Dificuldades de adaptação na Grécia.
A primeira vez que eu pisei na Grécia já foi para morar. Isso mesmo, quando resolvemos mudar para cá, tomamos a decisão quase de “olhos fechados”.
Meu marido já tinha estado aqui outras duas vezes a trabalho por períodos muito curtos, mas eu mesma nunca havia visitado nenhuma cidade grega. Ou seja, gostando dele ou não, adotamos esse país ainda totalmente desconhecido para ser a nossa casa.
Por sorte e também por muita vontade de fazer essa mudança dar certo, estamos conseguindo gostar daqui mais do que desgostar. Ter uma mente aberta e um olhar otimista sobre toda e qualquer experiência ajuda muito no período de adaptação.
Mas nem tudo são flores e, sem dúvidas, existem dificuldades no processo de transição de um país para o outro. Principalmente, na transição de uma cultura para outra.
Já comentei no artigo “5 hábitos curiosos sobre os gregos” sobre alguns comportamentos deles que me chamam a atenção e que, aos poucos eu vou me acostumando. Esses hábitos estão longe de representarem problemas de adaptação. São apenas costumes interessantes e que eu, particularmente, adoro observar e conhecer.
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Mas, ao longo desse último ano que estamos aqui, vivemos situações que nos deixam frente a frente com questões fundamentais da cultura grega, que atrapalham bastante a adaptação. E é sobre essas situações que vou escrever hoje.
Falando grego, literalmente
A primeira grande dificuldade está, sem dúvidas, no idioma grego. Além de ser a maior de todas, ela é realmente a primeira barreira encontrada. Basta chegar no aeroporto para levar aquele susto! De cara, não dá para entender nada do alfabeto grego. Aliás, alfabeto é uma palavra grega, sabia?!
No aeroporto, estações de metrô e placas de trânsito, ainda é possível ver os sinais também em inglês, mas na cidade, na vida real, nadinha. É tudo com aquelas letrinhas que não temos nenhuma familiaridade.
Óbvio que já sabíamos dessa dificuldade quando estávamos para mudar, mas é totalmente diferente quando aterrissamos aqui para morar. Acho que o fato de nunca ter estado no país antes, ajudou para aumentar o choque. Eu achei que o inglês fosse mais falado no dia a dia do que realmente é.
Fora a exposição à língua escrita, que me deu a exata noção do que é ser analfabeta, a língua falada também é um problema. Não exatamente por ser difícil. Na verdade, é bem mais fácil falar – já que a pronúncia é bem parecida com o português – do que ler.
A questão é exatamente essa! Por lembrar a pronúncia do português, nós brasileiros até “enganamos” bem na língua grega e aí, bastou falar “kalimera” (“bom dia”, em grego), que o grego já acha que ou eu sou grega ou eu falo grego super fluentemente e desanda a conversar comigo.
Sério, eles não entendem que só sabemos falar aquelas palavras básicas, como “obrigada”, “por favor” e “boa noite” por simpatia e educação. Eles têm certeza que a gente fala grego e está escondendo o jogo. Não sei dizer a quantidade de situações embaraçosas que já passei por conta disso.
Por causa da língua grega ainda, já passamos por outras poucas e boas. Sabia que aqui os apartamentos dos edifícios residenciais não têm número? Temos que identificar a campainha do interfone pelo nome do morador, que está escrito todo em grego, claro. Já dá para imaginar que apertei muita campainha errada até encontrar o apartamento certo.
Ainda a ver um pouco com o idioma é a questão dos sobrenomes de família. Aqui na Grécia, o comum é o indivíduo carregar apenas um sobrenome, o de origem paterna. Não existe nada similar com a cultura latina de registrar dois, três ou quatro sobrenomes.
Imagine só o que é chegar então em uma agência de banco para abrir uma conta. Ou para tirar um documento local onde ninguém fala inglês. Precisamos apresentar os nossos documentos, documentos dos pais, certidão de casamento com nome de solteira e nome de casada, cada nome com pelo menos três sobrenomes ou nomes compostos… já deu para visualizar o problema?
Eles não conseguem processar a quantidade de sobrenomes que temos. Impossível! Acho que nem o sistema dos computadores deles tem campo suficiente para todos os sobrenomes. Nem no banco, nem em nenhuma repartição pública, eles entendem a construção dos nossos nomes completos.
Parece uma bobagem, mas já tivemos problemas e muito tempo perdido por conta disso. E no final, quando conseguimos resolver o que precisamos, ainda temos que nos acostumar com nossos novos nomes, que ganharam hífen para todo lado para poder consolidar os nomes do meio em um só.
A última vez que precisei tirar um documento, eu literalmente parei o posto de atendimento. Todos os atendentes se envolveram com o meu problema e meu enorme sobrenome. Tenho certeza que virei persona-non-grata na hora!
Passando para os hábitos culturais que mais dificultaram nossa adaptação, ressalto especialmente dois deles que levaram um tempo para nos acostumarmos.
Almoço ou jantar?
Apesar de começarem o dia cedo, como nós brasileiros, os gregos costumam almoçar muito tarde, por volta das 16h. Isso acontece todo dia, não só aos finais de semana. Não canso de ver os restaurantes cheios por volta das 17h e me perguntar: estão almoçando ou jantando?
Nesse aspecto, meu marido teve ainda mais problemas, por estar no escritório. Logo que chegou aqui, ele sempre chamava a galera do trabalho para almoçar por volta de 13h e não tinha nenhuma aderência.
Esse é horário do “lanche da manhã” e não do almoço. Levou um tempo para ele se acostumar, tomar um café da manhã mais reforçado e aguentar esperar o fim da tarde para almoçar e socializar.
Tem um lado bom nisso que é o fato dos restaurantes estarem abertos praticamente o dia inteiro, diferente da maioria dos países europeus, onde fecham para a “siesta”. Além disso, se bater aquela fome cedo, é possível encontrar os lugares mais requisitados ainda vazios, pois a maioria abre às 13h e só vai lotar no final da tarde.
Nunca aos domingos
Agora, se quiser fazer um almoço em casa no final de semana, não deixe para comprar nada aos domingos. Nenhum comércio abre nesse dia da semana. Esse é o segundo aspecto cultural que levamos tempo para adaptar.
Não são apenas supermercados e comércios de rua que ficam fechados. Shopping centers e até farmácias não funcionam aos domingos. Apenas restaurantes, cafés e uma farmácia por bairro estarão abertos. No mais, a cidade fica totalmente morta! Existem apenas alguns domingos no ano, que, por lei, os estabelecimentos podem funcionar. E ficam lotados.
No início da nossa vida aqui, ficamos muito perdidos em relação a isso. Fazíamos planejamentos de final de semana e só depois lembrávamos que nada funcionava. Tivemos que reaprender a viver o domingo, pois passa a ser um dia realmente inútil no sentido de resolver alguma coisa ou fazer aquela compra de última hora.
Dificuldades para se adaptar a uma nova cultura sempre vão existir. Acho que, não importa o tempo que viverei aqui, sempre serei estrangeira. Sejam grandes ou pequenas, essas dificuldades me tiram da zona de conforto e me colocam de cara com um mundo diverso e rico, exatamente como eu queria.
2 Comments
Adorei! Sem condições nenhuma de esperar 17h pra almoçar, não tenho estruturas pra ser grega. Rsrs
Oi Cyntia! Difícil, né? Haja lanchinho durante o dia pra acompanhar o ritmo do povo aqui.