Tratamento de alergia na Finlândia.
Faz anos que sofro de uma alergia crônica que nunca consegui descobrir do que é. Enquanto vivia no Brasil, fiz exames e um tratamento que não ajudou muito. Antes de embarcar rumo à Finlândia, minha situação piorou. Era uma coceira que eu já não controlava e feridas pelo corpo. Todo mundo me dizia que era estresse e que iria passar. Mas ela nunca passou.
Os sinais
Há dois anos fui ao médico, aqui, em uma das crises de alergia e ele me diagnosticou com pele atópica. Disse que a maioria dos finlandeses tem e que eu aprenderia a conviver com ela. Dessa forma, me receitou um antialérgico, pomada com cortisona, cremes específicos para o corpo e me mandou para casa. Disse que não era necessário fazer exame alérgico. Saí de lá desapontada. Eu não tinha direito à saúde pública, na época, e havia ido a um médico particular com a esperança de conseguir um teste.
Na Finlândia, você não diz para o médico que quer fazer exame x ou y. Ele é quem decide se é necessário ou não, mesmo pagando. No sistema público, é um pouco pior. Você passa primeiro pelo clínico geral e ele avalia se um especialista é necessário para o seu caso.
As pessoas sempre lidaram com as crises como resultado de estresse. Talvez porque fui estressada por muitos anos. Era como se fosse uma frescura devido a um empipocado que aparecia hora e outra. Mas na Finlândia eu já não tinha – e nem tenho – a vida maluca que era no Brasil. E tudo isso só começou a mudar em outubro de 2018, quando tive meu primeiro choque anafilático.
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Choques anafiláticos
Quando ocorreu, em uma viagem para Itália, eu nem imaginava do que se tratava. Estava sozinha, depois de ter almoçado com uns amigos em um restaurante japonês. O meu marido estava na Finlândia e meus amigos me levaram para o hospital mais próximo.
Foi a pior sensação que eu já senti na vida. Eu não controlava meu corpo. Estava inteira empipocada, vermelha, com uma coceira por todos os lados. Tinha dores absurdas no intestino, como se fossem cólicas e muita vontade de vomitar. Quase desmaiei por diversas vezes, sentia muita sede, minha garganta parecia secar e eu simplesmente não conseguia parar de ter espasmos. Foi muito assustador.
Dei entrada no hospital, me colocaram em uma maca, me monitoraram e eu apaguei. Dormi por 3 horas seguidas sem nenhum tipo de medicação, diagnóstico, nada. Quando acordei, a crise havia melhorado e pedi para ir embora. Naquele dia, me diagnostiquei com crise alérgica e intoxicação alimentar. Na minha cabeça, só poderia ter sido isso.
Enfim, continuei com a minha vida normal até que tive o segundo choque anafilático em fevereiro deste ano. Eram os mesmos sintomas, depois de comer em um restaurante japonês… eu não controlava meu corpo, de novo. Foi novamente assustador e fui parar de ambulância no hospital. Foi nesse dia que eu soube, de verdade, o que estava acontecendo. Que aquela alergia mal tratada havia, provavelmente, evoluído para algo mais grave. Ainda no hospital, receitaram meu primeiro Epipen. Para quem não conhece, é uma injeção intramuscular de adrenalina e que deve ser injetada o mais rápido possível.
Logo depois, marquei uma consulta com a clínica do meu bairro. Cada cidade tem um sistema de agendamento e no meu caso foi pela cidade de Espoo, onde moro. E o médico deu o mesmo diagnóstico: eu havia tido dois choques anafiláticos em menos de 4 meses. Saí da consulta com um encaminhamento para o alergologista e para fazer exames.
Aqui, quando te dão um encaminhamento, não quer dizer que você já tem o exame ou consulta marcada. A princípio, o pedido vai para o sistema público e se for autorizado, você recebe uma carta em casa com mais instruções.
Testes de alergia
Os exames foram feitos no HUS Iho- ja Allergiasairaala / Allergiatutkimuskeskus que é um hospital em Helsinki especializado no estudo de alergias. O bom é que tudo que aconteceu comigo está registrado em um sistema único. Portanto, desde o meu primeiro atendimento, todos os médicos pelos quais passei têm acesso às informações anteriores.
No dia da consulta, primeiro fiz um exame de pele e que colocaram 22 substâncias no meu braço. O teste teoricamente deu negativo, já que o único que reagiu, o camarão, não chegou ao tamanho que consideram válido. De lá me encaminharam para a consulta com o alergologista e dali a história mudou um pouco.
Em ambos choques, as minhas crises foram tardias, depois de aproximadamente uma hora de ingestão. Portanto, provavelmente, se não tivessem passado cortisona no meu braço, o camarão poderia ter reagido ainda mais com o passar do tempo. Para minha sorte, o médico levou isso em consideração e pediu um exame de sangue para investigar mais. E é assim que estamos no momento, aguardando o resultado.
Alergias na Finlândia
Na Finlândia, em torno de 10-20% da população sofre com o pólen na primavera. Inclusive, existe um portal, o Norkko, que informa como está a concentração de pólen todos os dias. Este ano, inclusive, a temporada do pólen começou mais cedo. O Yle fez uma reportagem com dicas de como melhorar os sintomas.
Além disso, como o próprio médico mencionou, grande parte da população tem pele atópica. Com isso, existem alguns cuidados que devem ser tomados. Meu médico atual pediu para que eu não use mais sabonete ao tomar banho. Ele me passou um creme hidratante específico chamado de Aqualan. É um tipo de cleanser hidratante que, segundo o próprio médico, parece estranho usar no início, mas limpa.
Fora isso, existem muitos produtos sem lactose disponíveis nos mercados. Fiz uma pesquisa na Internet e confesso que não consegui chegar num valor concreto sobre qual é a porcentagem existente de finlandeses alérgicos ao leite. Conforme o estudo High Lactose Intolerance in Northern Europeans, publicado em 2012, existem em torno de 82% de intolerantes no país. Porém, ele explica que o alto índice se dá a migração e não especificamente por ingestão de leite.
Por outro lado, segundo um artigo mais recente em que distribuem a intolerância por etnias, os finlandeses aparecem com apenas 17%. E, surpreendentemente, a Finlândia é o maior consumidor de leite do mundo, tomando 361.19 kg per capita por ano. Portanto, existe uma variedade enorme de laticínios sem lactose nos mercados e, se você sofre com alergia ao leite ou intolerância, sua vida será bem mais tranquila, aqui.
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Sistema de Saúde
Confesso que me assustou saber o diagnóstico e ver que não fizeram nada na Itália. Aqui, fui muito bem atendida por todos os profissionais que passei. Tanto as consultas, quanto à ambulância e os exames não foram totalmente gratuitos. O sistema público arca com uma parte e a outra é calculada conforme a renda familiar. Portanto, o valor pode variar para cada paciente. Você pode conferir mais informações sobre o sistema público no portal do InfoFinland ou do KELA.
O resultado do exame de sangue demorará 4 semanas para ficar pronto e, depois disso, vou ver quais providências o médico vai tomar. Por enquanto, tenho meu Epipen que virou meu companheiro por onde vou, antialérgicos e instrução de como agir em caso de uma crise. E a certeza de que estou sendo bem tratada, apesar de ter precisado chegar em um extremo para que fosse realmente levado a sério.
Se você também sofre com sintomas de alergia crônica, seja ela qual for, o que eu te diria é para que quando for ao médico, aqui, sempre aumentar os sintomas. Infelizmente, esta é a forma de conseguir resultados mais rápidos.
Até mês que vem!
Lili