Apesar de Myanmar estar se tornado cada vez mais popular como destino turístico em todo mundo, esta é uma pergunta que ainda intriga muita gente. Vários europeus ou pessoas de países ocidentais costumam me perguntar se é seguro viajar em Myanmar. Às vezes, a pergunta também vem com um acréscimo: se é seguro viajar sozinha, como mulher.
Eu respondo sempre que sim, é seguro viajar pelo país. A grande maioria dos visitantes que vem ao Myanmar fazem a rota clássica: a ex-capital, Yangon, a cidade antiga de Bagan, Mandalay e o lago Inle. Mas é importante ter em mente o passado do país, seguir certas regras de comportamento e saber sobre a atual situação política – sim, ainda existem conflitos armados em certas regiões
Uma guerra civil foi iniciada após a independência do Império Britânico em 1949. Em 1962, após um golpe de Estado, os militares assumiram o poder. Desde 2011, um governo civil foi instaurado e em 2015, o partido Liga Nacional da Democracia (NLD – National League for Democracy) teve uma vitória esmagadora. Os birmaneses depositam muitas esperanças no novo governo, para que a situação geral melhore e o problema dos conflitos internos – o que não é uma tarefa nada simples – seja solucionado.
Os conflitos são entre grupos de rebeldes de minorias étnicas e o governo. No norte do Myanmar, no estado de Kachin, existem lutas com o KIA – Kachin Independence Army (Exército de Independência Kachin). Como o próprio nome diz, eles exigem a independência daquela região, apesar de inicialmente ter sido fundado para combater a junta militar. Existem outros grupos em outras regiões lutando contra o governo.
Além disso, no estado de Rakhine, existe um grupo – ALA (Arakan Liberation Army) que luta contra a perseguição dos chamados “Rohingyia” e por estabelecer uma área para esta minoria viver, seguindo os preceitos de sua religião. Este é um assunto extremamente delicado em Myanmar e pode rapidamente terminar numa saia justa. Rohingia é uma minoria de origem muçulmana que vive no estado de Rakhine, na fronteira com Bangladesh. A grande maioria dos birmaneses os consideram imigrantes ilegais de Bangladesh que, portanto, não tem direito de requisitar cidadania ou etnia birmanesas. O mundo ocidental tem exigido de Myanmar e de Aung San Suu Kyi que tomem um claro posicionamento contra a perseguição a esta minoria; já os birmaneses interpretam este requerimento como intromissão às políticas internas.
Nos últimos tempos,a questão dos Rohingya tem se agravado. No mês de dezembro, na cidade de Yangon, em um período de uma semana, duas bombas explodiram em áreas diferentes da cidade. Não houve feridos ou mortos, mas a especulação é de que seja um aviso, uma retaliação de grupos muçulmanos quanto à situação no estado de Rakhine.
As áreas onde ocorrem os conflitos são áreas restritas, ou seja, não se pode viajar ali sem permissão. Não que necessariamente o estado inteiro seja uma zona restrita: por exemplo, em Rakhine há a famosa praia de Ngapali, muito popular entre turistas, ou no estado de Shan, o lago Inle, que é uma das principais atrações do país e parte da rota clássica, ao mesmo tempo, há conflitos no norte e mais recentemente na fronteira com a China.
Estes conflitos são, como a definição diz, conflitos internos. Entre rebeldes de grupos étnicos e o governo birmanês. Não tem, portanto, como alvo turistas, como ocorre em outros países.
A princípio pode parecer um tanto estranho dizer que é seguro viajar por um país com tantos conflitos armados. No entanto, considerando que até o momento não são conflitos direcionados a turistas e que nestas regiões não se pode entrar sem permissão, minha resposta é: sim, se você não quiser se aventurar pelas florestas do estado de Chin se juntando aos rebeldes, é seguro sim viajar pelo Myanmar. No sul da Tailândia, também há uma região restrita a visitantes e com constantes conflitos com milícias e mesmo assim, é o destino mais popular no Sudeste Asiático.
O equilíbrio político é ainda frágil em Myanmar. Mas, especialmente vindo do Brasil, onde temos as “guerras civis” não declaradas ocorrendo por todos os lados, com a violência urbana e criminalidade que se enfrenta, o Sudeste Asiático, com todos os pequenos poréns, é um paraíso. Claro que nem tudo são rosas, é importante ter um certo cuidado, confiar em sua intuição quanto a estranhos. É bom ficar de olho para não cair em ciladas para turistas. Acontece muito pessoas, aparentemente com boa vontade, oferecerem ajuda a turistas e no final pedirem dinheiro pelo que fizeram (sem ter anunciado, no início da conversa, que vão cobrar algo). Ainda assim, os birmaneses são o povo mais acolhedor e simpático que já encontrei. A maioria ajuda e cuida dos turistas – em muitos lugares se vêem placas em birmanês e inglês “Warm welcome and take care of tourists” (Dê as boas-vindas e cuide dos turistas).
