A Suécia é um país onde a área de serviços é pouco desenvolvida em comparação a muitos outros países. Mesmo com uma renda per capita de quase 50 mil dólares (fonte: IMF 2015), o sueco tem um consumo relativamente baixo no setor de serviços. O que quer dizer isso? Quer dizer que o sueco contrata poucos serviços como lavanderia, jardinagem, limpeza, etc. Muitas dessas atividades, o sueco tende a fazer ele mesmo. Embora isso venha mudando, principalmente em áreas urbanas, nota-se que ainda vale para muitos.
É comum o brasileiro pagar por serviços domésticos como lavagem de roupas e limpeza. Se tem uma casa com jardim, contrata um jardineiro. Se vai pintar uma parede, contrata um pintor. Manda lavar o carro. É claro que há diferenças entre regiões e grupos de renda, mas digamos que seja essa a atitude normal da classe média. A diferença de renda no Brasil permite que a classe média pague por vários serviços domésticos a preços relativamente baixos. Certamente, a regulamentação trabalhista vem encarecendo o custo de vida, mas historicamente tem havido tanto oferta de mão de obra, como procura para tais serviços. No Brasil, muitas pessoas com pouca formação profissional, geram renda prestando serviços domésticos de vários tipos.
A Suécia perseguiu uma forte política de distribuição de renda a partir da década de 30. Isso resultou num grande desenvolvimento do país como um todo. Ao mesmo tempo, limitou a renda disponível para contratação de serviços domésticos já que sobre esses incidiam os mesmos encargos tributários aplicados às empresas contratantes. Ideologicamente, os sociais democratas, que dominaram a arena política por muitas décadas, sempre associaram a contratação de serviços domésticos à desigualdade de classes. Relutaram por muito tempo em aceitar a demanda do serviço doméstico, argumentando que isso seria um retrocesso social e que sedimentaria a diferença de classes. Isso explica porque demorou tanto para que esses serviços voltassem a ser socialmente aceitos no país.
Há aproximadamente uma década, existe um incentivo para a contratação de diversos serviços no contexto domiciliar, seja para reparações nas casas, jardinagem ou limpeza. Esse incentivo se dá na forma de um desconto do custo do serviço no imposto de renda do indivíduo contratante, até uma quantia máxima. O incentivo fiscal continua sendo motivo de muita discussão entre os políticos e, consequentemente, é alvo de mudanças tanto no que diz respeito ao tipo de serviços contemplados, como na idade do usuário que pode se beneficiar dele, e no valor máximo para a redução do imposto. O principal argumento a favor é a criação de empregos, principalmente em áreas de baixa qualificação. E o principal argumento contra é que o incentivo tende a privilegiar indivíduos de renda mais alta que podem consumir mais serviços.
Ao lado dessa discussão ideológica, existe a atitude ou costume do sueco de fazer ele mesmo várias tarefas que poderiam ser compradas em forma de serviços. Limpar o que sujou é ensinado nas escolas juntamente com o compromisso de preservar o espaço coletivo. Na primavera, as crianças pequenas saem pelos parques e florestas juntando o lixo que encontram. Chegam a competir entre as escolas para ver quem junta mais lixo. Infelizmente, também aqui há aqueles que ainda jogam lixo na natureza. Mas não desistimos de ensinar as crianças para que não façam o mesmo.
Muita gente já ouviu falar da IKEA, uma empresa sueca que atua principalmente no comércio de móveis e decoração. A IKEA é hoje uma empresa internacional operando em 40 países. A fortuna do seu fundador, Ingvar Kamprad, foi recentemente calculada em aproximadamente 44 bilhões de dólares (segundo a Bloomberg). Durante os anos 40 e 50, o empresário Kamprad iniciou as atividades que aos poucos levaram à criação do conceito das lojas IKEA. Essas se espalharam pelo mundo a partir da década de 80, resultando em um grande império. Mais do que vender móveis e objetos de decoração, o grupo IKEA foi rápido em criar soluções práticas e acessíveis para a grande massa da população cada vez mais urbanizada. Partiu da realidade e estilo de vida sueco, e sempre usou isso em seu marketing.
A filosofia que gerou o modelo de negócio da IKEA está ligada à essa característica social típica do sueco – a ideia de resolver ele mesmo seus problemas do dia a dia. Na IKEA compra-se de tudo em pacotes que você pode montar em sua casa. A mercadoria, você mesmo busca nas prateleiras da loja e transporta para sua casa. A montagem é simples e pedagogicamente explicada. Qualquer ferramenta necessária para a montagem vem no pacote. Qualquer pessoa com capacidade de leitura e entendimento razoável consegue montar um armário, uma cadeira ou mesa. Em poucas horas você pode montar todo o seu apartamento.
A demanda material cresceu com o aumento do poder aquisitivo e a urbanização, mas a ideia de se ocupar com os afazeres domésticos ou outros serviços, mantém-se viva na sociedade sueca. A despeito do incentivo fiscal, muitos escolhem cuidar eles mesmos das suas demandas por serviços dos mais variados tipos. Isso faz com que as empresas ofereçam produtos focados na praticidade. A idéia é resolver problemas de forma simples e prática.
Depois que você entra nesse contexto e começa também a fazer várias coisas você mesmo, percebe os benefícios. Trabalhar no seu jardim e fazer a sua horta traz alegria e é um lazer maravilhoso. É incrível o quanto aprendi trabalhando no meu próprio jardim. Na primavera, você vê muitas pessoas cuidando dos seus barcos, pintando suas casas, reformando suas cozinhas.
Eu adquiri o costume de reformar móveis de madeira durante o verão. O trabalho com as mãos contrasta com o trabalho acadêmico que faço o ano inteiro. E me faz muito bem. Veja as cadeiras que pintei recentemente! A cozinha da casa de campo ganhou outra vida.
Experimente você também fazer algo diferente no seu entorno com suas próprias mãos, e depois me conte como se sentiu!