Em janeiro deste ano o barril de petróleo atingiu o menor preço desde 2004; o barril que antes custava $115,00 dólares chegou a $28,00. Esse preço tão baixo foi um susto para o Qatar e outros países do Oriente Médio que tem sua economia girando, quase unicamente, em torno da exploração do petróleo e do gás natural.
O preço do barril já está caindo há um ano e meio e, desde janeiro de 2015, a commodity vem sendo negociada abaixo de $50,00 dólares, o que já é menos do que o valor que o governo de países como a Arábia Saudita fazia suas contas ( com o petróleo em alta a Arábia Saudita fazia suas contas como se o barril custasse $50 assim teriam uma reserva em caso de queda do preço, o Qatar faz suas contas como se o barril custasse $35).
Os motivos para a queda drástica do preço foram: o aumento dos reservatórios de gasolina dos Estados Unidos que agora extraí petróleo de xisto, combinado com o anúncio do teste de uma bomba nuclear de hidrogênio pela Coréia do Norte e a diminuição da demanda na Europa e Ásia devido ao menor crescimento da economia do mundo.
Hoje existe uma grande quantidade de petróleo disponível no mercado, porém as compras estão caindo. Embora tenham sido feitos muitos investimentos e abertas novas áreas de exploração pelo mundo o crescimento da economia global não acompanhou o mesmo passo. Por isso a conta não fecha, milhares de barris ficam sem comprador no final do dia e segundo a lei da oferta e da procura os preços caem. Isso sem falar das turbulências financeiras na China que é o maior importador de matéria prima do mundo.
A OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) não entra em consenso sobre a redução da produção para alavancar os preços e, em sua última reunião, pressionados pela Árabia Saudita (segundo maior explorador de petróleo no mundo), decidiram apostar em deixar tudo como está para tentar tirar os norte americanos do mercado.
E, ao que tudo indica, os preços devem continuar caindo já que o Irã, dono de grande reservas de petróleo e gás natural, após cumprir sanções impostas há uma década, está de volta ao páreo.
Ok, mas o que tudo isso ao redor do mundo tem a ver com o Qatar? A verdade é que, estudando para escrever esse artigo, realmente tive a dimensão de que não estamos sozinhos. Tudo o que acontece influencia significativamente a vida de todos, mesmo que distantes.
Da última vez que o preço do petróleo caiu tanto, no fim dos anos 80, levou a União Soviética para a derrocada desmoronando, assim, o império soviético.
Essa queda dos preços está tendo um efeito devastador na indústria do petróleo. Só em 2015 1000 plataformas de perfuração foram paralisadas e já foi registrado um corte de gastos de $100 bilhões de dólares.
Em maio de 2015 a RasGas, sociedade anônima braço da Qatar Petroleum, anunciou a demissão de 250 funcionários expatriados, um mês antes a Maersk Oil demitiu 12% da sua força de trabalho no país, sendo certo que desde o começo da queda do preço do barril do petróleo em 2014 a Qatar Petroleum já cortou mais de 3.000 funcionários da sua equipe.
Quem pensa que os cortes foram apenas no setor de óleo e gás não podia estar mais enganado. A Qatar Rail (empresa responsável pela construção e implantação do metrô no país) em janeiro deste ano anunciou a demissão de mais de 1000 funcionários, Qatar Museum anunciou cortes assim como a telecom Oreedoo e a bola da vez foi a Al Jazeera que demitiu mais de 500 funcionários da sua equipe.
Nem a saúde foi poupada; os dois maiores centros médicos do Qatar o Hamad Medical Corp e o Sidra Medical and Research Center anunciaram demissões de mais de 1000 expatriados no primeiro e 200 no segundo. Eu conheço pessoas que trabalhavam no Aspire Park e em outros lugares que também foram demitidas. E a má notícia é: mais cortes virão.
O clima não está dos melhores para aqueles que trabalham no setor privado, a insegurança tem reinado. As concessionárias de carros estão vazias, a oferta de carros usados está cada vez maior, nesse grande reality show estamos todos no paredão e qualquer um pode ser o próximo eliminado.
O triste é ver pessoas que foram pegas totalmente desprevenidas enfrentando esse tipo de situação. Gente procurando desesperadamente por outro emprego já que tem filhos em idade escolar que não podem simplesmente abandonar a escola, ou pior, gente que tem empréstimos no banco e por conta disso são proibidos de deixar o país até que este seja quitado.
Você não leu errado. A conta bancária é vinculada a uma relação de emprego, uma vez que a empresa informa ao banco a demissão de alguém esse alguém tem os valores depositados bloqueados até que sejam quitadas as dívidas de empréstimos e cartão de crédito. Uma vez pagas os valores restantes são desbloqueados para saque. Ocorre que muitas vezes o valor da indenização por término de contrato não é suficiente para cobrir as dívidas já que aqui se endividar não é difícil ( empréstimos a juros ridículos, limites altíssimos no cartão de crédito e um alto custo de vida ajudam) e ai as coisas se complicam, o banco informa o governo que esse alguém tem dívidas e o governo bloqueia o passaporte até que a dívida, ou pelo menos parte que o banco ache importante, seja quitada.
Mais de uma vez recebi pedido de ajuda de pessoas que não sabiam mais o que fazer já que, sem emprego, acumulavam cada vez mais e mais dívidas. Imaginem, profissionais qualificados mendigando a comunidade para poder ao menos conseguir voltar para seu país de origem. Um quadro deprimente que ninguém espera passar.
Quando recebo e-mails de pessoas que querem vir trabalhar no Qatar alerto sempre para essa possibilidade. É muito fácil se deslumbrar, mas dinheiro na mão, meu amigo, como diria Paulinho da Viola, é vendaval. Tem que ter pé no chão e cabeça feita, viver a vida no sapatinho, juntar se possível, e se endividar jamais; afinal nunca se sabe quando a crise vai chegar a você.
4 Comments
Excelente post. Chama todo mundo à realidade. E, principalmente, alerta aos brasileiros que estão por aqui, reclamando da crise brasileira e achando que a recessão e o desemprego só aterroriza por aqui. Ou seja, o Brasil, como o Qatar e outras dezenas de países, do primeiro ao décimo mundo, vivem uma mesma realidade (as causas podem ser diferentes em alguns casos e iguaizinhas em outros), apenas com uma ou outra ilha de tênue prosperidade.
Obrigada Francisco!
Assim como em qualquer país o problema existe e deve ser bem administrado para que possamos sobreviver as crises financeiras. Tudo é passageiro, devemos sempre estarmos preparados para o pior. Como diz um sábio provérbio: Em tempo de fartura devemos poupar para que não nos falte na estiagem. Seguindo sempre o conselho da Dona Formiga passado a Dona Cigarra, que passava todo o verao a cantarolar enquanto a formiga trabalhava estocando para ter o que comer no inverno. Parabéns Dra. Thais. Precisamos mesmos dessas informações. Pois muitos brasileiros acham que somente no Brasil a vida está difícil.
Parabéns thais ,o que vc escreveu e pura verdade ,eu vivo a 25 anos no japão uma economia ate boa ,mas aqui tem isso a crise chega e vamos para rua mesmo .Se não se preparar fica complicado .