A pessoa sai do Brasil, mas o Brasil não sai da pessoa. Já tinha ouvido falar bastante sobre esse patriotismo que nasce ainda mais forte quando se mora fora. Especialmente se os motivos que levaram à mudança não estão relacionados com um desgosto pela pátria mãe, já que nesse caso, a pessoa costuma criticar ainda mais o país de onde veio.
Como eu vim por uma história de amor (somado ao fato de ter laços familiares tanto pelo lado de minha mãe quanto de meu pai), meu coração sempre está dividido: por um lado o futuro, a estabilidade financeira e amorosa que tenho aqui no Chile, por outro o passado, o amor pela cultura e pelas terras tupiniquins.
No entanto, como eu vim por vontade própria, sem pressões nem mesmo do (na época) namorado, que se ofereceu a mudar-se para o Brasil caso eu não quisesse vir para cá, desde o começo tentei fazer deste país o meu lar.
Não vou mentir, no meu caso, o processo foi longo, dolorido e cheio de maus momentos, mesmo tendo família chilena – aliás, meu primeiro texto aqui no BPM fala um pouco sobre isso. Mas é possível chegar a um equilíbrio no qual você mantém a sua essência brasileira sem deixar que cada pequeno detalhe negativo te estresse o tempo todo. É preciso ter muita paciência e autocrítica, sempre lembrando que o contexto histórico, social e até geográfico é completamente diferente ao nosso e que os chilenos estão em seu ambiente natural e, portanto, não precisam mudar seu jeito de ser pra se adaptar: essa é SUA necessidade.
Levando tudo isso em consideração, ainda há muitas coisas com as quais não consigo me acostumar aqui no Chile e que não têm (necessariamente) relação com o comportamento social. Por exemplo, o mar! Como sinto falta de ir à praia e sentir desejo de entrar no mar e ficar um bom tempo nadando na água salgada e pulando ondas sem sentir um frio extremo que chega a doer os ossos! O Pacífico é mais imponente que o Atlântico, mais ruidoso e com ondas e correntes marítimas mais fortes – e também muito, mas muito mais gelado! Aqui tem várias praias que são boas para prática de esportes como o surfe mas sinceramente, não sei como aguentam!
E falando de litoral, eu nunca fui uma sereia magrinha, mas minha autoestima supera meus quilos e continuo a não ter nenhum problema em usar biquíni mesmo sabendo que por aqui os olhares de críticas superam todos os que senti no Brasil. Só que depois de passar várias temporadas sem voltar à minha terra natal, precisei renovar os trajes de banho e não consegui. Afinal, a genética chilena já me fez uma pobre “desbundada” por natureza – se usar os biquínis daqui vou parecer uma velhinha! O estilo usado por estas terras é o americano, aquele que cobre todo o bumbum e quando molha dá aquela impressão visual e sensação de “fralda cheia” que nenhuma mulher no mundo merece! Com as calcinhas também sofro: já vêm com a “bunda caída” incorporada no corte, ou são fio dental.
Sapatos também são um conto à parte, e nesse quesito incluo os homens porque ao menos meu marido chileno também prefere a confecção e variedade de modelos brasileira. No começo era difícil achar sapatos bonitos e confortáveis, na maioria das vezes você deveria optar por uma das duas coisas. O caso é tão normal por aqui que já ouvi pessoas na sapataria dizendo: “adorei o sapato! É só colocar um curativo aqui e ali pra não sair bolhas e fica perfeito!”.
Hoje em dia até se encontram sapatos de mulher bonitos e confortáveis, mas dificilmente estes são baratos (e a maioria é de marcas brasileiras). No caso dos homens, até que se encontram sapatos confortáveis de marcas chilenas, mas os modelos são sempre os mesmos e bem tradicionais. Os mais vaidosos ou que curtem uma novidade são os que sofrem um pouco mais para achar mais variedade.
Roupas de festa vão ser assunto novamente quando falar sobre a moda chilena, mas já adianto que é bom procurar com antecipação quando precisar de um modelito para um evento mais formal.
Verão seco e inverno chuvoso também são novidades para uma paulista acostumada à transpiração exagerada e tempestades de verão (em tempos onde só se ouvia falar de seca no sertão nordestino) e dias frios intercalados com fins de semana de praia.
Mas como disse no começo, temos que achar um equilíbrio e há uma série de coisas que compensam esses “pequenos problemas”. Aproveitar cada espaço verde pra tirar uma soneca ou ficar à toa lendo um livro são costumes chilenos que eu incorporei sem problemas.
O pôr do sol no mar, em contrapartida ao fenômeno que vemos no Brasil, é um espetáculo à parte, que rende fotos maravilhosas e sensações indescritíveis. Além disso, vivemos o espetáculo de ter luz solar até quase nove horas da noite durante o verão!
