Pequenos prazeres da vida no exterior.
Você já reparou que quando está fora do seu país de origem você observa a vida com outros olhos?
Como tudo é novo, passamos a enxergar as coisas e não mais somente vê-las. Muito do que vemos nos encanta ou até nos trazem certo estranhamento. De uma forma ou de outra somos atraídos pelo diferente que jamais passa despercebido.
Estar em um lugar completamente novo habilita um novo certo modo de ver. Olhar tudo pela primeira vez é um exercício de atenção desfocada, ver tudo e não se prender a nada.
Muita coisa aqui onde vivo me encanta e toda a novidade me faz querer fotografar para mostrar os pequenos detalhes, esses pormenores para um morador antigo, talvez não faça diferença alguma, mas para mim apresenta-se como novidade, as vezes bonito, as vezes feio ou estranho, mas em todo caso, diferente.
O que quero chamar a atenção nesse texto é sobre aqueles acontecimentos que facilmente não são notados, são pequenos e as vezes sem importância, mas que se nos atentarmos podemos usufruir desses simples prazeres no cotidiano.
O filme O fabuloso destino Amélie Poulain fala sobre se tornar sensível ao charme discreto das coisas simples da vida. É exatamente isso, abrir-se para os detalhes que nos cercam, não se acomodar e nem banalizar o que aos poucos se torna familiar, sempre há o que se ver.
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Eu entendo que quem desfruta da experiência de morar fora se vê diante de excessivas novidades, em alguns momentos também queremos estar em certa zona de conforto, ficar quietinhos em casa e comer arroz com feijão, como se nada tivesse mudado na vida.
Mas não é disso que estou falando, eu falo de não se acomodar a ponto de esquecer o resto e, para isso, é preciso pisar no freio, respirar fundo e simplesmente olhar. Não precisa de nenhuma habilidade especial para isso, é só abrir os olhos e assistir aos pequenos espetáculos escondidos por traz da indiferença que a rotina pode trazer. Esses momentos singulares simplesmente acontecem, ninguém precisa correr atrás deles, é só se deixar envolver por eles.
A vida aqui na Ilha de Man também tem seus pequenos prazeres. Todos os lugares tem, mas por ser um lugar que estou aprendendo a viver é mais fácil usufruir e mesmo falar dessas miudezas.
Uma sopa quente em dia frio, aquece o corpo e a alma.
Entrar em um restaurante e perceber que a música ambiente é a boa e velha bossa nova. Você ouve, canta junto baixinho e fica feliz só com isso.
Chegar em casa e tirar casacos, luvas e cachecol, é aquela sensação de alívio e leveza.
Vestir pijamas e tomar um chocolate quente, uma dupla infalível.
Curtir um dia de neve sem saber se haverá um próximo.
Guardar as roupas de inverno quando a estação se despede. É um momento de pensar que o frio já foi e agora o colorido e as temperaturas mais amenas estarão de volta.
Ver a chegada da primavera colorindo aos poucos a cidade.
Observar a dança dos pássaros sobre os campos de feno. É uma verdadeira obra de arte em movimento.
Avistar ao longe as primeiras flores amarelas, as daffodils (narciso-amarelo). É a primeira flor que aparece bem no início da primavera, para mim é algo muito simbólico.
Conseguir ser rápida no supermercado porque já conhece os produtos.
Pisar as folhas secas no outono.
Ver o sol nascer e se pôr no mar. E para isso só ter que mudar de lado na Ilha.
Perceber de repente que o dia não escurece mais as 16h.
Ter alguns minutos de silêncio depois de um dia agitado.
Ouvir bom dia em português.
Chegar de avião na ilha em um dia de sol e poder contemplar todo o país de cima.
Passear pela cidade e encontrar pessoas conhecidas, amigos que foi fazendo aos poucos.
Reconhecer os valores das moedas só pelo formato.
Participar de costume locais e se divertir com a novidade.
Observar as vitrines das lojas mudando de estação.
Ver um raio de sol entrar na sala.
Apreciar a arquitetura e entender como ela é reflexo da cultura.
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Perceber-se desacostumando com a violência urbana por meio de novos costumes, como esquecer a porta de casa destrancada, andar a noite livremente, usar o celular na rua sem pudor algum.
No fim das contas são esses pequenos grandes detalhes que simplesmente tornam nossos dias mais significantes. No fundo, acho que somos movidos pelas novas paixões e afetos que vamos conquistando nesse mundo novo e que se iniciam com essas singelas observações. Não precisamos esperar que algo grandioso aconteça, seja uma promoção no trabalho, uma casa nova, um carro, uma viagem, para que nos sintamos realizados. Podemos estar constantemente satisfeitos mesmo com algo que não precise de muito investimento seja ele financeiro, intelectual, físico ou qualquer outro tipo.
E você, já pensou em cultivar um gosto particular pelos pequenos prazeres do dia a dia?
2 Comments
Texto incrível! Eu vejo assim muitas vezes e outras, quando não estou tão bem, respiro fundo e tento relembrar dessas sensações e ver o mundo com um novo amor. Mesmo lugares que eu já conheça bem.
Um beijo!!!
Muito obrigada, Nadja. Eu acho que é exatamente isso, um exercício diário! Beijo!