Sempre viajei sozinha por aqui e nunca tive medo. Myanmar é um ótimo destino para meninas que viajam sozinhas. Às vezes, por sermos mulheres, atraímos olhares curiosos, mas não somos molestadas. Vivendo aqui, eu saio à noite numa cidade grande, encontro amigos, e me sinto segura. Mas sei que é necessário ter bom senso, se adaptar a certas regras de comportamento locais e não confiar cegamente em qualquer um. Acho que nós brasileiros estamos bem treinados nesse quesito, portanto as experiências maravilhosas e os lindos lugares que podem ser visitados, fazem valer a pena a viagem.
11 Comments
Natalie, adorei seus textos sobre Myanmar. No momento moro em Cingapura, mas de mudanca. Irei passar uns meses viajando pela Asia e Myanmar esta na lista…. quero passar pelo menos um mes no pais, vivenciando a historia e cultura local, tambem estou vendo para fazer um trabalho voluntario… Devo ir em abril, quem sabe se tu estiver por ai podemos tomar um cafe… Abracos e parabens pelo texto.
Oi Juliana, que legal! Um mês dá para conhecer e vivenciar bastante. Claro que podemos nos encontrar, vou te passar meu email. Muito obrigada, abraços 🙂
Ola, Natalie como vai? Obrigada por compartilhar suas experiências no Myanmar. Estou indo a turismo ao Myanmar(Yangon – Bagan – Inya Lake) em janeiro de 2018. Estava muito empolgada com a viagem,mas recentemente com esses problemas internos no Pais(expulsao,exterminio e abusos contra o povo Rohingya), estou um pouco receosa. Gostaria de saber como esta a situação do turismo. Ha algum alerta para os estrangeiros ai? Ficarei muito grata com as suas informações.
Muito obrigada.
Ola Paula! Realmente e uma situação delicada o que ocorre no país, mas por varios motivos ainda digo que é seguro viajar para o Myanmar e que sim, vale a pena. Eu te mandarei um email com mais detalhes 🙂 um abraço.
Olá Natalie!
Atualmente moro em Macau e gostaria de conhecer o Myanmar em janeiro (é o meu sonho!). Entretanto, tenho lido várias notícias preocupantes sobre a situação atual do país. Tenho 20 anos e, se realmente conseguir ir, vou sozinha e gostaria de saber se realmente é aconselhável.
Obrigada desde já,
Thaline.
Ola Thaline! Continua sendo seguro viajar em Myanmar, para alguns é uma questão mais moral do que de segurança. Os conflitos estão restritos no norte do pais e não atingem a zona turistica. Algumas pessoas pensam num boicote devido ao posicionamento do governo em relação aos Rohyngya, mas isso por outro lado so atingiria quem depende do turismo.
Espero que tenha ajudado.
Um abraço, Natalie
Olá Natalie! Estou com uma viagem programada para Myanmar dia 25 de dezembro agora (Bagan e Mandaly). Estava bem animada, mas com as notícias sobre os conflitos, fiquei muito preocupada. Vamos eu minha mãe, você acha que é seguro?
Muito Obrigada!
Danuza
Natalie, existe algum preconceito dos budistas com pessoas portadoras de necessidades especiais?
Oi Natalie!
Gostaria de deixar um pequeno relato. Visitei Myanmar em jan/2016 e fui fazer trekking em Hsipaw, na região norte do país mas ainda na área teoricamente controlada pelo governo. E não é que num dia que estávamos esperando o almoço numa vilinha nas montanhas passa um grupo de guerrilheiros armados na nossa frente? Não sei se foi mais estranho para nós ou para eles que ficaram com cara de o quê que esse povo tá fazendo aqui?
Felizmente só olharam para a nossa cara e seguiram caminho mas na hora foi meio assustador. Eu contei essa história no meu blog e já que você mora em Myanmar e eu adorei o país queria compartilhar com você e seus leitores. Tá aqui https://amoviajarbarato.com/hsipaw-desfile-de-guerrilheiro/
Grande abraço de alguém que tem uma pontinha de inveja por você morar nesse país fascinante!
Nossa, muito interessante seu relato Cristiano! Existem algumas dessas areas em Myanmar que sao muito proximas de areas de conflito, como em Shan State por exemplo. Mas ate o momento nunca tiveram turistas como alvo e nao e comum ter estes encontros como no seu caso, por isso em geral uma viagem em Myanmar continua sendo considerada segura, nao ha terrorismo voltado para atingir o turismo. Uma recomendação por ex. é nunca sair das trilhas demarcadas. Que bom que deu tudo certo e foi apenas uma experiencia curiosa 😉 Parabens pelo blog, um abraço!
Oi Natalie
Li seu relato é estou querendo ir para o Myanmar sozinha. Vc indicaria ir com guia por ser mais seguro?
Ou dá pra se virar por conta própria?
Obrigada