E assim vivemos o dia a dia num país que não é o nosso de nascimento e sim, por opção. Muitos dizem que o amor é cego, mas não é a mesma coisa quando falamos do país em que vivemos. Podemos enxergar o que há de errado, sem necessariamente sermos mal agradecidos ou preferirmos mudar de país; o importante é que no balanço final existam mais prós do que contras. O que importa é fazer com que nossa vida seja agradável onde quer que decidamos viver, sempre lembrando e valorizando o lugar de onde viemos, porque o presente nada mais é do que o encontro entre o passado e o futuro.
25 Comments
Adorei o texto e concordo com tudo e compartilho dos mesmos sofrimentos, principalmente com as calcinhas e sapatos, rsrsrs. Parabéns!
Que bom que gostou, Rosi. Acho importante o pessoal perceber que temos o direito a nao gostar de certas coisas mas isso nao quer dizer que nao gostamos de morar aqui, né??? Se acostumar a fazer compras femeninas foi sofrido!! Um beijo!!
Minha família também se mudou pro Chile (meus pais e os três irmãos mais velhos nascemos aqui e dois irmãos mais novos bo Brasil). A adaptação foi muito penosa. Dois não aguentaram e foram embora; um jurou jamais botar os pés aqui de novo. Eu mesmo estou indo embora; não é fácil gostar do Chile.
Sanfous, acontece! Cada pessoa tem uma adaptacao diferente e nem sempre dá certo. Meus pais sao chilenos mas já se consideram mais brasileiros do que muitos dos que nasceram por lá!! Abracos e boa sorte no regresso!
Tudo bem, Joy…!!! Póis é, ser migrante não é uma condição atual. A história universal e nacional (seja ela chilena ou brasileira, para o nosso caso) têm registrado inúmeras e inúmeras vivências das pessoas que têm feito movimentos/transferências, mudanças de: uma casa para outra; de um bairro para outro; de um município para outro; de uma região para outra; de um país para outro, etc. É, enfim, uma necessidade própria do ser humano. Em geral, a migração ocorre por iniciativa pessoal, pela busca de melhores condições de vida e de trabalho por parte dos que imigram, ou ainda para fugir de perseguições ou discriminações por motivos religiosos ou políticos. Esse processo também pode ser incentivada por governos de países que queiram aumentar o tamanho e/ou a qualificação de sua população.
Com tudo isso, também aparecem vantagens e desvantagens. Por exemplo, imigração beneficia os países, os de origem e os de destino. Por outro lado, os medos de que os que chegam ao novo país roubem postos de trabalho ou façam baixar os salários não passam disso mesmo, de receios. Pelo contrário, os imigrantes fazem subir a procura de bens e serviços, contribuem para o aumento do produto interno bruto e para os cofres do Estado, mais do que aquilo que recebem de retorno, Os emigrantes residentes no estrangeiro são ainda “grandes investidores” nos seus países. Mas há perdas associadas à emigração, como a “fuga de cérebros”, em casos bem específicos (o que não é o nosso caso). A requalificação de mão-de-obra, maior competitividade no tocante à própria reestruturação da mão-de-obra e o descongestionamento da relação procura/oferta é um dos fenômenos que produz a imigração. Isso é bom para o país que recebe. As desvantagens são a perda mão-de-obra qualificada, produtividade mais reduzida, ainda que com qualidade.
Assim, para entender mais ainda os efeitos da migração é necessário o seguinte: “…para lidar com os desafios de mudanças nosso tempo, precisamos aprender a deslocar o modo como prestamos atenção, a estrutura de campo de nossa atenção. O modo como prestamos atenção – o lugar do qual estamos – é o ponto cego em todos os níveis de uma sociedade.” Então, a parte emotiva é a que devemos trabalhar quando emigramos. Não é nada fácil, mas também, não é impossível. O que significa, em termos psicológicos, o abandono da terra natal? O abandono do cenário, da geografia, da paisagem na qual a alma se reflete, na qual a alma se espelha ou é projetada?
A alma humana projeta-se nos lagos, nas montanhas, no clima, na cara das outras pessoas, na língua falada, na comida, nos túmulos, nas ruas, nas esquinas. Ela se projeta nas histórias, na música, nas tradições, como imagem familiarmente reconhecida num imperceptível espelho duplo. A alma é projetada e reconhecida nessas coisas, que, por sua vez, a conformam e lhe conferem uma identidade temporariamente estável e não contraditória. Aí está o que reclamamos. A falta desses sentimentos perdidos, é a falta disso tudo. Nós, os migrantes, somos corajosos. E como disse, é difícil trabalhar com emoção, quando essa se sobrepõe a princípios ou regras rígidas de conduta de pessoas de um outro país. Talvez o aspecto mais oculto dos processos migratórios , em geral, é exatamente porque não se encontra registro em nada, a não ser na vaga teia de construções sentimentais dos descendentes (se tivermos), seja a possibilidade de que conjunturas históricas propiciadoras de separações nos gerar sentido.
