Em meio ao mês de fevereiro, no Japão, já começam a surgir as primeiras flores de Sakura (flores de cerejeira), essa árvore tem um significado muito grande para o japonês, pois eles esperam muito por esse momento em que se despede do inverno e se inicia a primavera, e com ela a Sakura floresce por todo o Japão.
Uma lenda conta que a palavra “Sakura” surgiu com a princesa Konohana Sakuya Hime, que caiu do céu perto do Monte Fuji, tendo se transformado nessa bonita flor. Também existe uma crença que o cultivo de arroz poderá ter originado a palavra, tendo em conta que “Kura” era o depósito onde esse alimento (visto por muitos japoneses como uma oferta divina) era guardado. E os japoneses esperam também para festejar o “Hanami” ou “apreciação das flores”. A florada dura em média três dias e os japoneses aproveitam esse período para ver as flores, fazer piquenique, dançar e cantar à sombra das árvores, como uma tradição oriental. (Informações obtidas no Portal Mie)
Eu vi os nativos comendo embaixo das árvores, tentei me informar e uma senhora me disse que se uma flor cair em seu “bento” (marmita), você terá muita prosperidade financeira ao longo do ano, pensei: Nossa, ano que vem, venho comer aqui!, aguardando ansiosamente pelo dia da florada.
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Além disso, o que me chama a atenção é que eles incluem as flores no cardápio também, essa eu descobri a duras penas, que é de uma bizarrice sem tamanho, mas, como não sou do tipo que critica sem experimentar, lá fui eu provar a novidade, tudo em tons de rosa… eu fazia alusão a rosas, morangos, “sabe de nada inocente”, o negócio tem gosto de sei la o que!
A primeira a ser provada foi a água com sabor de Sakura; tem gosto de água suja, com um odor de framboesa. Não satisfeita, fui no chá, bem que minha mãe sempre dizia, quando a cabeça não pensa, o corpo padece, ruim também; se ainda não bastasse ter tomado o pior chá do mundo, adquiri uma enxaqueca terrível, minha enxaqueca tem origem pela ingestão de alguns alimentos.
Passados alguns dias, pensei: Não há de ser tudo ruim. Fui em uma Kombine (loja de conveniência), tinha aquele refrigerante famoso (preto) – e, sim, sou fã número 1 desse veneno, sempre falo que se no céu tiver ele e pastel, passo a levar uma vida límpida de hoje em diante –, bom, voltando a falar da Sakura, o refrigerante continua preto e com um leve gosto de frutas vermelhas ou sei lá, não consegui definir que raios é aquilo até hoje, tomei dois goles e dei o resto pro ralo da pia, acho que ele se agradou, pois agora está funcionando direitinho, acabou a preguiça.
Ontem fui levar minha pet (dragão barbudo) Sara, no veterinário, e do lado o que é que tem? Sim, bingo pra quem acertou: a cafeteria com logo de uma sereia verde de duas caldas, muito “chiquetosa” essa, a mais bonita que já fui, toda em vidro em frente a um parque com um lago maravilhoso, e várias árvores de Sakura.
Peguei o cardápio sei lá porquê, sendo que eu sempre escolho o mesmo; bem, sei sim, porque a atendente foi muito gentil, e veio oferecê-lo ainda na fila – antes de dar um grunhido por ver a Sara no meu ombro; coitada, quase infartou ao ver uma prima distante de um lagarto, com cores lindas em tons de amarelo e laranja, toda espinhada, minha linda Sara Nishiura Chian.
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E depois de falar para a atendente com meu idioma meia boca: Te acalma, ela não faz nada, nem dente tem, e lá fora tem uma placa proibindo cachorro, ela é lagarto!, olhei o cardápio já sabendo que ia pedir o de sempre, cappuccino grande, mas, eis que vejo uma imagem celestial de uma linda bebida rosa, cerrei os olhos para ter certeza que não estava sonhando e para ler tudo escrito em Katakana (letra japonesa) e soltei, em alto e bom som, um: Não mano, tem café de Sakura!, a bicha é teimosa pra caramba, pedi um frappuccino de Sakura.
Paguei e me dirigi ao balcão que prepara, tá lá a moça que faz, põe uma geleia rosa com flores de Sakura no fundo do copo, eu jurava que era maçã pela foto, o leite meio congelado batido no liquidificador, e pra acabar de desgraçar com tudo, ela me salpica um troço rosa em cima do creme dos deuses mais conhecido como Chantilly. Não aguentei e perguntei: O que é esse baguio rosa? – mentira, não sei falar baguio, em japonês -, ela com a voz serena de quem está super acostumada a comer flor, fala: Sakura seca!!!
Olhei pra ela como eu olhava para minha mãe, quando ela vinha com aquela colher de Biotônico Fontoura com ovo de pata e leite condensado tudo batido, e falava: Toma que é pra você ficar forte, mas a tradução correta é: Toma que tu vai ficar uma bola quando crescer!; peguei o copo olhando ainda nos olhos dela profundamente, ela sorri e fala: Sugoku oishi (super gostoso), agradeci com vontade de falar igual ao seu Madruga do Chaves: Então toma tudo.
Sentei no banco mega confortável em frete à janela de vidro e tentei focar na vista. Com uma colher, afastei o farelo de flor do meu Chantilly, tomando cuidado pra não desperdiçá-lo, pura ilusão, tanto a flor em pó quanto a geleia já tinham empestado cada milímetro dos meus 500 ml de bebida, fiz uma cara de decepção para o marido, ele me solta: Por que você faz isso?, tirou o copo da minha mão e me passou o dele, que era o frappuccino de sempre, nada desses lançamentos nada a ver…
Bebemos e fomos lá ver a árvore de perto, lembrando que também tinha bolo decorado com a flor na vitrine, esse não me atrevi a pedir não, em algum momento da vida você tem que valorizar o seu dinheiro.
Conclusão disso tudo, flor é pra se olhar ou pra cair na sua marmita, pra te deixar rica.
Ainda aguardando muito ansiosa pela florada do parque, porque se é pra comer flor, que seja milionária.