A Alemanha recebe refugiados há anos. Em 2014, o país recebeu em torno de 200 mil. O ano de 2015 tem sido uma exceção a este número que não pára de crescer em meio à crise migratória na Europa. Munique, capital da Bavária, recebeu em 2014 aproximadamente 6.100 refugiados, enquanto somente no segundo final de semana de setembro de 2015 chegaram mais que o dobro desse número: mais de 13 mil somente no sábado (12). Sem dúvida esse é um número impressionante.
De acordo com dados recentes (junho 2015) fornecidos pela Prefeitura de Munique, 30% dos refugiados vêm do Kosovo, 17% do Afeganistão e 13% da Eritreia. Ao contrário do que muitos acham, a maioria não vem da Síria; somente 5% são nacionais deste país. No entanto, esses números podem mudar na nova pesquisa devido ao grande número de refugiados que chegaram nos últimos 3 meses.
Fonte: Landeshauptstadt München (Prefeitura de Munique)
E por que tantos refugiados chegam a Munique? Isso acontece principalmente devido à sua localização no sul do país, próxima à Áustria e Hungria, por onde chegam muitos refugiados. A partir daqui, eles são distribuídos pelo Estado e pelo resto do país, quando o processo oficial de asilo é finalizado.
Na Alemanha existe um sistema de quotas que se chama “Königsteiner Schlüssel“, onde cada Estado, baseado no número de seus habitantes e impostos pagos, tem a obrigação de receber uma certa porcentagem de refugiados anualmente. A Bavária, por exemplo, deve receber 15% do número total no ano de 2015, ficando atrás de Nordrhein-Westfalen, que deverá receber 21%.
Cada refugiado recebe uma ajuda de custos do governo que atualmente equivale a 362 euros. Recebem, ainda, o apoio de organizações não-governamentais e doações. Com a ajuda de voluntários e ONGs, os refugiados são integrados à sociedade para que possam aprender o idioma, encontrar um emprego e as crianças possam ir à escola. Eles continuam recebendo ajuda de custos até que consigam se manter financeiramente.
Opiniões sobre a atual situação diferem muito sobre a chegada de tantos refugiados. Nem todos os alemães veem esse fato de forma positiva. Muitos mencionam a questão financeira, já que os refugiados são inicialmente mantidos pelo governo com o dinheiro dos impostos pagos pelos habitantes. Outros questionam se muitos dos refugiados necessitam realmente de asilo. Por esses motivos, há muitos radicais que têm protestado contra a presença dos refugiados no país.
Posso dizer que, morando em Munique e não muito longe da estação central, não vi caos ou má organização – apesar do mais recente alarme falso de uma bomba. Pelo contrário, ao passar pela estação central recentemente, percebi que há uma área reservada para os refugiados toda cercada pela polícia e ambulâncias. De lá eles são encaminhados aos abrigos. Normalmente, quem possui acesso aos refugiados recém-chegados são a polícia, voluntários e trabalhadores das organizações que cuidam deles. Isso, exatamente para evitar tumultos ou que radicais entrem em contato com eles.
No geral e em especial em Munique nota-se a solidariedade das pessoas por todas as partes, desde o prefeito da cidade até pessoas que têm se voluntariado para ajudar os recém-chegados. Muitos vão até a estação de trem dar as boas-vindas de forma caridosa e solidária, seja com abraços, chocolates ou com placas que dizem “refugiados, sejam bem-vindos”. Dieter Reiter, prefeito de Munique, declarou claramente que o espaço em Munique é limitado, mas o que mais importa é que eles cheguem bem e sintam-se seguros aqui.
Espaço tem sido realmente uma questão complicada, uma vez que a maioria dos abrigos estão lotados. Mas recentemente, empresas como a Osram e a Siemens forneceram galpões que não estavam sendo utilizados e, em breve, refugiados serão recebidos também nesses locais. Ao mesmo tempo, organizações não-governamentais têm buscado mais opções dentro e ao redor da cidade.
Todos os interessados podem ajudar os refugiados de diversas formas, seja a quem acabou de chegar ou aos que por aqui já estavam doando roupas e dinheiro, ensinando alemão, ajudando crianças com a escola, auxiliando em encontrar um lugar para morar, bem como um emprego, fazendo companhia aos idosos, contribuindo na integração e até mesmo fazendo atividades culturais. Para isso, só precisa buscar uma ONG e se inscrever para participar em seus programas.
