Uma latino-asiática em terras europeias.
Então você chega na Europa, em Genebra, na Suíça. Lugar sonho de consumo de metade da população mundial e você não para de pensar na Ásia.
Primeiro almoço? Você quer Pad Thai (uma espécie de noodle de arroz, normalmente servido com camarões ou frango e acompanhado de pimenta e amendoim picado).
Daí você sai pra jantar e quer Pho, uma sopa típica vietnamita, preparada com macarrão de arroz, canela e outras especiarias. Ainda não achou onde comer “nasi goreng”, (arroz frito da Indonésia, cheio de temperos e mix de frutos do mar e ovo, acompanhado de picles de pepino e cenoura) mas já está procurando enlouquecidamente.
Anda pela rua buscando o cheiro agridoce de Bali, o calor abafado da Tailândia, a doçura no tratar dos indonésios. Quem diria, sente falta do tráfego intenso de Jakarta e do sotaque fofo dos filipinos. Você não surtou com os chocolates nem com os queijos. Não está ansiosa pelo fondue. Acha tudo muito branco, muito colonialista, muito burguês.
Leia também: 5 diferenças entre morar no Japão e nos EUA
Você desejava mesmo é estar ao lado do “colonizado” vagando pelas ruas sujas da Ásia, sentindo o calor do sol a queimar sua pele, fazendo o coração arder e a alma se agitar.
Você sente falta do aroma do jasmim e do frangipani, sente falta dos sorrisos fáceis e dos gestos simples. Quer andar com pouca roupa e os pés com os dedos de fora, sentindo e tocando o calor das ruas. Deseja o ardor da pimenta na língua e o calor fumegante de um prato ensopado no curry.
Ah menina! Você acabou de vagar pelo centro de Genebra e nada lhe saltou aos olhos. Então vagou até o “Red Light District” – como é chamada na Europa a região onde se encontram os prostíbulos e boates para sexo fácil. Lá encontrou trabalhadoras do sexo, pessoas refugiadas e pessoas em situação de rua. Lá encontrou os restaurantes árabes e asiáticos, e lojinhas de imigrantes que vendem de peruca afro à farofa. Se deu conta que estava sorrindo como boba para os estranhos na rua. Se sentiu mais em casa ali, no meio daquele pequeno caos.
A humanidade daquele lugar, daquele gente, contrastavam completamente com a aparência higienista do resto da cidade. Aliás, a cidade é bem menos “chique” do que ela imaginava, mas em cada quadra em cada ônibus ou banco de trem, é possível ver nitidamente quem é quem: quem são os imigrantes, os refugiados e os pobres. Se vê logo pelas roupas, pelo porte e no jeito de olhar. São muitos mundos imersos em um só.
Adentrou mais e mais naquele torvelinho que circunda as ruas próximas à estação de ônibus e foi se perdendo entre as lojinhas de bugigangas, batiks, kapulanas (artigos têxteis tradicionais da Indonésia e da África), narguilés e cremes para cabelo.
Ela avistou dois jovens sorridentes na frente de um restaurante Thai e algo a impeliu naquela direção. O restaurante era só uma pequena portinha no meio do nada, mas tudo cheirava tão bem. Uma mistura de aromas de incenso, chá e especiarias inundavam o ar. Pediu um arroz frito tailandês e sorveu cada especiaria daquele prato como se nunca houvesse provado algo tão bom.
O toque da toalha de seda na sua pele trouxe agradáveis memórias. Memórias de cores, flores e tantos amores. O povo, a cultura, a história e a fé dessa gente que tanto se impregnou nela.
Os vietnamitas que mascam ervas para disfarçar a fome, os indonésios que são gratos à vida e a Deus até diante de tragédias como o Tsunami, que matou centenas de milhares de pessoas e desabrigou outras tantas. A gentileza do povo filipino, mesmo após terem sofridos tantos crimes de guerra, durante a guerra com o Japão. A resiliência dessa gente não se aparta da alegria nem da gratidão.
A comida confortou a alma, ali ela gastou sua tarde falando com os atendentes asiáticos e lembrando dos bons tempos de Ásia. De toda simplicidade e pobreza, mas também de todo o amor.
Saiu de lá cantarolando… “meu coração vagabundo quer guardar o mundo em mim…”
É menina, vai ser difícil tornar-se europeia!
Você é do povo!
É uma latina asiática.
Uma cucaracha, uma lagartixa, uma libélula.
Ainda bem…