Vítima de violência doméstica durante 47 anos, Jacqueline Sauvage foi condenada pela Justiça Francesa com a pena de 10 anos de prisão fechada pela acusação de assassinato do marido Norbert Marot, com três tiros nas costas em 04 de dezembro de 2015.
Com a mobilização causada pelo lançamento de um pedido de graça presidencial por militantes feministas por meio de um abaixo-assinado, o qual foi de imediato acolhido por mais de 400 mil apoiadores, a Presidência anunciou que receberia os filhos e os advogados da mulher condenada, atualmente com 68 anos.
Além de maltratar a esposa por longos anos, o marido assassinado agredia os quatro filhos e cometia abuso sexual contra as filhas. O filho não suportou o calvário familiar e cometeu suicídio em 9 de setembro de 2012. No dia seguinte a perda do filho, Jacqueline Sauvage cometeu o crime pelo qual foi duramente condenada.
A defesa de que o crime foi cometido em razão da conturbada vida conjugal do casal, na qual a esposa viveu sob domínio do marido e que, nas palavras dos familiares, tratava-se de um homem tirânico, violento, perverso e incestuoso, por fim convenceu o Presidente a conceder o benefício da liberação da pena.
O fato é que a violência conjugal é um problema real que perdura. A condenação de Jacqueline Sauvage, considerada um ícone na luta contra a violência doméstica, a qual jamais havia registrado uma ocorrência sequer denunciando o marido, levanta também o problema de isolamento das mulheres maltratadas.
Somente 14% de 216 mil mulheres entre 18 e 75 anos vítimas de violência doméstica a cada ano na França afirmaram denunciar seus agressores às autoridades responsáveis. A cada três dias, uma mulher é morta nas mãos de seu companheiro. Em 2014, 134 mulheres e 31 homens foram mortos por conta de uma relação conjugal violenta.
Outro assunto levantado pelo veredito em questão foi a legítima defesa. Enquanto alguns consideraram a reação de Jacqueline desproporcional a violência sofrida, outros acreditam ser imprescindível considerar o impacto psicológico das violências conjugais feitas as mulheres.
Com a finalidade de proteger as mulheres consideradas culpadas, ainda que na realidade ocupem o papel de vítimas, a deputada Valérie Boyer irá propor um projeto de lei para incluir no direito francês a noção de legítima defesa diferida.
Importante afirmar que a legítima defesa já é reconhecida em território francês, desde que a reação da vítima seja imediata a agressão sofrida.
Ocorre que, segundo a justiça francesa, não se aplicava ao caso de Jacqueline Sauvage, que somente após receber os golpes, decidiu descer ao quarto do casal para enfim matar o marido.
A proposta não é considerada inovadora, uma vez que a Corte Suprema do Canadá reconheceu em 1990 o direito das mulheres vítimas de violência conjugal que mataram seus companheiros de invocar a síndrome da mulher maltratada, a fim de justificar o estado psicológico que se encontravam no momento do crime.
Entende-se como síndrome da mulher maltratada o fato da vítima concentrar toda a sua energia em evitar um novo ataque da parte de seu companheiro. A mulher em circunstâncias extremas desenvolve com o tempo uma submissão, bem como uma apatia, que mina sua auto-estima e diminui sua capacidade de julgamento.
Com o propósito de efetivamente apoiar mulheres em situação de risco, as autoridades francesas oferecem o atendimento através de ligações anônimas e gratuitas ao número de telefone 3919.
Ao mesmo tempo proporcionam abertamente a sociedade francesa informações esclarecedoras sobre a violência doméstica por meio do site aqui recomendado em suas mais diversas formas, como o casamento forçado, assédio sexual, violência sexual, mutilação sexual e violência conjugal.
Independentemente do caminho percorrido pela mulher agredida, o qual a conduziu para uma relação conjugal doentia e violenta, é indispensável respeitar seu tempo de reação a violência sofrida, considerando que críticas em nada vão cooperar para solucionar uma situação que envolve não somente o casal, mas eventualmente também os filhos.
Diz o ditado popular que em briga de marido e mulher não se mete a colher; no entanto ouso discordar ao afirmar que em situações de risco evidente de morte a sociedade não só pode como deve se envolver, ponderando que os envolvidos podem não vislumbrar uma saída digna sem a intervenção de outras pessoas.
3 Comments
Ola sou vitima de violencia domestica em franca lyon fugi de casa com meus filhos porque ele queria me matar tenho muito medo a policia nao faz nada o que poso fazer ?
Olá, Sônia! Sinto muito por estar passando por uma situação tão difícil. Sugiro que você procure as autoridades francesas (tente entrar em contato através do telefone indicado no artigo) ou mesmo a própria embaixada brasileira em Lyon. Alguém certamente poderá auxiliar você e seus filhos. Abraços!
Sonia, aqui no Brasileiras Pelo Mundo nós disponibilizamos um diretório com os dados de contato de associações e ONGs de ajuda e defesa da mulher. Na França existe o Solidarité Femmes, entre em contato com eles para que possam lhe orientar sobre o que fazer.
http://www.solidaritefemmes.org/ewb_pages/c/carte-de-france.php?search1=Rh%F4ne-Alpes#formres
69 – Lyon
Femmes Contre les Intégrismes (FCI)
Téléphone :
Email : fcilyon@yahoo.fr
Site Internet : http://www.fci-asso.org
Força e esperamos que logo tudo se solucione para você e seus filhos!
Edição BPM