Quando eu era criança, eu queria ajudar as pessoas e isso significava ser médica. Meu primeiro kit médico comprei numa lojinha perto de casa. Foi decepcionante abri-lo com a minha prima Cris, e constatar que era de brinquedo. Passada a decepção, fui feliz receitando medicamento invisível, curando meus ursos, bonecas e familiares que entravam na brincadeira… O mundo girou e o tempo passou.
Em 1998 os furacões Mitch e George devastaram a América Central, deixando muitas pessoas feridas e mortas. Como faltavam médicos para atender os pacientes, o Comandante e Chefe de Cuba, Fidel Castro Ruz, enviou brigadas de médicos e enfermeiros aos lugares afetados.
Para formar gratuitamente médicos na América Central, em 15 de novembro de 1999, Fidel decidiu criar a Escuela Latinoamericana de Medicina (ELAM), que completou no mês passado 17 anos desde a sua criação. A maioria dos estudantes eram de famílias de baixos recursos. O projeto deu tão certo que decidiram expandi-lo.
Então, em 2001, meu sonho começava a virar realidade! Enfim eu teria pacientes, instrumentos, remédios… e agora, tudo de verdade, finalmente seria médica! Recebi uma bolsa de estudos do Governo Cubano, e em fevereiro de 2001, como não sabia o que colocar na mala, a enchi com meu sonho: estudar medicina e graduar-me como médica. Éramos aproximadamente 60 brasileiros de todo o país que chegávamos por ano.
Nós aprendemos o espanhol na prática, seis meses antes de começar o curso de Medicina. Cuba gerou um choque cultural positivo na minha vida. Éramos estudantes de toda a América Latina e parte da África!
Cuba é conhecida como uma das melhores medicinas do mundo. Considero que só quem viveu e é médico formado pelo sistema cubano de saúde, pode entender isso na íntegra, apesar de algumas pessoas dizerem o contrário.
O sistema de saúde cubano é focado na prevenção, diferente dos outros sistemas de saúde, focados na tentativa de curar. A medicina também se tornou um negócio, e é mais caro curar que prevenir, talvez esta seja uma das razões porque os outros sistemas critiquem a medicina cubana. Obviamente existem doenças que não podem ser prevenidas e são tratadas como lhes corresponde.
No sistema de saúde familiar cubano existe um consultório com um médico de família que, junto à uma enfermeira, atendem à uma população de 3.200 a 3.500 pessoas. No período da manhã, o médico atende os pacientes no consultório e, à tarde, visita nas casas quem está incapacitado de ir ao consultório.
Pacientes com doenças diagnosticadas que necessitem de atenção especializada, são encaminhados para o policlínico (posto de saúde) onde são avaliados, e se necessário – casos de urgência ou internamento, cirurgias e partos – são enviados a um hospital.
Um fato que eu adorava quando estudava em Cuba, atendendo no hospital público, era que eu só precisava pedir os dados pessoais do paciente e perguntar no que eu poderia ajudar.
Existe, sim, carência de alguns materiais nos hospitais, assim como existe carência no Brasil, no México, e na maioria dos sistemas de saúde pública.
Em 2010 eu me mudei para o México. No início meus pacientes eram de posto de saúde e de consultas de urgências no hospital, além disso, eu fazia parte da equipe de transplantes no setor da saúde pública.
O sistema de saúde mexicano divide-se em dois: público e privado, como no Brasil. Com a diferença que a saúde pública se divide em outros vários sistemas: Instituição de Segurança Social (IMSS), Instituto de Segurança e Serviços Sociais dos Trabalhadores do Estado (ISSSTE), Petróleos Mexicanos (PEMEX), Secretaria da Defesa Nacional (SEDENA), Secretaria da Marinha (SEMAR), Seguro Popular de Saúde (SPS), Secretaria de Saúde (SSa), Serviços Estatais de Saúde (SESA) e o Programa IMSS-Oportunidades (IMSS-O).
Tantas divisões acabam sendo desfavoráveis para a população que, de acordo com a sua profissão, tem acesso a um tipo de saúde pública. Por exemplo, o seguro popular é o serviço que cobre menos doenças, porém é o que tem mais pessoas cadastradas, e conta com um escasso quadro básico de medicamentos. Os outros sistemas são um pouco mais abrangentes e, por conseguinte, cobrem mais doenças.
Assim como no Brasil, aqui quem pode também prefere pagar os planos de saúde, que são caros, entretanto dão a segurança que os pacientes precisam.
Desde 2013 eu fui contratada por um hospital privado na Cidade do México e, confesso que no início, torcia o nariz para a saúde privada. Porém, o meu conceito mudou depois de ver que é um benefício para a saúde pública, já que as pessoas que usam o serviço privado, deixam o público para quem realmente precisa, pois ambos têm direito e pagam seus impostos.
Algo diferente do Brasil é uma das minhas áreas: Transplantes. No Brasil, quando um paciente é diagnosticado na saúde privada, a partir do momento que é inscrito na lista de espera, o SUS se responsabiliza pelo paciente tanto na cirurgia como no tratamento pós-transplante. Já no México, se o paciente decidir, ele pode fazer o seu transplante e tratamento no setor privado e pagar por todo o atendimento.
Dos três sistemas de saúde que eu conheço, posso dizer que nenhum é perfeito. Todos têm seus prós e contras. Porém, não podemos culpar somente os sistemas de saúde.
Acredito que o amor à profissão supre algumas deficiências. Para mim, poucas coisas são mais bonitas que receber o sorriso de um paciente quando este me diz: – Obrigado, doutora!
Com carinho, Feliz Natal e Ano Novo!
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Até o ano que vem!