Como está sendo a pandemia em Berlim, na Alemanha.
Escrevo este texto no dia 8 de maio, uma sexta-feira, e feriado apenas em Berlim. São 75 anos do fim da II Guerra Mundial, um conflito que deixou muitas cicatrizes e consequências para o país que conseguiu se reorganizar e se reerguer após alguns períodos de recessão, divisões e muito sofrimento. 75 anos que deveriam ser celebrados hoje em grande estilo, para comemorar mais uma vez o fim da maior guerra dos tempos modernos e provavelmente a mais devastadora de todas. Mas esse dia está sendo celebrado apenas virtualmente e em silêncio, já que não há aglomerações nas ruas, palcos montados, discursos apresentados. Uma outra guerra está sem vencedores e perdedores, tomou a cidade, o país, o mundo.
No início do mês de março, eu recebia a notícia na minha empresa de que deveria começar a trabalhar de casa, por um período de duas semanas mais ou menos. E essas duas semanas foram se estendendo até que viraram dois meses, completados no próximo domingo, 10 de maio. O vírus havia chegado na Europa e o número de infectados estava aumentando. A situação na Itália já estava bem crítica e outros países europeus começaram a fechar suas fronteiras e comércio, cancelar eventos e as pessoas se fecharam em suas casas.
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Havia voltado do Brasil depois de uma curta viagem na segunda semana de fevereiro, e não pensei que em tão pouco tempo a vida viraria de cabeça pra baixo, do jeito que virou. Tantos planos desfeitos e toda a nossa comunicação, seja sobre trabalho, com a família ou amigos, morassem eles em Berlim ou não, se intensificou e passou pro mundo on-line. A situação na Alemanha, durante esses dois meses de quarentena, não foi tão ruim como a de países próximos, como a Itália, Espanha e França. Não tivemos restrições tão graves, sempre pudemos sair de casa, tomar um ar, caminhar, fazer compras do necessário, sempre mantendo a distância de 1,5 metros.
Desobediência das regras e manifestações
Pessoalmente, evitei sair nesse período, fazendo-o só quando necessário. A minha convivência “em carne e osso” foi apenas com meu parceiro, já que moramos juntos, e rejeitei convites de amigos para passeios em parques em dias ensolarados. O motivo principal era não saber se estava infectada, sem sintomas, e espalhar o vírus causando prejuízos ao sistema de saúde e a vida de outras pessoas. Mas além disso, mesmo com a ideia de manter a distância, não achei que seria justo com tantos espaços culturais, restaurantes, academias, e comércio fechados, tanta gente perdendo seus negócios e empregos, sair por aí como se nada estivesse acontecendo.
Por tudo isso, fiquei bem chateada ao sair, um dia, ainda no fim de março, para imprimir um documento perto de casa e ver muita gente na rua, inclusive em grupos e sentando bem perto umas das outras, e elas certamente não moravam em um mesmo apartamento. As regras, entre março e abril, diziam que só podíamos sair de casa com quem morávamos. Porém, tivemos muitos dias de sol nesse período, e houve registros pela imprensa e polícia de pessoas aglomeradas em parques, filas de sorvete e até em frente a bares, abertos apenas para serviços de entrega. Achei egoísta da parte dessas pessoas, por não tomarem os cuidados recomendados e continuarem com os hábitos de uma vida normal que já não estávamos vivendo; ou, pelo menos, aqueles que estavam seguindo as regras.
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Tivemos também manifestações, mais de uma, no centro de Berlim. Gente que não concordava com o fechamento e cancelamento do comércio e queria que tudo voltasse a abrir. Aí, parava para pensar – “Imagina se essas pessoas vivessem na Itália, na Espanha, na China…”. Tivemos, e ainda temos, um número bem alto de infectados na Alemanha, cerca de 170 mil, mas o número de mortes foi baixo em comparação com outros países. Não sei dizer exatamente, mas acredito que por esta razão as medidas aqui não foram tão dramáticas. Ainda assim, isso não deveria ser motivo de desrespeito das recomendações.
Volta aos poucos
Berlim não sofreu como outras cidades da Alemanha, especialmente no sul do país, que ainda devem manter restrições por um período mais prolongado, mas todo o país volta a respirar um pouco aliviado, e talvez confuso, por ver escolas abrindo e retomando suas aulas presenciais, lojas, shoppings, salões de beleza, museus e na próxima semana restaurantes, voltando a funcionar. Estamos confusos porque no fundo não sabemos o que vai acontecer, nada será como antes e certamente o futuro agora é mais incerto do que jamais foi. Mas temos esperanças de que pouco a pouco poderemos caminhar por aí, sem culpa, encontrar as pessoas que amamos e, quem sabe, celebrar novamente datas tão importantes como esse 8 de maio.