O futuro argentino é sem carne?
Certamente uma das discussões mais debatidas atualmente por aqui é se deveríamos ou não consumir carne de outros animais.
Desde que disseram que o novo coronavírus apareceu num mercado de carnes exóticas na cidade de Wuhan, na China, todos começaram a se perguntar: até que ponto vale a pena sacrificar outra – e, porque não dizer a própria vida – em prol de um prazer momentâneo e passageiro?
No entanto, eu pergunto: será possível uma Argentina vegetariana? Afinal, não é de hoje que o país é conhecido no mundo todo por sua deliciosa – e bem servida – parrillada.
Carne: comer ou não comer, eis a questão!
Por um lado, estão os que defendem: “se não comer carne, não vai ingerir todos os nutrientes necessários para viver com saúde”. Enquanto do outro estão os que dizem: “não precisamos de carne para obter todos os nutrientes necessários para viver com saúde”.
Dessa maneira, quem será que tem a razão?
Com certeza podemos discutir por horas e horas sem chegar a uma conclusão absoluta. Do mesmo modo que um lado se prepara com bons argumentos para defender seu ponto de vista, o outro faz o mesmo.
Consumo de carne e saúde
Embora muitas pessoas que consomem carne não queiram admitir, estudos científicos mostram que vegetarianos e veganos têm uma tendência maior a não sofrer de enfermidades crônicas não transmissíveis (ECNT)*. Ou seja, é mais difícil encontrar vegetarianos e veganos que sejam obesos, tenham diabetes tipo 2, hipertensão ou colesterol alto.
*Veja mais sobre o assunto no site nutritionfacts.org (está em inglês)
Por isso, comer pouca ou nenhuma carne pode, sim, ser melhor para a saúde do que consumir muita carne. Mesmo que pareça difícil, talvez seja o momento de tentar uma mudança na alimentação. Vale ressaltar que pessoas que padecem das ECNT estão sofrendo mais as consequências da Covid-19.
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Por isso, tantos veganos afirmam que não há outro caminho se não o de abandonar por completo o consumo de produtos de origem animal.
No entanto, eu te pergunto, você acha que será possivel?
Mudando os hábitos
Não podemos esquecer que tudo na vida é um processo. Deixar de comer carne também. Primeiramente começamos com um dia, depois uma semana, daí um mês e quando vemos já passou um ano.
Qualquer mudança de hábito deve ser gradual para ser efetiva. Principalmente se falamos de algo que fazemos há muito tempo.
Além do que a comida não só nos proporciona nutrientes, como é também recordação, afeto, carinho e um abraço quentinho para quem vive longe de casa.
Por mais que mexer nas nossas memórias afetivas seja difícil, às vezes é necessário e também recompensador. Para exemplificar, vou contar um pouco sobre a minha história.
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Era uma vez . . . brincadeira . . . Na real, tudo começou quando em 2002 eu perdi minha avó. Ela, recuperada de um câncer, faleceu dormindo por causa de problemas cardíacos e pegou a todos nós de surpresa. Em seguida, vi meu pai quase morrer aos cinquenta anos pelo mesmo problema.
Disse a mim mesma: “não serei a próxima da fila”.
Isso já tem mais de dez anos. De lá para cá, venho mudando hábitos. Aprendi a cozinhar. Comecei a consumir legumes que antes torcia o nariz. Deixei a carne. Voltei a fazer atividade física com mais frequência. Procuro sempre dormir de sete a oito horas por noite. Não fumo, nem bebo álcool.
Resultado? Em poucos meses, farei quarenta anos e estou muito bem obrigada. Como bem e não aumento meu peso. Além disso, meus últimos exames foram excelentes. Por isso, penso em continuar assim 😉
Indo contra a corrente
É provável que neste momento você esteja pensando no quão difícil (ou caro) deve ser não comer carne no país da carne. Pois eu te conto que caro nem é, mas difícil é, com certeza. Em Buenos Aires não tanto, como tem muita gente, há espaço e opções para todos. Entretanto, aqui em Corrientes, o cenário é bem diferente.
Mesmo que a província produza muitos cítricos (laranjas, limões e mexericas), feijões e amendoim, morangos espetaculares e muito arroz, as pessoas só querem comer mesmo bife com batata, pizza, sanduíches de queijo e presunto, empanadas de carne ou frango e hambúrguer.
Assim sendo, não me assusta escutar que mais de 60% dos adultos estão acima do peso (sobrepeso e obesidade). Além de grande parte da faixa etária entre 35 e 40 anos fazer uso regular de medicamentos para tratar alguma ECNT.
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Com o intuito de reverter essa situação, não faltam iniciativas públicas e privadas para estimular a “alimentación sana” (alimentação saudável). Como resultado se pode notar ultimamente um aumento considerável na oferta de quitandas e lojas de produtos dietéticos.
No entanto, devemos ficar com os olhos bem abertos: ao mesmo tempo em que estamos tentando caminhar rumo a uma vida mais saudável, alguns políticos da província vizinha Chaco estão querendo trazer da China criadeiros de porcos para a exportação.
Mesmo com a população se manifestando contra esse acordo, eles continuam alegando que é uma excelente forma de trazer trabalho para a região. O que nos resta saber é se além de trabalho estaremos trazendo também a próxima pandemia.
Fica a reflexão.