Saudade das festividades brasileiras: como lidar?
Os meses de verão na França costumam ser de comemoração. A festa nacional no dia 14 de julho junto com o calor se intensificando já faz tudo mudar por aqui. Somado a isso, tenho dois aniversários importantes na família francesa nessa época. E este ano tivemos o bônus da vitória na Copa, o que acentuou o clima de festividades. Esse sentimento de comemorações embaralhadas me deixou saudosa e pensativa sobre como costumava ser no Brasil.
Por lá, são tantos momentos de confraternização aqui e ali que é difícil fazer um paralelo com o que é vivido por aqui.
Mas, para começar, como boa olindense, a primeira coisa que me vem à cabeça, claro, é o nosso duo de festas de sucesso, nossas comemorações mais tradicionais: o carnaval e o São João.
Quem nunca ouviu falar do nosso carnaval? De dia frevo, ladeiras, bonecos de Olinda, blocos pra todos os gostos (cada um contando uma história), fantasias, 45 graus na sombra. De noite maracatu, festa à beira do Capibaribe, shows em palcos, o frescor noturno misturado com o calor do povo, mais fantasias, mais frevo. Tudo isso em looping durante pelo menos 4 dias. Isso sem falar das prévias, que dão início à festa vários meses antes da data oficial.
Algum tempo depois, em junho, outra festa de sucesso vem chegando. Milhos começam a ser vendidos em todas as feiras e comércios de rua, as roupinhas de matuto e matuta são colocadas nos manequins, as roupas xadrez também invadem as lojas… O frevo e o maracatu dão espaço ao forró. Confesso que adolescente, quando voltei a morar no Recife, cedi logo de cara ao charme do carnaval, mas demorei a apreciar as festas juninas. Cresci no Sudeste, onde essa tradição não é tão forte quanto no Nordeste, então esse período não significava muita coisa pra mim além de comer milho cozido e botar uma blusa xadrez pra ir a alguma festinha junina. Já tinha dançado muito quadrilha na escola e achava divertidíssimo, mas quando a gente cresce a hora da verdade chega, e a dança que conta é outra: o forró. E eu, como é de se imaginar, não sabia dançar. Isso representava quase uma barreira social no período de festas juninas. Mas ainda bem que o tempo passa, eu aprendi a me virar um pouco no forró e fui descobrindo aos poucos como essa festa colorida também era parte importante das minhas origens.
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Além disso, sinto bastante o fato de não poder passar todos os réveillons no Brasil, com o pé na areia, vestida de branco, fazendo festa até de manhã. Aqui é frio, as pessoas não têm a tradição de se vestirem com cores que representam o que elas querem ter no ano que chega e, pra completar, não moro perto da praia. Isso dói quando você viveu a vida quase inteira em cidades de litoral. Principalmente quando o réveillon é, junto com o carnaval, sua festa favorita.
Eu sei que tem coisas que não podem ser substituídas, e algumas dessas coisas são essas festividades nacionais, que são nossas e só em casa podemos vivê-las de verdade. Mas eu aprendi a aceitar e abraçar a nostalgia. Tenho duas playlists maravilhosas, uma para o carnaval e uma para o São João, que me ajudam a passar por esses períodos de saudade e vontade de estar no Brasil. Em fevereiro me afogo em maracatu e frevo, em junho e julho é Luiz Gonzaga quem canta para mim. No final de dezembro tento ouvir músicas mais alto astral pra não deixar a tristeza me pegar entre o final de um ano e o início do outro.
Junto com isso, fui encontrando do lado de cá alguns momentos de festa que também ajudam a dar uma força pra sentirmos a energia que pode nos faltar pela ausência das festividades com nossos conterrâneos.
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Fête de la Musique
Todo ano, no dia 21 de junho, dia de soltício de verão, é festejada por aqui a Festa da Música. A primeira edição aconteceu em 1982, por uma iniciativa de Jack Lang, o Ministro da Cultura da época. Sempre nessa data, por volta das 18h, a festa começa, na rua e de graça. Na edição deste ano vi desde grupos de maracatu até um grupo de Hare Krishnas se apresentando pelas ruas. A ideia é celebrar a chegada do verão tomando a cidade com muita música. Foi a primeira vez que participei do evento e digo que foi uma das coisas mais bacanas que já fiz por aqui. É o momento que mais me lembrou nosso carnaval (em uma versão amostra grátis, claro) até agora. Minha dica é que você tente se informar sobre a programação pra escolher em que ponto da cidade você vai escolher ficar circulando para ver as apresentações. Querer ir para lugares opostos e ter que pegar transporte público pode fazer você perder tempo e não aproveitar tanto quanto poderia.
Festivais
Verão na Europa é sinônimo de festival. Alguns desses eventos que rolam por aqui também já chegaram ao Brasil, como o Lollapalooza, por exemplo. Mas acredito que a experiência não seja a mesma, além das diferentes atrações. Então pode valer a pena. Há também alguns festivais exclusivos daqui e aguardados com ansiedade pelo público. O Solidays, o We Love Green e o Rock en Seine são alguns deles. Eles normalmente acontecem entre junho e agosto, então a dica é ficar ligado esperando a divulgação das datas e da programação.
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Nuit Blanche
Encerrada a fase de veraneio, um outro evento que movimenta as cidades aqui (assim como nos outros lugares do mundo onde acontece) é a Nuit Blanche (literalmente Noite Branca, que é, na verdade, a expressão em francês para “noite em claro”). Uma noite de exposições e intervenções de arte pelas ruas que geralmente acontece em outubro. É mais um momento em que dá prazer ver as pessoas se apropriando coletivamente da cidade para viver um momento de festa e de contemplação artística. Nesse caso não é nada que se compare à Festa da Música, até porque o clima menos agradável influencia muito, mas continua sendo uma das ocasiões mais legais do ano.
Além disso, é claro, pra quem gosta de uma autêntica festa brasileira, não é difícil achar eventos organizados pela (enorme) comunidade brasileira presente na França no período do Carnaval, do São João, assim como em outros momentos.
Espero que, para as saudosas incorrigíveis como eu, as descobertas de festividades no novo lar possam preencher os pequenos vazios que as confraternizações brasileiras acabam deixando. Sentir saudade é parte do processo, isso só não pode nos impedir de abraçar o novo.