Falou em Itália, pensou em burocracia! Se este pedaço do mundo tem um dom, é o de mudar leis e regras pelo menos uma vez por ano e te deixar extremamente confusa pensando se aquilo vale ou não vale mais. É um tal de “aprovou”, “está para ser aprovado” ou principalmente é um tal de ir até a Comune perguntar e ouvir como resposta um simples “não sei, devo confirmar com o meu colega de trabalho” para a sua pergunta. Não se espante se até mesmo o seu advogado pedir um tempo para consultar se algo é factível ou simplesmente impossível, mesmo se a lei diga o contrário. Eu mesma já ouvi tantas vezes a famosa frase pessimista: “troppo sbattimento per nulla” – em tradução livre, muito esforço pra nada.
E em se tratando de se divorciar não seria diferente. Este é um dos países mais conservadores em relação ao Direito de Família e para escrever este texto li artigos, leis, falei com um responsável na Comune e com um advogado para ter a certeza que todas as informções ditas aqui sejam coerentes, e principalmente, escrevo aqui para talvez ajudar alguém que esteja realmente precisando destas informações, para quem sabe poder se divorciar em paz – se isto for possível em algum lugar do planeta.
Ano passado foi aprovada a Lei do Divórcio Breve, lei esta que permite que casais que não tenham filhos e nenhum patrimônio em disputa possam ir até a Comune com ou sem advogados e ter o tempo reduzido entre o processo de separação e divórcio. Mesmo sendo uma opção que não permite disputas por bens materiais, os valores para pensão alimentícia devidamente pré combinados entre o casal podem ser discutidos e firmados ali. Os custos para este tipo de processo sem advogado é muito baixo; com menos de 100 euros todos os carimbos e papeladas serão lavrados. Em teoria este processo todo deve durar apenas 6 meses – digo em teoria, porque se tem uma coisa que aprendi aqui é a não acreditar muito que prazos não vão ser ultrapassados.
Agora se o casal – como a grande maioria de todos os mortais – estiver em pé de guerra, a velha forma do litígio está ai para dar o ar da graça, e neste processo não tenho muito a adicionar a não ser dizer que é praticamente a mesma lavação de roupa suja e brigas sem fins como em qualquer litígio brasileiro, com direito a um empurra-empurra de meses a fio. Um advogado é indispensável para ambas as partes e é impossivel definir um tempo previsto para o final do ato e muito menos definir custos; posso apenas dizer que se gasta e muito com advogados – e quem sabe, com terapeutas pra se livrar do trauma.
Justamente por isto é comum ver muitos casais que apenas moram juntos. Antes da Lei do Divórcio Breve o senso comum, ou a chamada voz do povo, dizia que as mulheres depenavam maridos nos divórcios, ficando com a maior parte dos bens e com uma gorda pensão alimentícia para ela e para a prole. Ouvi e vi muitos casos de homens divorciados morando nos carros até conseguirem refazer as suas vidas. Mas vale também lembrar que os tempos econômicos eram outros e financeiramente tudo ia muito bem, obrigado. Agora nesta época de extrema crise financeira, para muitos casais vale mais dividir a cama às turras e manter as contas em dia e tentar uma vida paralela do que sair brigando a ferro e fogo na frente do juiz.
Os dois tipos de divórcios citados acima se referem a cidadãos italianos ou cidadãos devidamente independentes de qualquer tipo de visto ou permissão relacionada ao matrimônio para estar na Itália, pois se você estiver ligada ao cônjugue também por uma carta/permesso di soggiorno e pretende continuar vivendo aqui na bota a coisa muda, e muito, de figura. Claro, é possível se divorciar e voltar correndo para o Brasil, mas como muitas pessoas constroem uma vida por aqui, fica muito difícil fechar a porta sem olhar pra trás.
A maior dificuldade do ato de se divorciar se refere aos documentos que permitem a permanência legal de um cidadão extra-comunitário ou vulgarmente falando, de nós, estrangeiros, que padecemos nas regras dos vistos.
Sabemos que a corda sempre arrebenta para o lado mais fraco e neste caso não seria diferente. Nas minhas andanças por escritórios responsáveis pelo estado civil, obtive diversas respostas e uma grande incerteza sobre qual é a verdade. A Itália é um país do “disse que me disse” e de histórias pra contar e é muito difícil chegar a uma resposta concreta; é sempre um “minha amiga disse que…”, “o advogado falou…”, e a única maneira de realmente saber o que vai acontecer é passar na pele por esta situação e poder falar com propriedade, lembrando que estamos falando de um território muito machista e patriarcal. Sendo assim, nós, mulheres, e principalmente as mães, encontramos as maiores dificuldades.