Recentemente fiz minha inscrição para um programa de voluntariado com uma ONG que faz uma reunião introdutória fornecendo vários tipos de informações sobre os refugiados e sobre os projetos que são realizados. Fiquei impressionada com a quantidade de pessoas que estão dispostas a ajudá-los, bem como com a quantidade de projetos interessantes. Muitas vezes chega a ser difícil achar uma organização que ainda tenha capacidade para aceitar voluntários, de tão grande que está a demanda.
Alguns desses projetos são focados nos recém-chegados; outros são dedicados aos que aqui já vivem há meses ou há anos. Há grupos que organizam eventos e desenvolvem novos projetos. Há alguns que focam em ajudar as mulheres, e outros que também oferecem o sistema de “Patenschaft“, no qual você fica responsável por uma pessoa ou por uma família/grupo de refugiados. Nesse projeto, as pessoas dedicam seu tempo para fazer um jantar para eles; outros vão ao museu; ensinam o idioma alemão; explicam como usar o transporte público; fazem tarefa da escola; levam ao médico ou apenas fazem companhia.
Fato interessante é que aqui em Munique as pessoas ajudam tanto que, às vezes, chega a ser difícil acharem vagas em algumas organizações para voluntariar. Por exemplo, a organização que tem se ocupado em distribuir roupas para os refugiados, a Diakonia, possui um calendário onde as pessoas podem ver quando há vaga para ajudarem. Nem sempre é fácil achar um horário que não esteja preenchido. Outras já avisam em seus sites que só estão aceitando voluntários a partir de novembro. É incrível a quantidade de pessoas que estão dispostas a dedicar seu tempo para ajudar os refugiados.
Doações também têm sido muitas. Certo dia, estava com uma sacola enorme de roupas para doar à Diakonia e descobri que já arrecadaram tantas doações no mês de setembro que pararam de coletar. No site deles avisava que somente em outubro retornariam a recolher mais, já que ainda precisam fazer uma triagem das roupas, que são tantas.
Especula-se que o impacto de receber tantos refugiados não será sentido agora, mas a longo prazo. Muitos dos refugiados poderão retornar aos seus países de origem; outros, especialmente da Síria, tardarão a voltar ou talvez nunca mais retornem.
Até o momento de publicação deste texto a Alemanha está realizando controle temporário nas fronteiras do sul do país, evitando que mais refugiados cheguem. Segundo a chanceler Angela Merkel, essa medida foi tomada por causa de “razões urgentes de segurança”. Essa decisão pressionará outros países europeus para que passem a dividir a responsabilidade pela atual crise migratória no continente. Afinal de contas, a Alemanha sozinha não irá dar conta dessa crise.
Para mais informações sobre os refugiados em Munique (em alemão):
Informationen und Fakten (Prefeitura de Munique)
Algumas organizações que cuidam dos refugiados, localizadas em Munique:
2 Comments
Que bacana Allane, você não só tem visto todo este movimento de refugiados mas tem procurado ajudar de uma maneira estruturada. Bravo!
A Alemanha tem dado um show de organização, eficiência e caridade. Maravilhoso!
Aqui na Suíça discute-se muito este assunto também mas lí em um jornal que a Suíça não é o destino preferido, por ser rígida e por já ter manifestado em outras oportunidades uma certa restrição à migração. Os termos eram outros mas os refugiados não sabem muito disso. Uma pena, pois acho que os suíços são como os alemães, duros por fora e coração mole por dentro!
Mesmo assim, as doações por aqui também são imensas.
Tomara que essa situação se resolva logo… o tempo já está mudando e viver o que eles estão vivendo no frio será ainda mais difícil!
Abraço e boa sorte por ai!
Obrigada Teca!!! Sim, tem sido um prazer ver o outro lado dos refugiados.
Sei bem como é com a Suíça, morei em Genebra, e sem bem do que você está falando. É realmente complicado.
Fico feliz em saber que eles contribuem tanto com doações, isso sem dúvidas é um grande passo.
Também espero que essa situação se resolva, mas acho que é apenas o começo da crise. Ouvi dizer que muitos refugiados em Munique não possuem as características necessárias para conseguir asilo, o que significa dizer que muito terão que voltar. Triste realidade.
Obrigada e abraço pra você também 🙂