflexão! No mais, que sorte tem o seu filhote. Espero que o meu também fale tantas línguas desde pequeno morando na Espanha.
Obrigada, juliana 🙂 E com certeza, se seu filho já está sendo exposto ao português e ao espanhol ( ou catalão ) desde pequeno, aprender outras fica bem mais fácil. Que parte da Espanha vc mora? Beijos!
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Amei o seu texto e rir demais!!! Já me senti orientada hj em alguns planos meus para o México!!! Obrigada
Oi Juliana! Que bom que você curtiu o texto 🙂 Você está de mudança para o México ou a passeio? Um grande abraço!
Olá Fernanda,
Meu nome é Ella Kristel vou me casar com um mexicano. Já moro no México com ele e por esses dias meu pai me colocou uma dúvida. Não estou me casando pensando em divórcio, mas meu pai me colocou uma questão, “o que aconteceria se eu decidir me divorciar? quais são meus direitos, e os filhos com quem fica?”
Vc sabe de algo sobre o assunto? Conhece alguém que possa me orientar?
Meu e-mail é ellakristel@hotmail.com
Aguardo a sua resposta….
Obs.: adorei seu texto!
Oi Ella Kristel! Tudo bem? Estando casada com um Mexicano e após morar dois anos com ele no México, vc pode dar entrada no pedido de cidadania Mexicana. Caso tenha filhos antes dos dois anos morando no Mexico, a cidadania é imediata ao nascimento. Caso vc decida se divorciar antes de completar os dois anos, nao tenha um trabalho ou recursos comprovados para poder permanecer no país, vc deverá regressar ao Brasil. Quanto aos filhos, funciona como em qualquer lugar: o juiz irá decidir com quem a criança ficará caso o casal nao esteja de acordo. A lei Mexicana é super tranquila neste ponto, Ella. Estando com a documentaçao em dia com a imigraçao, os estrangeiros tem os mesmos direitos que os Mexicanos. Espero ter ajudado. Qualquer coisa, é só entrar em contato. Boa sorte!! 🙂
Olá Fernanda, pesquisando sobre casamento no México me deparei com esta página e gostaria muito que você, se for possível, me ajudasse com algumas informações sobre o ritual casamento no México. Muito obrigada.
Olá Fernanda,
Tudo bem?
Meu namorado é mexicano e vou morar com ele próximo ano na Cidade do México, estou com muitas dúvidas referente ao casamento inter-cultural.
Como por exemplo documentação. Tentei o consulado porém me parece bem confuso e eles não prestam tanto auxilio.
Poderia me ajudar com sua experiência?
Obrigada,
SAMIRA
sa_nalesso@hotmail.com
olá,adorei seu texto. Mas tenho uma dúvida e se puder me ajudar ficarei agradecida. Quero me casar com um mexicano na cidade do México, Quais os documentos que precisa e como e os trâmites para o casamento civil.
Desde já agradeço
kamilla_souzza@hotmail.com
(41)999004551 whats
Oi minha linda. Necessito da sua ajuda urgente! Eu quero me casar no México com um mexicano. O que eu devo fazer? Saber as documentações necessárias, visto, etc. Estarei deixando meu contato.
E-mail: tertulinaviviane@yahoo.com.br
Ficarei muitíssimo grata! Beijos e até mais!
Olá Viviane!
A Fernanda Moura parou de colaborar conosco, mas temos outras colunistas no México.
Você pode entrar em contato com elas deixando um comentário em um dos textos publicados mais recentemente no site.
Obrigada,
Edição BPM.