O Chile deve muito aprender mais coisas para ser um bom país, Está crescendo, está se desenvolvendo, mas, como todo país pequeno e poucos recursos, com algo de dificuldade. Normal para qualquer nação que quer o melhor para sua população.
Portanto, aproveite sua vida aqui, cuide a sua família que formou, e curta a nova família que a recebeu.
Tudo de bom para você…!!!
Patricio, Obrigada pelo seu comentário tao completo. Há muitas áreas envolvidas no processo de adaptacao: desde psicologia e sociologia até gastronomia e religiao. O importante é aceitar o processo e vivê-lo com positividade (o máximo que se puder)…. Um abraco e obrigada novamente pelo comentário.
Oi Joy!
Sinto as mesmas coisas enquanto me preparo para casar e sair do Brasil (mais precisamente Niterói – RJ) ano que vem. Vou morar na Áustria com o futuro marido, que é austríaco, e estou à caça de pontos positivos nisso. Por mais que por aqui as cosias sejam difíceis de funcionar como deveriam, tudo nos é comum e conhecido… sem contar a possibilidade de nos expressarmos em português… como senti falta disso quando passei 40 dias na Áustria, no (nosso) último verão! A língua é uma grande barreira emocional pra mim, apesar de estar aprendendo alemão…
Obrigada pelo post, por compartilharas dificuldades de largar país, família e costumes.
Raquel, aceite que vao haver coisas que você NUNCA vai gostar e procure um equilíbrio com as coisas que você gosta. Descubra novos hobbies, procure amigas que tenham gostos em comum…. precisamos de vida social com pessoas positivas e que vivem o processo de forma saudável pra ficarmos nos trilhos e viver com mais leveza e alegria.
Beijos e boa sorte na sua adaptacao!
Fomos a Santiago apenas uma vez, mas estamos ansiosos para lá voltar. Conhecemos 0.1% de Santiago, onde tenho irmã e sobrinhos. País lindo, limpo, organizado, ao menos foi a impressão que deu, achamo-lo lindo e temos saudades de lá. Voltaremos.
Ademar, será sempre bem-vindo por aqui. O Chile recebe muito bem aos seus turistas!! Abracos!
Muito lindo amei e até senti o frio da água gelada do pacifico ( que de pacifico só tem o nome) esse lance dos dias serem tao longos e bem bacana também , agora a roupa intima e os sapatos e conto aparte , são bem feiosinhos ,kkkkk
March, sua linda!! Vou te jogar no mar quando vc vier pra cá de novo, tá??? Um beijo!!! Te amo!
Oi Joy, como alguns penso em ir morar em Santiago, porem casada com um chileno. Minha maior preocupação é em trabalhar, será que contratam sem muitas dificuldades? Sou terapeuta ocupacional, mas trabalhando em qualquer coisa já seria bom para mim. Obrigada
Valéria, contrato somente depois do RUT em maos. Nao é impossível sem ele, mas está cada vez mais difícil. Empresas sérias ultimamente só estao querendo contratar estrangeiros que já tem o visto definitivo. Pesquise bastante nos sites de busca de emprego pra ter uma ideia dos valores dos salários nas diferentes áreas. Abracos e boa sorte!
Olá Joy, aproveitando a pergunta da Valéria… Quando nos casamos com um chileno, temos esse visto definitivo?
Que post mais chauvinista, típico de brasileiro no exterior. Mas se a idiossincrasia dos chilenos fosse outra; não seriam chilenos e se as praias fossem mornas e as calcinhas ou sapatos fossem tão lindos como no Brasil, já não estariamos aqui e sim no Brasil. Mas como não estamos é dever nosso nos acostumar e tentar resgatar o que ha de melhor aqui, que com certeza são tantas coisas como as de lá.
Alem de tudo o anterior não estamos aquí a força e hoje em día é tão facil conseguir produtos do Brasil em qualquer loja ou site de internet, e por ultimo uma viagem ao Brasil de vez em quando para carregar as pilhas e matar as saudades de tudo aquilo que nos faz falta não é tão dificil e sai bastante mais barata que do Brasil para acá.
