Afinal, onde é a casa do expatriado?
O dilema que afeta todos os brasileiros que vivem no exterior ganhou força durante a pandemia.
Casa. Se tem um lugar que frequentamos assiduamente este ano foi justamente a nossa casa. Nestas explorações entre quatro paredes, todos nós descobrimos alguma coisa.
O prazer ao cozinhar um pão quentinho no forno; a alegria de mergulhar no mundo de um livro novo; a gratidão de ter uma varanda, mesmo a menor das sacadas já pode ser considerada um verdadeiro luxo em tempos de reclusão.
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Muitos de nós, inclusive chegaram a descobrir a existência do tédio, algo inimaginável na rotina frenética pré-pandemia. E quem diria, o tédio acabou sendo o responsável por impulsionar viagens por mundos internos, desbravados sem sair do sofá.
Dentre todas estas reflexões, pelo menos uma passou pela cabeça de quase todo mundo; a casa é parte essencial da nossa vida.
E no caso de quem leva uma vida nômade, sem morada fixa? Qual cantinho poderemos chamar de casa se ainda não temos raízes fincadas em lugar nenhum?
Casa é onde mora o coração. Será?
Existe uma expressão em inglês que busca responder esta pergunta: “home is where the heart is”, algo como “o nosso lar é onde mora o coração”. O problema é justamente este. O coração, no caso dos expatriados, está eternamente dividido entre dois amores, sendo cada metade de um lado diferente do Oceano Atlântico.
E foi a angústia deste dilema que acompanhou muitos expatriados durante esses meses de reclusão forçada, somados ao medo, a saudade e claro, ao tédio.
Essa mistura de sentimentos levou muitos brasileiros que vivem no exterior a refletir sobre o seu conceito de casa e a pensar em que lado do oceano está, de fato, o seu coração.
Antes, quem se confortava com o fato de estar a apenas um voo de distância da família, descobriu que um voo pode ser distância demais para dar conta de tanta saudade. Já outros, descobriram que fugir para o meio do nada e longe de todos é o que mais precisam para lidar com o estresse gerado pela pandemia.
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Pobre dos apaixonados por viagem, que contavam os dias para entrar em um avião e sair por aí explorando o mundo.
Hoje, muitos deles contam as horas para sair do ambiente claustrofóbico que se tornou o aeroporto, com tantas regras novas a serem seguidas, além da preocupação constante ao ser obrigado a remover a máscara em meio a tantas pessoas, nem que seja apenas por alguns minutos.
Já quem sempre gostou da vida cosmopolita e agitada da cidade grande, neste momento só quer saber de fugir das multidões, preferindo passar o sábado à noite acampado no meio do mato do que dançando na balada lotada.
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Pois é, já deu para perceber que 2020 trouxe alterações significativas no estilo de vida de muita gente, e todas estas mudanças fizeram com que as pessoas começassem a se perguntar se as escolhas feitas no passado ainda fazem sentido no presente.
Foi por estas razões que muitos expatriados, estes eternos viajantes, de repente se viram parados em uma encruzilhada, sem saber exatamente qual caminho seguir. “Should I stay or should I go?”, já questionava a banda The Clash. Devo ficar e ver no que vai dar ou devo voltar para casa?
Ficar ou voltar: o eterno dilema do expatriado
Aliás, quem vive fora ainda pode chamar o Brasil de casa?
Para muitos expatriados, a resposta é um ressonante SIM, gritado aos quatro ventos junto com a promessa de que na Europa não pisa mais.
De repente, tudo o que antes incomodava no Brasil passa a ser visto com um filtro diferente. É o caso do medo da violência brasileira, que parece pequeno frente às novas ameaças de terrorismo em muitas cidades europeias.
Por outro lado, há muitos brasileiros que optaram por continuar morando fora. Eles tomaram tal decisão baseados na esperança de que a tempestade vai logo passar e impulsionados pelos sonhos que ainda pretendem realizar no exterior; além de serem movidos pela força (ou seria teimosia?) típica do brasileiro que não desiste nunca.
E claro, há aqueles que sequer precisam refletir sobre o tema. Seu coração já criou morada definitiva em algum lugar desse mundão, seja no Brasil ou em outro país.
Nem cá, nem lá
Com exceção desses sortudos que já foram fisgados por um lugar em particular, para todo o resto que ainda está se perguntando onde é o seu verdadeiro lar, a resposta é… depende. Como tudo em 2020, não há uma resposta certa para essa pergunta. E, mais do que isso, não existe uma resposta definitiva. Lá ou cá, nesta nova realidade que estamos vivendo, tudo pode mudar em um piscar de olhos, inclusive a nossa ideia de lar ideal.
O que eu sei, é que no fim das contas, casa não é nem lá, nem cá, e sim onde está o nosso coração HOJE. E, neste momento, meu coração ítalo-brasileiro está pedindo por um abraço apertado e um Natal bem tropical, de preferência acompanhado de uma boa caipirinha.
Que você também possa aproveitar este Natal ao lado daqueles que ama, nem que seja com um abraço virtual.
Buon Natale! Feliz Natal!