Se o assunto é mãe, a guarda costuma ser um pouco complicada se estiver em pé de guerra com o ex-cônjuge italiano; apesar de a figura materna ser muito respeitada, quando se trata de estrangeiras a coisa muda de figura e aconselho um bom advogado ou muito tato para não terminar com assistentes sociais batendo na sua porta ou problemas para levar seu filho um dia para o Brasil.
Agora se o assunto é o visto ligado ao matrimônio, aconselho muita, mais muita paciência e obviamente um bom advogado, pois além de enfrentar todo o processo de divórcio é possível que você terá que enfrentar uma boa briga referente ao seu visto pois alguns juízes, advogados ou representantes na Comune e Questura julgam o visto como algo unicamente ligado à convivência matrimonial e pode ser que seja necessário brigar muito pelos seus direitos.
Lembra que eu disse acima que aqui é um tal de “diz que me disse”? Pois bem, de acordo com uma LEI n. 19893 del 20 settembre 2010 ordenada pela Corte di Cassazione, o ex-cônjuge extra-comunitário pode ter seu visto (e de seus parentes reagrupados legitimamente no seu núcleo familiar) mantido ou renovado desde que atenda aos itens abaixo:
1- O casamento tenha durado pelo menos três anos, sendo que um tenha sido vivido em território italiano;
2- Nunca obteve nenhuma cidadania de nenhum estado europeu;
3- Nunca ter sofrido nenhuma condenação penal, pricipalmente por motivo familiar;
4- No caso de filhos, ter a guarda total, parcial ou direito de visita dos menores.
Apenas uma única coisa é certa para nós, mulheres, italianas ou estrangeiras: após o divórcio, devemos aguardar pelo menos 300 dias para nos casarmos novamente. E no caso de estrangeiras o tempo só aumenta, pois para se casarem com um italiano novamente devemos aguardar 3 anos. Agora me pergunto quem ainda rejeita o feminismo vendo estas coisas?
E pra fechar com chave de ouro a burocracia lembre-se: casou em território italiano e registrou no Brasil, consequentemente deve se divorciar no Brasil também, comunicando um advogado que irá comunicar ao Ministério Público e mudar seu estado civil no cartório.
11 Comments
Muito bom☺
Obrigada :*
Bruna,
Muito obrigada pelas dicas.
Casei na Itália com um italiano , terminamos e voltei para o Brasil. O meu ex acabou dando a entrada da separação na Itália há 5 anos atrás sozinho. Não fiz o registro no Brasil. Como faço para saber o status do processo?? Já posso casar novamente?
Sou Paula e estou em uma situacao parecida com a da Juliana .. eu nem sei se meu ex entrou com a separacao ja que nao temos mais algum contato se alguem tem algum tipo de informacao que possa ajudar por favor divulga aqui o deixe alguma forma de contato..
Olá Paula,
A Bruna Roland parou de colaborar conosco, mas temos outras colunistas na Itália.
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Obrigada,
Edição BPM
Casei na italia em 2003, registrei me casamento no Brasil. Me divorciei no brasil através de procuraçao em 2012, estou indoa italia pra me divorciar la tbm. O mei divorcio la contará da data 2012 ou apartir da data que vou prescrever la? Alguem saberia?
Olá Geane,
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Obrigada,
Edição BPM
Meu amigo ta entrando com o processo de divórcio na Italia, ele é brasileiro e tem cidadania italiana, se casou com ela que é brasileira la,ela trabalha de maneira informal, ele quer saber se ela pode pedir pensão alimentícia, ja que não comprova o que ganha trabalhando sem registro.
Olá Adriana,
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Edição BPM
Boa tarde
Se uma pessoa casa com a mesma pessoa em dois paises europeus ( Suica e Italia ) e so divorcia em um deles ( Suica ), o divorcio tem validade em ambos, ou, em caso de um deles casar novamente no pais que se divorciou ele esta em bigamia no outro ( Italia ), e se isso prejudica o novo conjugue, por exemplo: tem seu casamento anulado?
Grata
Chloe
Olá Chloe,
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Edição BPM