Oi, Adriana. Obrigada por deixar teu comentário. Mas te convido a reler a parte final do texto, onde deixo claro que são questões menores que não interferem em meu gosto por morar aqui. Acho que você não compreendeu completamente a intenção do post, que foi dizer que podemos criticar, sem esquecer justamente o que vc diz. Não estamos aqui à força e este,é o país deles, portanto têm todo o direito de se comportar e viver como quiserem. Somos nós quem temos que nos adaptar. Espero que numa segunda leitura do texto isso fique claro. Abraços.
Estou há pouco mais de um mês e sim, estou com dificuldades para me acostumar a moda chilena stand dos sapatos quanto das roupas, sei q o clima também será complicado pra mim q venho do Rio, mas em geral tenho me adaptado bem a cidade, gosto de Santiago apesar de infelizmente ainda ñ ter amigas. Uma coisa que eu gostaria de comentar, ñ sei se é impressão minha, mas as mulheres daqui me parecem um pouco agressivas na maneira de agir com as pessoas, ñ sei se agressiva é bem a palavra, mas o tom de voz , a maneira de agir principalmente com estranhos é muito grosseira, creio falta um pouco de gentileza, parece q querem sempre mostrar q são mais, ou q são superiores… será q é impressão minha?
Oi, Rafaela, tem de tudo por aqui. Dependendo da geração à que você se refere, há diferentes explicações pro comportamente feminino aqui no Chile. Tem algumas que estudaram em colégios muitos estritos, extremamente católicos e/ou só de mulheres e quando elas saem da escola acabam perdendo um pouco da postura “menininha”, outras que são de pensamentos mais feministas e querem se igualar aos homens na maior quantidade de aspectos possíveis, algumas acabam se cansando do excesso de machismo da sociedade chilena e ficam mais “cascudas” e desconfiadas…. mas são boas amigas quando damos a oportunidade e abrimos um pouco a mente…. Boa sorte e abrace a sociedade em que você está vivendo!!!
Quanta lorota fica ate parecendo que o Chile é um paraiso.
Johaness, te recomendo voltar a ler alguns trechos do texto, já que metade das coisas que escrevi são críticas à algumas coisas que eu não gosto daqui. O Chile não é um paraíso e a esta altura de minha vida, percebo que essa é uma falácia, já que não há lugar perfeito, mas de todas formas, aqui é o lugar onde decidi fazer meu lar e para encontrar a qualidade de vida que eu quero, precisei fazer algumas mudanças internas, como agradecer mais e reclamar menos. Claro, o que eu não gosto, talvez seja uma coisa agradável para vc e vice-versa, e o seu conceito de “paraíso” nao é necessariamente o meu. Cada pessoa que mora aqui tem opiniões diferentes e estão em seu direito. Este é meu ponto de vista e nem todos tem que concordar. Te aconselho a ler meus demais textos para ver meu ponto de vista sobre outros assuntos aqui…. e fique à vontade para gostar ou não. Sempre com muito respeito. Abraços.
Joy, por acaso o noivo deste casamento se chama Askaan?
Nao, Andrea. Esse nao era o nome do noivo.
Joy, estou lendo seus posts e adorado.
Tenho lido e pesquisado tudo que posso para ir me preparando para o que vou encontrar por aí.
Chegaremos em junho em Santiago, meu marido aceitou uma proposta de emprego super boa por aí.
Já de cara identifiquei algumas coisas diferentes de mim e deus posts me da forças pra ver as coisas pelo lado positivo, e entender que chilenos são diferentes pela sua forma de vida, cultura e experiências!
Mas de pronto: sou super amável e educada, detesto frio ( Hahahahaha) e chegarei no alto inverno, não conheço a comida chilena (!!!!?) mas em todo lugar no mundo encontramos atro e legumes e frutas então estou tranquila kkkkkk, e já vou fazer meu estoque de calcinhas e sapatos pra levar do Brasil etc etc
Quem sabe quando estiver por aí tomamos um café!;)
Adoro seu blog e a forma positiva de encarar as coisas!
Compartilho da mesma visão e pensamentos que os seus!
Bjs
Oi Juliana, Nao queria te desanimar, mas parece que este ano vai fazer BASTANTE frio, a diferença do ano passado, que fez frio, mas ainda haviam muitos dias de sol quentinho no meio. A forma positiva de ver as coisas foi a base de muito sofrimento, porque na época que eu vim nao havia nenhum blog, nem pessoas nas redes sociais para apoiar e compartilhar pontos de vista de uma maneira a nos fazer sentir mais seguros das mudanças. Fora que inclusive achar produtos similares aos que consumimos no Brasil era tarefa difícil… agora está tudo mais fácil.
E fico feliz em ajudar quem pensa em vir para cá….
Um abraço e excelente adaptaçao pra você e seu marido.