Da cerveja ao Lassi: Alemanha e Índia – Parte 1.
O ano de 2018 foi um ano muito maluco pra mim, maluco de bom, viajei muito, para lugares que eu nem sonhava e esperava. A Índia foi um deles.
Meu marido sempre quis viajar para lá. Eu sempre tive muito receio, tinha medo do desconhecido, lia muito sobre o quão chocante era o abismo cultural entre o ocidente e o oriente.
Já havia ido para a Indonésia, em 2015, o que foi uma experiência transformadora e maravilhosa. Depois de muita conversa e debates, resolvemos que estava na hora de conhecer essa lugar místico chamado Índia.
Como sabem, moro há 3 anos na Alemanha, já passei por duas cidades aqui: Hamburgo, no norte, e atualmente vivo em Berlim. O que eu não tinha pensado nem um pouco quando decidi ir para a Índia era que eu estaria saindo de um país super desenvolvido para um país extremamente subdesenvolvido em todos os aspectos.
Vou tentar ser precisa e resumir meus sentimentos, pois tudo que diz respeito a essa viagem e experiência, para mim, ainda soam muito latentes e fortes.
Viajamos em outubro de 2018. Ao todo foram 5 cidades em 18 dias, o que para Índia é pouco, pois é um país enorme, tenham isso em mente. Além do tamanho do país, é o segundo mais populoso do mundo com 1.3 bilhões de habitantes, só ficando atrás da China. Pois bem, lá fomos nós literalmente viajando para o desconhecido.
Tínhamos em mente fazer uma turismo bem mochileiro, ver a Índia real. Compramos nossas passagens de Berlim para Nova Delhi e, dentro da Índia, somente viagens de trem entre as cidades. Isso contaria com viagens de 4h ou de 23h, como foi o caso do trecho Varanasi para Jaipur.
Chegamos em Nova Delhi e, de cara, já nos deparamos com a doideira que é a Índia. Muitos carros, barulho de buzina ensurdecedor, tuk tuks por todos os lados (aqueles carrinhos pequenos que levam somente duas pessoas), vacas, cachorros, pessoas, muitas pessoas.
Nova Delhi foi, de cara, uma loucura necessária. Ficamos chocados, mas maravilhados também, como pode existir um pais no mesmo planeta que a gente vive, mas tão, tão diferente em todos os aspectos?
Ficamos hospedados em um hostel bem no meio de Old Delhi (a parte antiga da cidade), no meio de uma rua de bazar, que é uma insanidade. Eu, bem inocente, achei que iria chegar e conseguir visitar as “lojinhas”, fazer muitas compras, pois amo as roupas e tudo de lá, mas não consegui. Não nos primeiros dias.
Era muita gritaria. Os comerciantes quase te puxam para dentro das lojas, começam a negociar preços antes mesmo de você perguntar. A gente nem conseguiu relaxar para fazer uma comprinhas. Mas tudo bem, essa era a primeira parada, ainda haveria muitas outras cidades pela frente.
Sobre as roupas, uma coisa que havia lido antes de ir e que fui bem preparada era sobre como se vestir na Índia. Sempre usar calças, cuidar os braços e ombros destapados, não usar nada apertado ou curto. Eu, que gosto muito de roupas confortáveis, achei que estaria bem tranquila. Levei minhas calças largas e camisetas, mas mesmo assim tive que comprar roupas mais apropriadas lá, porque infelizmente os homens indianos olham e muito para nós, mulheres ocidentais. Isso não é só porque somos muito diferentes fisicamente, mas porque a Índia ainda é um país extremamente machista e trata as mulheres como seres inferiores. Eu vivi isso na pele.
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Sempre que viajo para lugares com a cultura tão diferente, religiões diferentes, considero que o mínimo que posso fazer é me adequar, nunca impor minha cultura para eles. Afinal, sou eu que estou “invadindo” o país deles e não ao contrário. Pois bem, eu fui na super humildade, respeitando a cultura deles, mas mesmo assim, me senti MUITO desconfortável em alguns momentos com tantos “olhares.” Não eram só olhares para o desconhecido, mas olhares maliciosos, olhares que me deixavam mal, por ser mulher.
Tá aí a primeira diferença gritante que senti lá: como é fácil ser mulher na Alemanha e como é difícil ser mulher na Índia. Nunca pensei que sentiria isso em pleno 2018.
A gente sabe que o Brasil é um país machista e, infelizmente, um dos países que mais mata mulheres por feminicídio do MUNDO (esse é um dado que me dói na alma) e que, mesmo a Alemanha, tão desenvolvida, também tem seus casos de machismo e violência contra a mulher. Mas na Índia, talvez por eu esperar ser um país tão místico, que tem a religião Hindu como a maior e mais praticada, que acredita em karma, dharma (aqui um resumo pra quem não sabem o que significa), eu esperava ver seres mais bondosos, quase seres de luz andando pela ruas, homens meditando, pessoas mais espiritualmente desenvolvidas.
Acho que eu idealizei uma Índia mística, que existe, não pensem que não, mas esqueci de pensar que, no fundo, e na sua maioria, ela é tomada por seres humanos, que lutam para sobreviver diariamente. Muitas vezes, essas pessoas não tiveram nem vão ter estudos, uma desigualdade social gigantesca, uma pobreza absurda e tudo que um país subdesenvolvido tem, assim como o patriarcado e a cultura do machismo tão latente e presente.
De cara eu tentei ignorar isso, seguia sendo eu, respeitado eles, mas não deixando me levar por esse sentimento de “inferioridade” que eu sentia cada vez que um homem vinha falar com meu marido e nem olhava pra mim. Ou se olhava, era pra me “comer” com olhos. Triste, me dava raiva, mas eu seguia absorvendo tudo, pois viajar também é deparar-se com situações que nos fazem pensar e refletir. E, muitas vezes, nos fazem valorizar ainda mais o lugar onde moramos, no meu caso, a Alemanha.
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Pois bem, saímos de Delhi e seguimos viagem para Agra, a cidade tão famosa e conhecida por abrigar o Taj Mahal. Nossa primeira viagem de trem.
A viagem era para durar 4h, mas demoramos 10h. Ficamos na segunda classe do trem, o que era para ser “confortável”, mas foi uma loucura.
Nessa viagem me deparei com outra diferença absurda, que nem sei se dá para comparar: a bagunça. Mesmo quem estava na primeira classe ou quem tava na quinta classe (sim, existe até a classe 6 lá), todos esperamos 10h dentro do trem, sem ter o que fazer e nem saber o porquê de ter atrasado, simplesmente aceitamos. Imagina isso aqui na Alemanha, nem sei, acho que o povo surtaria (risos).
Apenas para salientar que, comparar Índia e a Alemanha é até “sem noção” da minha parte, pois são países completamente distintos, com culturas, pessoas, religiões e histórias tão diferentes que pode soar ridículo da minha parte, mas sigam comigo, prometo explicar mais o porquê de tal comparação no final do texto.
Continua no próximo mês…